Três perguntas rápidas para Claudia Cavalcanti, autora de Avenida Beberibe


Você pode nos dizer o nome de três autores e/ou autoras que influenciam sua forma de escrever?

Herdei de Thomas Mann, humildemente, o gosto pelas frases longas. Já quanto à mistura de texto + fotos, posso citar Katja Petrowskaja, autora de Talvez Esther (e, claro, acima de tudo e de todos, W. G. Sebald). Teria sido influenciada por Maria Stepánova (sobretudo por suas ideias), se tivesse lido Em memória da memória antes de escrever Avenida Beberibe.


Qual a maior saudade que sente do Recife?
Sinto saudade do Recife com meus avós. Sem tantos tubarões, digo, espigões. Saudade também da tapioca de rua.


Fotos digitais ou reveladas?
Na adolescência, tive um laboratório caseiro. Adorava revelar e ampliar minhas fotos (amadoras, mas eu tentava caprichar) tiradas a partir de uma máquina analógica de respeito. Há muitos anos, aderi às fotos feitas no iPhone. Gosto demais, e me esforço para que sigam caprichadas. A resposta é: fotos – analógicas e digitais.

5 Poemas de Vitor Miranda, autor de “Exátomos”

A precisão dos átomos em forma de poesia: conheça o novo livro de Vitor Miranda, "Exátomos". Com uma capa que convida à reflexão, a seleção de poemas aborda a exatidão do universo e questiona o rumo que temos dado às nossas vidas. Em cinco partes distintas, a obra promete atravessar diferentes emoções e provocar sensações únicas. Conheça mais sobre o autor e sua trajetória literária, que inclui contos, músicas e parcerias com renomados artistas. Prepare-se para uma leitura intensa, regada a vinho, músicas e emoções à flor da pele.

Conheça cinco poemas da obra de Vitor Miranda: 

Exátomos


em cada grão

de átomo

exátomos


espaços

entre vãos

onde há

ausência

há plenitude

tudo se completa


na exatidão


dançam átomos

na amplidão



Poema

poema

fóssil sentimento

matéria arqueológica

signo paleolítico

o breu da árvore amazônica

onde dorme o escorpião

pião

seu corpo em giro eterno

esqueleto de sonhos

arcada dentária

de dinossauros

ácido nucleico religião

objeto ausente de átomos

o indizível intocável

que explica

que explode



Antropologia dos átomos


átomos dançam na tua pele

evaporam-se à luz dos olhos


testemunho o milagre da matéria


frente ao horizonte espero bilhões de estrelas

que marcham de encontro à via láctea

unificando a ancestralidade em pó púrpuro


ressignificando o tempo astrológico

e a importância de deus na atração dos átomos


Fotografia

mel à flor da pele escorre pela epiderme

desaguando no epicentro cósmico

onde se dá a sutileza sísmica

vulcânica da matéria

apocalipse do instante

capturando a etérea transfiguração

de tudo que era corpo em antimatéria



Mera

mera flor efêmera

singela dor tamanha

coração estranha

o esmero amor

que arranha o fardo

flor que o tempo

abre e num sopro

3 poemas de Raquel Lopes, autora de “leveza do efêmero”


Raquel Lopes, poeta e escritora nascida em Jaboatão dos Guararapes, Pernambuco, Brasil, nos convida a contemplar a beleza da vida em sua mais recente obra "Leveza do Efêmero". Com seu talento único, a autora nos presenteia com poemas que celebram a esperança, a beleza e a efemeridade do tempo. Em meio às dificuldades do cotidiano, Raquel nos lembra da importância de nutrir a esperança em nossos corações e aproveitar cada momento de nossas vidas. Embarque nessa jornada poética e deixe-se envolver pela magia das palavras de Raquel Lopes.

Conheça agora três poemas da obra ''leveza do efêmero'':


A Leveza do Efêmero


Raios de luz 

botões de rosas 

pétalas das flores 

Em tudo ela gosta. 

O cheiro das árvores 

o vento que refresca 

a vida em constante movimento


Transformação

 (a todo momento)


O tempo calmo 

as ondas agitadas

 o mar

 …


Aves migratórias 

animais domésticos 

selvagens 

Com e sem veneno


Um dia ou dois 

sem pressa ou depois 

Um ano a mais 

Mil séculos 

e tudo se refaz. 




Lua Cheia 


Deixa a lua encher 

O meu olhar. 


Deixa a lua bailar 

O meu cantar. 


Anotar nítidas batidas do peito 

Aprender a amar 

Sem qualquer erro. 


Deixa a lua encher 

Clarear meu andar. 


Quero seguir este mar 

Sem ter medo.




Morena Rosa


Morena Rosa, de amor e gotas de orvalho. 

O dia faz tua música uma lira 

na verdade e amor. 

Escrita sobre as águas do destino

que cruzou teu caminho 

traçou as linhas escritas 

no coração das pétalas delicadas de bondade.


Tua cor, Morena Rosa, é a cor que admiro. 

Sorrisos contagiantes estão por aí 

dizendo de ti e de teus olhos mágicos.


Não canses de sonhar em teu mundo fantástico


Para a dor 

                não dês espaço.



5 Poemas de Christian Dancini, autor de “dialeto das nuvens”


O poeta Christian Dancini de Oliveira, natural de São Roque, São Paulo, é uma revelação no cenário da poesia contemporânea. Desde os onze anos de idade, ele se dedica a escrever versos e, aos 22 anos, já tinha dois livros publicados, além de diversos trabalhos em revistas renomadas. Em seu livro Dialeto das Nuvens, o autor nos leva a uma viagem por suas diferentes fases criativas, explorando desde a fragilidade humana até o surrealismo mais profundo. Nesta matéria, vamos conhecer mais sobre esse talentoso poeta e sua obra que nos convida a sentir, mais do que meramente entender.

Conheça cinco poemas presentes na obra dialeto das nuvens:


Coração índigo

Uma andorinha se desprende do teu crepúsculo,

eu vejo agora teus olhos confusos e tristes,

por trás da máscara. Equilibrista em minha aorta.

Um anjo azul e rosa que pousou na ponta da minha

melancolia.



O teu lume.

Deixastes para trás o teu lume

que, palpável, deslizou para dentro

da minha garganta.

Então, eu o engoli: borboletas em meu esôfago,

paz para os meus brônquios, relâmpagos em meu

estômago. O teu lume senta ao lado direito

do verdadeiro amor.


Os caminhos da morte

Há três caminhos a partir da morte: o caminho do alívio,

o caminho do eterno e o caminho do renascimento.

O alívio começa a partir do momento da morte:

já reparou como se alivia a face de um morto? Como

relaxam os músculos? A partir daí, começa o eterno:

como ondas de infinitos finitos são levadas pelo vento

ainda vivas, também o são a partir da morte. E por último, o

renascimento: quando um recém nascido chora

ele está adquirindo a consciência novamente em ondas

e ondas de espírito.

A morte é uma luz a fraquejar, bruxuleando, como pequenos

infinitos a romper em cada canto. Ela nunca apaga a existência

por completo, apenas cintila, pisca, mas volta sempre a acender

as chamas da vida nos olhos do amor.


O medo, a palavra e o acaso

A escuridão espia pela claraboia... paranoico, louco, vil...

Os corvos gritam em profundo silêncio: lux aeterna.

O câncer que corrói os ventos, a doença que se

espalha pelo ar,

o inconsciente dilacerado pela música,

o som grave dos tambores em aleluia,

e a escuridão que espia pela claraboia.

Os cervos suspensos em fá sustenido,

o medo, a palavra e o acaso,

a ocasião, as estrelas ululantes e o vento.

Tudo aquilo que passa a cada momento — os olhos da aurora —

sapateando pelo bumbo do coração das trevas.

E eu — o que resta de mim —, a palavra entre

vírgulas

na distopia da liberdade, eu danço com Virgílio e Homero

no sono do inconsciente.


Entropia.

Caos no fundo daqueles olhos,

beijar aquelas pálpebras seria o mesmo

que tocar o outono.



Resenha: Caiu na rede é papagaio, de Marcelo Bechara S.N. Frange

Foto: Arte digital / Divulgação

APRESENTAÇÃO

A história de um papagaio que ajudou a resolver um crime já seria o suficiente para ganhar destaque em jornais e, pelo menos, uma crônica. Mas esse papagaio não se contentou em solucionar o mistério do roubo. O papagaio buscou a imortalidade. Passou dias longe de casa, desaparecido, sofreu amputações, duelou contra animais selvagens e ainda ousou experimentar veneno. Louro Augusto nunca foi um bicho de estimação comum. Desde a sua chegada, despertou a curiosidade de seus donos e não parou mais. Ranzinza, mal-humorado, fã de televisão e música, o papagaio possuía um dom para se enfiar em confusões que nos faz questionar se é mesmo um livro baseado em histórias reais ou se é ficção. Louro Augusto existiu, e as histórias também. Louro Augusto foi o papagaio mais arteiro e encrenqueiro de que já se ouviu falar.


RESENHA

Este livro conta a história de Louro Augusto, um papagaio arteiro e encrenqueiro que escapou da morte diversas vezes. Cada capítulo narra uma das muitas aventuras do pássaro e mostra como ele sempre conseguia se safar de situações perigosas. Apesar de nunca ter presenciado a lenda dos gatos de sete vidas, a vida do papagaio provou ser ainda mais surpreendente. O autor teve que se esforçar para lembrar de todas as histórias e garantir que elas fossem registradas. Louro Augusto se tornou uma parte marcante na vida da família e suas aventuras são dignas de serem contadas em um livro.


Confira o resumo dos contos da obra:


1. O arroto da caixa de sapato


Naquela quarta-feira de agosto de 1995, o calor insuportável era amenizado pela chegada inesperada de tio Dedé, trazendo um papagaio arrotador como presente para a família. Apesar da estranheza inicial, a mãe concordou em adotá-lo, e o nome escolhido foi Louro Augusto, apesar da preferência dos filhos por Frangão. Assim, o papagaio arrotador tornou-se o mais novo morador da casa, com um início de amizade complicado e promessa de momentos divertidos e diferentes.


2. O amor pela televisão e o fetiche por pés


Frangão era um papagaio diferente, que se comunicava através de arrotos e que tinha uma paixão pela televisão. Apesar de não ser o animal de estimação mais amigável, ele tinha uma relação especial com o irmão do narrador, Kiko. Frangão adorava assistir TV e se comunicar com pássaros pela janela. Ele também adorava bicar os botões dos controles remotos e os pés do narrador, o que o obrigava a andar de chinelo em casa para se proteger. Com o tempo, Frangão se tornou cada vez mais atrevido e ousado, demonstrando suas peculiaridades e manias curiosas.


3. O primeiro voo


Cada animal de estimação apresenta peculiaridades, como a necessidade de cuidados específicos. Os peixes requerem trocas frequentes de água e alimentação regular, os cachorros exigem atenção semelhante a bebês e os papagaios precisam de espaço para crescer. Frangão, um papagaio, desenvolveu hábitos curiosos, como beber cerveja e beliscar frutas na cozinha. Apesar de suas travessuras, Frangão era amado pela família. Um incidente em que Frangão voou pela primeira vez gerou desespero, mas felizmente foi resgatado. A partir daí, as asas de Frangão foram cortadas regularmente para evitar novas fugas.


4. O afinador de violão


Após um voo repentino, a atenção com Frangão dobrou, revelando o quanto estávamos apegados ao papagaio. Antes, eu não entendia a paixão das pessoas por animais de estimação, mas Frangão mudou minha perspectiva. Seu comportamento único e habilidades musicais, como afinar violões, o tornaram parte especial da família. Por mais que seu temperamento pouco convencional me surpreendesse, eu aprendi a respeitar e entender os limites de Frangão de maneira inusitada, com uma bicada no nariz.


5. Caiu na rede é papagaio


Num dia quente em Tanabi, planejava-se jogar futebol no quintal com os amigos, mas um problema com o papagaio Frangão mudou os planos. Frangão sofreu um acidente ao ficar de ponta-cabeça e foi necessário amputar alguns dedos do pé. Após a cirurgia, Frangão se recuperou e voltou a suas travessuras, mostrando que o acidente não afetou seu estilo de vida. Apesar do susto, a família ficou aliviada ao ver que o papagaio estava bem e recuperado.


6. Caso de polícia


Em uma tarde quente em Tanabi, um papagaio chamado Frangão sofre um acidente no quintal de casa, resultando na amputação de alguns dedos do seu pé. Após a recuperação, o pássaro continua suas aventuras, incluindo bicar o banco de uma bicicleta roubada. O roubo é descoberto quando a bicicleta é reconhecida por um familiar e devolvida à família, graças às assinaturas deixadas por Frangão. Apesar do susto, Frangão permanece ativo e animado, mostrando-se resiliente diante dos desafios.


7. Segundo voo


Frangão se tornou um herói ao recuperar a bicicleta de Kiko e foi reconhecido como um detetive entre os moradores da cidade. Mesmo sendo um papagaio manco e falando poucas palavras, ele era admirado por suas características únicas. Frangão era corajoso, pesado e teimoso, mas seu peso elevado acabou sendo crucial para sua reconciliação com o narrador. Após um segundo voo inesperado, onde precisou ser resgatado do telhado pelo narrador, Frangão passou a ter um comportamento mais amistoso, o que marcou um momento de reconhecimento e reconciliação entre os dois.


8. Planta venenosa


Frangão, sofre um acidente e come partes de uma planta venenosa, deixando todos preocupados. Com a ajuda de tio Inácio, o pássaro é salvo com um remédio para vacas e acaba se recuperando. Apesar dos sustos, Frangão mostra-se resiliente e continua suas aventuras no sítio, interagindo com outros animais e enfrentando desafios com coragem.


9. Caça aos ratos


Um ninho de ratos entre a casa e da tia Leila gerava transtorno e calafrios. Toquinho, o cachorro, se tornou o principal alerta contra os ratos. Em uma confusão, Frangão, o papagaio, ficou preso em uma ratoeira com cola e precisou ser levado ao veterinário. O veterinário recomendou cortar as penas de Frangão para remover a cola, o que acabou deixando o papagaio praticamente depenado. Mesmo assim, Frangão surpreendeu a todos ao voltar para casa e se manter tranquilo, tornando-se uma sensação com sua condição incomum.


10. A batalha


As penas de Frangão aumentaram devido a um incidente em que ele foi atacado por um gambá. Kiko, seu dono, o salvou a tempo e o levou ao veterinário, que afirmou que apesar do susto, o papagaio estava fora de perigo. O veterinário comentou que Frangão era conhecido por se envolver em confusões e que seus donos tinham muita sorte por ele ter escapado ileso de tantos perigos. Frangão ficou na cozinha até que a gaiola fosse reforçada para evitar novos incidentes.


11. O anúncio no rádio


Mesmo após várias confusões, continuávamos a duvidar se Frangão iria mesmo sossegar, apesar de sua idade avançada. O papagaio estava ficando velho e solitário, passando horas no quintal olhando para o céu. Com dificuldades para subir à gaiola e ganhando peso, sua marca registrada de assobios tornou-se menos frequente. Após três horas de desaparecimento, a busca por Frangão se intensificou, com todos preocupados e apreensivos. Mesmo após dois dias de procura incansável, Frangão ainda não tinha sido encontrado, levando à hipótese de rapto ou fuga por fome. Após quatro dias, a esperança de encontrá-lo diminuía a cada dia. Mas, inesperadamente, um senhor o encontrou quase em frente à loja da família e, apesar de fraco e sem comer, Frangão foi finalmente resgatado e levado de volta para casa.


12. A viagem


Os pais decidiram reformar completamente a casa, o que significava derrubá-la e reconstruí-la. A família se mudaria temporariamente para um apartamento no prédio da cidade, o que causava apreensão, especialmente para o pássaro de estimação, Louro Augusto, que se sentira preso e infeliz. Diante disso, a família decidiu que a empregada cuidaria do pássaro temporariamente. Durante esse período, Louro Augusto parecia triste, mas bem cuidado. Quando a reforma chegava ao fim, recebem a notícia da morte de Louro Augusto, que partiu sem um adeus, deixando um vazio e tristeza na família.


O livro 'Caiu na rede é papagaio' de Marcelo Bechara S.N. Frange é uma obra que encanta e diverte o leitor com as aventuras e travessuras do papagaio Frangão. A narrativa envolvente e cheia de reviravoltas faz com que o leitor se conecte emocionalmente com os personagens e se divirta com as situações inusitadas em que o papagaio se envolve. A forma como o autor descreve a relação entre a família e o pássaro, mostrando o carinho e a cumplicidade que se desenvolve ao longo da história, é cativante. Além disso, o livro aborda questões como resiliência, superação e amor pelos animais, transmitindo mensagens positivas e inspiradoras. Definitivamente, 'Caiu na rede é papagaio' é uma leitura leve e envolvente que encanta desde a primeira página.


Compre o livro na site da editora Appris: 

https://editoraappris.com.br/produto/caiu-na-rede-e-papagaio-e-outras-historias-de-quem-nao-voa/

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Resenha: Possíveis travessias, de Sonia Assis

Foto: Arte digital

APRESENTAÇÃO

Em 2021, quando se comemoram os 125 anos de Alberto da Veiga Guignard e para falar sobre a importância de trazê-lo para a contemporaneidade na formação de artistas, foi escrito Possíveis travessias: o desenho e a experiência da arte, com plena consciência de sua importância, especialmente neste momento, quando todos os segmentos culturais são colocados em dúvida por uma política que desqualifica o que há de mais sensível na humanidade ― a arte e a liberdade de ser, criar e se expressar. São as coerências de um pensar amadurecido por anos de pesquisa no exercício de ensinar, formar e produzir arte; são os mergulhos em espaços outros de impossibilidades perceptivas em que verdades podem se manifestar sem o rigor sistemático exigido pela academia que me trazem essa certeza. O livro caminha por entre páginas preenchidas por falas de autores importantes no campo da filosofia, da literatura e da arte, e passo a passo, em cinco capítulos, interlocuções com esses autores confirmam as necessidades para a formação dos artistas desenhistas. Uma pesquisa consistente sobre modernidade contemporânea e as questões que se sobrepuseram ao tempo e às críticas se apresentam. O texto reconhece cognição como possibilidade a ser percebida na experiência de afastamento que o desenho de observação oferece ao abastecer a subjetividade sensível do indivíduo criador. Subjetividade cujo significado é aprofundado no texto, como conhecimento no impalpável, expansões de uma consciência criadora, o que favorecerá a formação do artista desenhista. Como paisagem que se recorta por uma janela que se abre para um fora e que, ao mesmo tempo, define-se como dentro, espaço interno e intangível, os capítulos transitam pelos intervalos do inapreensível e constroem uma relação com o infinito contido na transcendência, portal de acesso para o imaginário artístico. Para viver a vida como paisagem, é preciso a ação presencial imposta pela exigência de continuidade que preenche o artista desenhista em todas as suas circunstâncias, e o livro afirma que, para viver a expansão do universo, é necessário construir o dom poético contido no olhar sensível diante da vida manifestada, diante do outro como em nós mesmos.


RESENHA


Foto: Arte digital


O livro aborda a importância de trazer o artista Alberto da Veiga Guignard para a contemporaneidade na formação de artistas, utilizando seus ensinamentos sobre desenho de observação e criação livre. A autora justifica a metodologia adotada, baseando-se em autores como Bachelard e Blanchot. Ela destaca a relevância da arte e da liberdade de expressão em um contexto em que esses valores são desqualificados. O livro apresenta cinco capítulos e um epílogo, explorando a subjetividade sensível do artista no processo de criação. A autora reflete sobre a importância do resgate do ser sensível na contemporaneidade, buscando esclarecer conceitos e significados no âmbito artístico. Ela destaca a importância da experiência do afastamento e do imaginário na formação do artista, explorando o espaço do inapreensível e relacionando-o com a transcendência na arte.

A autora destaca a importância de disciplinas essenciais, como o desenho de observação segundo a metodologia de Guignard, na formação de indivíduos que atuam na área de arte/educação. A metodologia de Guignard enfatiza a apurada percepção do objeto observado e o desenvolvimento de habilidades de observação e desenho. A presença e a consciência são essenciais no processo de observação, que contribui para o desenvolvimento da subjetividade sensível do arte/educador. Além disso, a metodologia de Guignard é valorizada como um método poético e único, que exige segurança no olhar e promove uma relação potencializadora com o objeto da procura. O arte/educador deve aprender a reconhecer e vivenciar o impulso constante de afastamento e ausência, o qual leva à experiência do Nada e da alteridade na obra de arte. Através do desenho de observação, é possível adentrar esse espaço outro, distante do mundo concreto, e vivenciar a experiência do afastamento do eu para alcançar a verdade na arte. O diálogo com autores como Blanchot e Heidegger revela a importância do silêncio perceptivo e da entrega ao ofício para compreender a infinitude da obra de arte. O estudo desses conceitos complexos pode proporcionar uma maior compreensão dos movimentos internos do artista e auxiliar na formação do arte/educador, ampliando sua subjetividade sensível e seu conhecimento do mundo infinito.

É necessário, portanto, reconhecer a amplitude das possibilidades que a subjetividade sensível oferece, não apenas para o arte/educador, mas para todos os seres humanos que buscam compreender a complexidade do mundo e de si mesmos. A formação em arte/educação deve permitir essa imersão no sensível, no etéreo, no subjetivo, para que se possa compreender e vivenciar a arte em sua plenitude e transformadora potência.

Por fim, a subjetividade sensível é um convite à profundidade, ao reconhecimento do outro como um ser único e complexo, como um universo em si mesmo. É através da arte e da educação que podemos ampliar esse olhar sensível, engajando-nos em um diálogo constante com o mundo e suas possibilidades infinitas. É um convite à reflexão, à sensibilidade e à busca pelo conhecimento que ultrapassa os limites do tangível e nos leva a novos horizontes de compreensão e experiência. 

Assim, o desenho de observação não é apenas um exercício técnico, mas sim uma experiência que proporciona ao indivíduo a oportunidade de se conectar com sua própria sensibilidade, sua interioridade e com a complexidade do mundo ao seu redor. É através desse exercício que se pode desenvolver a capacidade de ver em profundidade, de sentir a vida de forma intensa e de dialogar com o universo estético de maneira significativa.

Portanto, o desenho de observação se apresenta como uma prática essencial para a formação do arte/educador, pois possibilita o desenvolvimento da sensibilidade, da percepção e da capacidade de expressão artística, fundamentais para a construção de um sujeito crítico, reflexivo e comprometido com a arte e a educação. É através dessa prática que se pode despertar a imaginação, a criatividade e a capacidade de questionar o mundo, tornando-se um agente transformador da sociedade.

Dessa forma, o desenho de observação não se restringe apenas ao ato de desenhar, mas sim a uma experiência profunda e significativa que possibilita ao indivíduo se reconhecer como parte integrante do universo estético, contribuindo para sua formação como sujeito sensível, crítico e comprometido com a arte e a educação.

O desenhista fica imerso diante do objeto, respirando fundo e se aconchegando a ele. Inicia-se um desenho de observação, onde é necessário mergulhar no pulsar e reconhecer a vida e a unidade do objeto. O artista se volta para seu espaço de criação, onde musicalidade e geometria se misturam, e a regência é necessária para conduzir a música que se escreve por entre as estrelas. O artista se recolhe em seu canto, construindo a imobilidade do recolhimento e meditando sobre a vida e a morte. Diante do branco da folha de papel, o desenhista se sente como um lobo que espera a presa, imóvel e circunspecto diante do mistério da obra a ser criada. A solidão do artista é essencial para a verdade do traço, impulsionada por uma certeza que não duvida. A obra de arte é infinita e em constante expansão, fragmentando-se e expandindo-se em resposta aos apelos do artista. O artista inicia sua produção, reconhecendo que no desenho se inscrevem as hesitações, mudanças de percurso e correções de rumo.

Blanchot (2001) questiona a escritura e a ausência de reconhecimento, sugerindo um fazer pelo impalpável, sem desejo, apenas para ir além dos limites do conhecimento técnico e do eu pensante. O desenhista também é citado, como alguém que busca o inapreensível através de gestos que surgem do vazio e do silêncio, em uma busca pela transcendência e pela forma que se delineia pela observação e pelo imaginário. O desenho de observação, diferente de gestos aleatórios, é uma forma de comunhão entre o observado e o observador, que juntos descobrem lacunas e desenham o impalpável. O desenho concluído não rompe com o processo contínuo, mas oferece o cálice repleto do melhor vinho para ser saboreado no momento da ruptura e descontinuidade, onde o artista descobre a dialética no inapreensível. Todo o processo é marcado pela busca pelo vazio, pelo inacabamento e pela promessa de compreensão.

Em um texto inconcluso sobre a arte e a educação, a autora ressalta a importância de transitar pelos espaços de inapreensibilidade para ampliar as subjetividades sensíveis. Questiona-se sobre as verdades escondidas nas entrelinhas da humanidade e conclui que a arte é essencial para acrescentar vida à humanidade. Reconhece-se a hercúlea tarefa do arte/educador do século XXI, que deve buscar o ilimitado e se render ao incomensurável, vivendo em constante expansão. A experiência da arte aliada ao conhecimento gera ampliações em direção ao impalpável, reforçando a importância do artista/professor atuando na esfera da arte/educação para formar indivíduos sensíveis e humanos.

Dessa forma, o livro apresenta uma reflexão profunda e significativa sobre a importância do desenho de observação na formação do artista e do arte/educador, ressaltando a necessidade de se reconhecer a subjetividade sensível como um elemento crucial na compreensão e prática da arte. A autora apresenta uma abordagem teórica sólida, fundamentada em autores renomados, e consegue estabelecer conexões relevantes entre a metodologia de Guignard e conceitos filosóficos complexos, enriquecendo assim a discussão sobre a arte e a educação. O texto é instigante, provocativo e inspirador, convidando o leitor a mergulhar em reflexões profundas sobre a natureza da arte, da sensibilidade e da experiência estética. Em suma, trata-se de uma obra que contribui de forma significativa para o campo da arte/educação, estimulando o pensamento crítico e a busca por novas possibilidades de compreensão e expressão artística.

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