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[RESENHA #552] La Maison :: minha história na prostituição, de Emma Becker

Neste romance autoficcional instigante, acompanhamos uma jovem que encontra na prostituição uma fonte de prazer e de poder. La Maison apresenta a realidade dos bordéis e das mulheres que trabalham neles, mas desmonta todos os estereótipos relacionados ao assunto.

 

Intrigada com as mulheres que têm como profissão a comercialização do próprio corpo, e tendo a intenção de escrever um romance, a escritora e estudante parisiense Emma Becker se mudou, aos 25 anos, para Berlim, onde a prostituição é legalizada. Sob o nome de Justine, personagem de Marquês de Sade, começou a trabalhar na Maison, um bordel que dava especial liberdade às suas funcionárias. Nos dois anos em que trabalhou como prostituta, na Maison e no Manège ? sendo aquele o paraíso e este, o inferno ?, Emma conviveu com mulheres que eram mães, estudantes e até esposas que escondiam dos maridos sua ocupação.


Fascinada por elas, entre o prazer e a admiração que sentia ao observá-las, Emma narrou sua própria experiência e o afeto por suas “irmãs” – frequentemente acompanhado de amor e desejo. O resultado é esta autoficção audaciosa, considerada por alguns como feminista à sua maneira, repleta de encantamento e realidade. Das melhores às piores experiências, acabamos por nos aprofundar na motivação dessas mulheres e no poder que exercem sobre si mesmas e sobre os homens.


La Maison é um romance que não apenas dispensa estereótipos ligados à prostituição, mas os desafia, apresentando de forma multifacetada quem escolhe essa profissão – no caso de Emma e de outras, não por estrita necessidade, mas por vontade. A partir de uma perspectiva inusitada, e por vezes apaixonada, adentramos as portas daquele bordel berlinense e conhecemos a história das mulheres que trabalharam ali.


“Não consigo reler meus livros sem perceber que sempre escrevi sobre mulheres. Sobre o fato de ser mulher e sobre como isso assume milhares de formas. E esta sem dúvida será a obra de minha vida: matar-me querendo descrever esse fenômeno e aceitar a impressão de ter, em algumas centenas de páginas, avançado meio centímetro. E me esforçar para ficar satisfeita com esse meio centímetro, como se fosse uma grande descoberta. Escrever sobre as putas, que são uma caricatura das mulheres, a nudez esquemática desse estado, ser uma mulher e nada além disso, ser paga por isso, é como examinar meu sexo em um microscópio. E sinto a mesma fascinação que um técnico de laboratório ao observar as células essenciais a toda forma de vida se multiplicarem entre duas lâminas de vidro.” – Emma Becker)



RESENHA


Emma Becker optou por passar dois anos como prostituta em bordéis de Berlim - este livro é fruto de seu relato e experiências. A obra causou um alvoroço em seu lançamento na França, onde a profissão é regulamentada, mas persistente na inflexibilidade. A autora não enxerga, a contrapartida, as profissionais como sendo vítimas e seus clientes como agressores - embora em algumas partes ela narre alguns episódios de tortura psicológica e agressões, o que a fez mudar de um ambiente para outro.


E aqui está a dinâmica do ataque: Becker aponta para as mulheres que escolhem a prostituição, que até gostam dela, e a questão se isso é possível (muito menos aceito sobre isso), ainda é controversa não só na sociedade, mas também entre as mulheres. Becker agora se concentra em mulheres que tomam essa decisão mesmo que pudessem fazer outra coisa se quisessem, ou que consideram outro trabalho seu trabalho principal e apenas querem ganhar mais dinheiro. A exposição da autora sobre os vagos traz a tona uma série de questionamentos, mas abandona muitas outras. A narrativa da autora parece-se bastante com um estudo social, algo como um experimento para sentir na pele o ocorrido, mas se distancia da realidade experimentada pelos veículos de comunicação que expõe mortes dentro do meio, tráfico de humanos, espancamentos e ausência de fiscalização neste meio de trabalho, ainda que legal em diversos países, no Brasil ainda enfrenta resistência, um projeto de lei do deputado Jean Willys propôs a legalização da profissão, das casas de prostituição e da fiscalização, afim de diminuir a taxa de incidentes na profissão, bem como mortes,  ainda assim, a profissão foi regulamentada pelo Ministério do Trabalho, em 2022, mas ainda é vista com maus olhos e estigma pela sociedade, e algumas feministas. Porém, não sei se de fato foi proposital a linha tomada pela autora ao analisar apenas a vida de mulheres com status e a busca por desejos [ao que parece].



E as mulheres que representam são diversas em origem, status familiar, idade, cor, etnia - e o que oferecem a seus clientes. Ela descreve suas personalidades, status de casa, clientes, atividade sexual [conteúdo informativo]. Muitas vezes se assemelha a um estudo social, examinando as percepções e expectativas da sociedade, bem como o que Becker vê como a realidade do trabalho dentro do contexto específico da La Maison.


A autora experimenta na pele o abandono, o tédio, as preocupações e as rotinas que se delineiam em altos e baixos, ela demora à se sentir motivada com suas anotações, tudo parece clichê e previsível, mas logo ela adquire uma nova identidade e mergulha-se profundamente na rotina e nos relatos de sua observância, a obra é, se não, um emaranhado e anotações de sua experiência como prostituta e sua visão estereotipada das mulheres no meio. 


A obra tem muitas facetas, e pode causar reações diversas em leitores distintos, como a negação dos relatos, o absurdo descrito e experienciado, o preconceito do leitor com o tema ou a busca por uma temática não explorada pela autora, porém, devemos nos atentar à primazia de excelência ao qual a autora se submeteu neste relato-experiência.


Um livro bastante perturbador e interessante.

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