Lançamentos do Grupo Editorial Record :: Maio


O grupo editorial Record é o maior conglomerado editorial da América Latina, sendo um conjunto editorial de 16 editoras:Record; Verus; Bertrando Brasil; José Olympio, BestSeller, Galera; Junior; Galerinha; Rosa dos tempos; Civilização brasileira; Paz e terra; Difel; Best Business. BestBolso; Viva Livros e Nova Era.  Confira abaixo os títulos recém lançados do grupo para o mês de Maio.













[RESENHA #562] Homens (não) choram, de Joan Turu


APRESENTAÇÃO

Nil é um garotinho, mas agora ele precisa se tornar um homem! Mas o que isso quer dizer? Não ter medo? Não demonstrar sentimentos? Não chorar? Acompanhe Nil em seu processo de autodescoberta sobre o que realmente é ser um homem nesta tocante história ilustrada. Chega a hora em que todo menino precisa virar homem. Quando Nil percebe que está ficando mais velho, surge a preocupação: o que significa ser homem? Olhando os homens ao seu redor, os da televisão e os das revistas, parece que as respostas já vem prontas.Então por que, logo após começar a agir como um verdadeiro homem, Nil se sente tão mal?Homens choram é a leitura ideal para mostrar aos meninos a importância de serem fieis a quem eles são de verdade, e de demonstrar os seus sentimentos, inclusive chorando, sempre que for necessário.

RESENHA

Nil é um garotinho que está crescendo, e com a idade vem as dúvidas, afinal, quando os meninos crescem, eles se tornam homens, mas...como era um homem? o que constitui o homem? Dá para aprender como ser homem, se sim, será que ensinam na escola? se não, como sabem como se constitui um homem? As dúvidas começam a pairar sobre a cabeça de Nil, até que ele decide pesquisar como são os homens, afinal, ele precisava aprender de algum lugar.

Em sua família, seu avô lhe contou que servir ao exército o tornou homem, incrédulo, ele começa pesquisar outros modelos de como se tornar homem, assistindo televisão, filmes, debates políticos e tantos outros programas, a partir dai, ele começa a pontuar tudo o que aprendera em um desenho no quarto: homem não usa rosa, homem não chora, homem tem que ser macho, viril, indiferente, e etc. Após colecionar alguns aspectos, Nil decide colocar em prática, porém, ao se tornar autossuficiente e independente de suas emoções, ele transformou-se em uma pessoa da qual não tinha nenhum orgulho. Ele passa a não querer brincar com sua amiga, afinal, homem brinca com coisa de homem, ele deixa de aproveitar os jogos de futebol para caçoar dos amigos...e, até se mete em uma briga, mas tudo isso o deixa mal consigo mesmo.

Após entrar em um conflito interno sobre como era ser homem, Nil fica cabisbaixo e triste, não somente por não ter se dado conta em como era ser homem, mas por não ter se transformado em um bom exemplo de homem naquele dia, então Nil é amparado por um médico da escola que o vê chorar, naquele momento, após uma conversa, Nil entendeu que tudo bem demonstrar sentimentos e fazer certas coisas, que nada disso o tornava menos homem.

uma excelente história ilustrada para ensinar os meninos sobre sentimentos, choro e demais aspectos que constituem não apenas o homem, mas o ser humano. Educar é preciso,  e este é um ótimo livro-roteiro para tal.

O AUTOR

Joan Turu nasceu em 1984 e é um ilustrador profissional dedicado à literatura infantojuvenil. Com uma caixa de lápis em mãos, Turu aprendeu que, mesmo não conseguindo mudar o mundo, podia criar no papel, nem que por apenas alguns momentos, um mundo onde palavras como respeito, solidariedade, empatia, paz e, principalmente, amor, fossem vividas no dia a dia. Ao concluir o curso de ilustração na Escola de Arte Manresa, entendeu que, assim como o desenho, se mudarmos a nossa perspectiva do mundo, podemos realmente mudar o mundo!

Nova edição de 'Quando me descobri negra', de Bianca Santana



PRÓXIMO LANÇAMENTO

Quando me descobri negra

Usar um turbante com cores vibrantes pela primeira vez, sentir o vento balançar os cabelos sem o peso dos produtos químicos, reconhecer nos filhos os traços da ancestralidade. Esses são alguns dos temas que Bianca Santana expurga em busca do encontro com sua negritude nesta nova edição, revista e ampliada, de Quando me descobri negra.

A autora traz à tona sua trajetória de autorreconhecimento e aceitação. Mesclando trechos autobiográficos à história recente do país com pinceladas de ficção, Santana narra sua passagem por um processo complexo de letramento racial, aceitação do corpo e reconhecimento familiar. Tudo isso enquanto se desvencilha do racismo brasileiro presente no bairro de classe média, na cliente branca do restaurante que acha que negros são serviçais, na ação violenta da polícia, no bullying sofrido na escola e na desigualdade salarial no trabalho.

Com a altissonante frase “Tenho trinta anos, mas sou negra há dez”, a autora inicia essa jornada que há tempos vem ajudando pessoas negras a se aceitarem e pessoas brancas a compreenderem o papel que podem desempenhar na luta antirracista. Com textos curtos e um olhar acurado, Quando me descobri negra é um verdadeiro marco no processo de diversos avanços que o movimento negro vem conquistando.

De Neusa Santos Souza a Chimamanda Ngozi Adichie, Bianca Santana evoca todas as formas de conhecimento para avançar nessa luta diária contra o preconceito. Valendo-se da ternura do cheiro do arroz-doce com cravo e canela servido numa roda de saberes de mulheres negras ao luto pela perda prematura e traumática do pai, Quando me descobri negra é um clássico contemporâneo que já faz parte da formação do que sonhamos para um novo projeto de nação.

DESTAQUES

Quando me descobri negra fala com sutileza e firmeza de um processo de descoberta inicialmente doloroso e depois libertador. Bianca Santana, através da experiência de si, consegue desvelar um processo contínuo de rompimento de imposições sobre a negritude, de desconstrução de muros colocados à força que mpedem um olhar positivo sobre si.” — Djamila Ribeiro
 
“Escritos romantizados, tristes e fortes, delicados e agudos, de uma dura e naturalizada realidade que se reinventa em vermelho e cinza a cada dia nas periferias, mas também nos espaços de classe média universitária ou médica, ou ainda nos voos São Paulo-Paris.” — Douglas Belchior

QUEM ESCREVE


Bianca Santana é jornalista, doutora em ciência da informação e mestra em educação pela Universidade de São Paulo. Diretora executiva da Casa Sueli Carneiro, que compõe a Coalizão Negra por Direitos, também é comentarista do Jornal da Cultura e autora de Arruda e guiné: resistência negra no Brasil contemporâneo (Fósforo, 2022) e Continuo preta: a vida de Sueli Carneiro (Companhia das Letras, 2021) .

[RESENHA #561] Mulher feita e outros contos, de Marilene Felinto


FELINTO, Marilene / Mulher Feita e outros contos. Marilene Felinto - São Paulo: Fósforo, 2022. ISBN 978-65-89733-79-7

APRESENTAÇÃO

Como podemos comparar um homem que deixou de ser escritor para se dedicar ao ofício de mecânico com uma mulher que viaja em um trem de Berlim para Munique enquanto observa outra passageira comer um ovo, e ainda, com uma menina que não aceita o fato de não ser notada por um colega de classe? Como esses e outros personagens tão diversos podem confluir? Aparentemente, não há nada que nos faça pensar que histórias tão banais possam se interligar, mas, nos dez textos de Mulher feita e outros contos, Marilene Felinto usa a simplicidade cotidiana para mostrar ao leitor que a complexidade da vida está ligada de modo íntimo ao ordinário.

A certa altura, uma senhora se surpreende ao ser questionada por uma jovem a respeito de formigas tanajuras servidas como iguarias no interior do país. Aquela pergunta tão singela, sobre algo tão prosaico, recria “na memória da velha senhora o alarido de crianças e adultos, a gritaria, a correria alegre de gente abatendo com redes finas e pedaços de pano as tanajuras que esvoaçavam baixo, voando e revoando em nuvens, enxames pretos, cheias de asas, sobre as cabeças das pessoas”. De uma conversa quase retórica em uma mesa de café da manhã, Marilene Felinto revolve áreas há muito desativadas da memória social, apresenta um choque de gerações e, consequentemente, carrega o leitor ao mais profundo dos Brasis. Nesta volta da consagrada autora de As mulheres de Tijucopapo ao conto, as confluências e separações acontecem ao acaso, de forma leve, mas impactante. O leitor que mergulhar nesse microcosmo sairá dele com a sensação de que se encontrou com um amigo, com a infância, ou a própria velhice, como se um pouco de cada um de nós estivesse descrito nas linhas desse livro.

Mulher feita e outros contos é uma reunião desse tipo de acontecimento, com personagens majoritariamente femininas que nos permitem refletir sobre a inconstância dos dias, como se fosse “um comentário qualquer desses, do lugar da nossa arrogância inútil” que nos faz rir “feito adolescentes sem compromisso”. São as linhas que costuram os nossos dias, os traços que, como desenhos imperfeitos, atingem a beleza que buscamos no comum.



RESENHA

Construir, reconhecer-se e assumir-se por completo é uma árdua tarefa, estamos constantemente enfrentando as nuances das transformações do tempo, da vida e, sobretudo, da visão, da que temos sobre nós, das que nos são impostas e das que adquirimos com o tempo. Marilene Felinto me pegou de jeito, eu realmente não esperava uma abordagem tão intensa e repleta de tantos significados, sua forma peculiar ao abordar temas tão sensíveis, e ao mesmo tempo, tão essenciais é algo que deixa sem palavras, eu realmente não estava preparado para ser surpreendido.

Mulher feita é a primazia do ensaio da autoestima, da (re)descoberta, do sentimentalismo, da vontade, da construção e da evolução do meu eu. Um livro que merece ser lido, refletido, pautado e ensaiado em todas as suas faces, encarado e escancarado em sua totalidade como uma possibilidade de penetração profunda de um exercício de reflexão.

Este livro abre-nos a possibilidade de revisitar a frase de Simone de Beauvoir: não nasce mulher, torna-se, e eu, gostaria de reescrever essa frase para um contexto mais geral para não nasce, torna-se, apenas.

O livro é composto por dez contos divididos ao longo de 74 páginas, cada um com sua particularidade, que o torna único. O primeiro conto, de abertura da obra, hipertexto a lápis, é a descrição de uma aula de desenho, aqui, a autora tece belíssimas e finas linhas gerais da reflexão, ao abordar como tema central uma aluna em uma aula de desenho, inicialmente, e, particularmente (in)descoberta, diminuída pelos comentários que ouvira outrora de seu dentista, de seu pai e de outras pessoas, ao abordarem seus traços particulares como sendo indesejáveis ou feios, o que a fez acreditar que não havia em si nenhum traço bonito ou digno de admiração, porém, na aula de desenho, sua professora exercitava que a beleza como sendo algo descoberto, revisto, redesenhado e não auto-imposto, afirmando de maneira categoricamente geral "não existe ninguém feio", a partir deste ponto, usando a aula de desenho como sendo um recurso autoexplicativo para o exercício de autodescoberta da aluna, a autora delineando-nos uma curvatura significativa e tênue entre poesia e poética, sua narrativa percorre os traços, as cores e as tentativas como parte do progresso de autodescoberta, de (re)admiração, sobretudo, de reconhecer em si os traços que à fazem única, afinal, não há ninguém feio e todos podem ofertar uma perspectiva distinta de um mesmo caminho.

Mulher feita, título homônimo do segundo conto desta obra, fala-nos acerca da descoberta de uma mulher sobre seu corpo, seus peitos e as reflexões que surgem a partir dali, tornando-a passageira de um percurso de descobertas, tornando-se figura central de sua própria narrativa, buscando-se exemplificar e estender suas descobertas para dentro e afora, descobrindo-se mulher feita, completa e em construção constante. Esta é uma obra sobre processo, progresso e reflexo.

Procura-se Michael, é, se não, um conto chave dentro da narrativa que percorre a descoberta da mulher feita. Aqui, uma personagem busca de forma incessante um homem de nome Michael, soldado de uma luta no Vietnã, que confundia-se com Tim, com John Boy, que declarava poemas ao ouvido, que curtia e amava maconha, que apresentou-se o sexo e o gozo, que fez e fazia primazia quando estavam juntos, que escondia segredos e deleitava-se nos prazeres, alguém a quem ela tanto procurou de forma incessante, uma vez, mulher feita. A narrativa é um exercício de reflexão, Michael, é, se não, a prova de que podemos nos sentir feitos e completos através das experiências e dos processos ao qual passamos, aqui, ela tornava-se completa em suas reflexões ao lembrar da figura de Michael, à quem apresentou-lhe um mundo totalmente inerente ao seu, reflexões diretas acerca do processo de crescimento, reconhecimento e busca do eu interior e de suas particularidades. Procura-se, Michael.

Segunda classe narra o encontro de duas mulheres em um vagão de trem, a principal, a contraponto, vinha de uma família pobre e miserável, seu pai, magrelo, desnutrido e sem nenhum dente na boca, devido à sua alimentação precária e manias estranhas, sua mãe, velha e cega de um olho, com um olhar morto e sem vida, como de um boto. A sua frente, uma mulher branca como clara, de cabelos amarelos como gema, trajando roupas surradas e chapéu velho, comia, na segunda classe, ovos e batata, toda aquela visão preocupou-se por toda viagem, afinal, despertara em si uma sequência de lembranças que à lembravam de toda sua pobreza, de sua origem pobre e de suas raízes das quais, aparentemente, não se orgulhava, apesar de finalizar toda história tratando-se ambas igualmente por mulheres de segunda classe, toda narrativa mostra-se contrária à essa diferença existente, criando ali, uma narrativa que diverge entre si, entre duas mulheres de igual classe, mas não de modos, e com certeza, não de destinos - e não, não falamos de viagem. A voz ecoa pela narrativa trazendo reflexões acerca do crescer, evoluir e dos caminhos que tomamos, nas formas que ganhamos, dos sentimentos que sentimos e da forma como reagimos.

Histórias e traços distintos que interligam-se apenas pelo fato de completar-se na construção do sujeito. Marilene Felinto, apresenta-nos uma ótica que permite-nos viajar, refletir e transitar entre a descoberta do que sentimos e temos sobre nós mesmos, sua narrativa agridoce e provocativa coloca-nos a pensar acerca da essência daquilo do qual somos feitos, elaborados e vivenciados, sua narrativa evoca sentimentos diversos nas mais variadas questões ligadas ao íntimo de cada experiência vivida. Mulher feita é um retrato de um misto emaranhado de pessoas que descobrem-se limitados em seus pensamentos e modos, interligando-se por meio do exercício de reflexão interno . Afinal, porque tomamos os rumos que tomamos? Por que buscamos aprovação da classe, abandonamos trabalhos, trocamos de caminho, tecemos comentários e buscamos aprovação externa? por que nos construímos e reconstruímos nosso íntimo e nossa vida por meio do exercício penoso e sofrido existente nos dias?

Este não é apenas um livro, é um exercício pessoal de cada leitor de análise profundamente própria. Uma obra impecável em sua proposta e altamente recomendada à todo leitor.

A AUTORA


Nascida em Recife em 1957, Marilene Felinto é formada em Letras pela USP e mestra em psicologia clínica pela PUC-SP. Tem dez livros publicados, entre eles As mulheres de Tijucopapo (Ubu, 2021), vencedor do prêmio Jabuti na categoria de autor revelação. É tradutora de autores como Ralph Ellison, Virginia Woolf, Edgar Allan Poe, Malcolm X e Hilton Als.

Compêndio Mítico do Rio de Janeiro, de Alberto Mussa, ganha nova edição


Mussa criou uma coleção de cinco volumes primorosos que buscam resgatar a história popular do Brasil por meio de segredos e superstições. Cada um dos volumes é uma novela policial que se passa em um século diferente da história do Rio de Janeiro. O primeiro livro, O Trono da Rainha Jinga, se passa em 1626. O segundo, O Senhor do Lado Esquerdo, começa com um crime cometido em 1913. A Primeira História do Mundo se passa em 1567, quando a cidade do Rio de Janeiro tinha apenas dois anos de idade e pouco mais de 400 moradores. Já em A Hipótese Humana, Mussa utiliza a cosmologia indígena brasileira como ponto de partida para a narrativa de um assassinato que envolve capoeira e agentes secretos da polícia. Em todas as obras, o autor utiliza crimes para reconstruir o mito do Rio de Janeiro.

Alberto Mussa narra a história do Rio de Janeiro em cinco romances fascinantes, um para cada século desde a fundação da cidade. Em um box exclusivo com novas capas e texto de Hermano Vianna, as obras independentes podem ser lidas em qualquer ordem e têm em comum a pertinência a cinco gêneros tradicionais do romance: o carioca, o histórico, o fantástico, o policial e o de adultério, proporcionando uma experiência única aos leitores. Vencedor de prêmios como Casa de las Americas, Biblioteca Nacional e ABL, entre outros, Mussa afirmou que a história dos crimes de uma cidade é o que a define, não seu povo ou cultura. O Compêndio Mítico do Rio de Janeiro é uma reunião inédita dos cinco romances, apresentada em um box exclusivo com capas novas e um livreto escrito por Hermano Vianna.


 Confira alguns detalhes sobre a publicação abaixo:


Alberto Mussa, vencedor dos prêmios Casa de las Americas, Biblioteca Nacional e ABL, entre outros, afirmou certa vez que uma cidade não se define pelo temperamento de seu povo ou pela sua cultura, mas pela história de seus crimes. Com este Compêndio Mítico, Mussa conta a história do Rio de Janeiro em cinco romances policiais instigantes, um para cada século desde a fundação da cidade, trazendo um recorte que expõe as entranhas e a poderosa mistura de culturas e povos da capital fluminense. Obras independentes, que podem ser lidas a qualquer momento, em qualquer ordem, os livros do Compêndio pertencem, cumulativamente, a cinco gêneros tradicionais do romance: o carioca, o histórico, o fantástico, o policial e o de adultério. Um deleite para os leitores.

 

A primeira história do mundo (256 páginas)

Em 1567, é registrado formalmente o primeiro assassinato no Rio de Janeiro: um homem encontrado morto a flechadas, um crime passional, que, entre suspeitos, acusados e testemunhas, envolveu 15% da população da cidade à época. A primeira história do mundo recria o Brasil em formação em um romance de aventura, com piratas, pilantras, heróis e aventureiros destemidos e ambiciosos numa terra sem lei.

 

O trono da rainha Jinga (128 páginas)

Cinco crimes, supostamente engendrados por uma irmandade secreta de escravos, a heresia de Judas, movem a trama. Para elucidar os fatos, Unhão Dinis, um juiz "por provimento régio", junto com o armador e baleeiro Mendo Antunes, irá ao encalço de pistas para solucionar o complexo quebra-cabeça dos delitos. Cada capítulo é narrado por um personagem diferente, com sua própria visão da história. Nesta viagem pelo Rio do século XVII, O trono da rainha Jinga tece um enredo envolvente sobre a influência da África na formação do Brasil.

A biblioteca elementar (192 páginas)

Um crime ocorre em 1733, na rua do Egito, que viria a se tornar o largo da Carioca. Na calada da noite, uma cigana testemunha quando um homem de casaca, pistola na mão, ameaça outro com capa à espanhola e botas de cano longo. Atracam-se. A arma dispara. O de casaca cai ferido mortalmente. A cigana logo identifica vítima e algoz, mas nada diz ― ela também tem muito a esconder. Com paixões e inimizades, medos e rancores, desejos, magias e mortos que voltam como sombras, A biblioteca elementar aposta no suspense para transportar o leitor para o Rio de Janeiro setentista.

 

A hipótese humana (176 páginas)

Tiros na noite e um crime: são misteriosas as circunstâncias que envolvem o assassinato de Domitila, filha do coronel Chico Eugênio, dentro da chácara da família no Catumbi, no ano de 1854. A investigação fica a cargo do detetive Tito Gualberto, primo da vítima e hábil capoeira, que tentará completar o quebra-cabeça do crime. A hipótese humana apresenta um Rio dos capoeiras que sabem matar como quem dança, dividido em territórios comandados por nações rivais, e o leitor terá o prazer de desvendar seus segredos.

 

O senhor do lado esquerdo (304 páginas)

O assassinato do secretário da presidência da República na Casa das Trocas, um prostíbulo de luxo no Rio de Janeiro, em 1913, é o ponto de partida de uma investigação crucial. A apuração dos fatos vai além de uma simples sucessão de acontecimentos e pistas que levam à identidade do assassino ― uma preocupação secundária do investigador, completamente absorvido pela figura sedutora de Aniceto, irmão da principal suspeita do crime, a prostituta Fortunata, que passou a noite com a vítima. O senhor do lado esquerdo conquistou os prêmios de Ficção da ABL e o Machado de Assis da Fundação Biblioteca Nacional.

[RESENHA #560] Escravidão contemporânea, org. Leonardo Sakamoto


APRESENTAÇÃO

Todo ano, milhares de pessoas são traficadas e submetidas a condições desumanas de serviço e impedidas de romper a relação com o empregador. Não raro, são impedidas de se desligar do trabalho até concluírem a tarefa para a qual foram aliciadas, sob ameaças que vão de torturas psicológicas a espancamentos e assassinatos. Pessoas que têm sua dignidade arrancada por um regime de trabalho escravo. Este livro, organizado por Leonardo Sakamoto, reúne grandes especialistas nacionais e estrangeiros que mostram o que é o trabalho escravo contemporâneo, sua história recente, como ele se insere no Brasil e no mundo, o que tem sido feito para erradicá-lo, e por que tem sido tão difícil combatê-lo. Uma obra necessária, uma ferramenta para uma das mais importantes batalhas de nosso tempo. Afinal, enquanto qualquer ser humano for vítima de trabalho escravo, a humanidade não será, de fato, livre.

RESENHA

Entre 1995 e setembro de 2019, mais de 54 mil pessoas foram encontradas em regime de escravidão em fazendas de gado, soja, algodão, café, laranja, batata e cana-de-açúcar, mas também em carvoarias, canteiros de obras, oficinas de costura, bordéis, entre outras unidades produtivas no Brasil.

Escravidão contemporânea é uma coletânea de cunho jornalístico informativo organizado pelo jornalista Leonardo Sakamoto, a obra possui como foco a descrição da escravidão contemporânea em solo brasileiro, o autor discorre sobre a temática com forte enfoque na exploração de mão escrava por meio do tráfico de trabalhadores que são mantidos em cárcere privado por meio da exploração do emocional e pelo medo de ameaças de morte e punições, garantindo assim, mão de obra barata para geração de competitividade comercial com preços menos elevados no mercado, uma vez que, na maioria das vezes, a mão de obra é totalmente explorada de forma gratuita e irregular.

A obra abrange um forte estudo da escravidão no Brasil, iniciando pela abolição da escravatura, os resquícios e nuances pós lei áurea, os enfrentamentos em solo brasileiro após a proibição do uso de mão de obra escrava,  o perfil dos sobreviventes, o mercado no globo e suas facetas e o impacto da exploração irregular de mão de obra no mundo e nas vítimas.

Todo ano, milhares de pessoas são traficadas e submetidas a condições desumanas de serviço e impedidas de romper a relação com o empregador. Não raro, são impedidas de se desligar do trabalho até concluírem a tarefa para a qual foram alidadas, sob ameaças que vão de torturas psicológicas a espancamentos e assassinatos

o número de trabalhadores escravos ao redor do globo é uma pauta discutida à vários anos, em alguns países há algumas iniciativas que buscam erradicar a problemática, evitando assim, que, uma pessoa detenha poderes e direitos sobre a outra, garantindo uma relação de trabalho na transparência, porém, é comum encontrar no Brasil casos de exploração de mãos de obra escrava cada vez mais recorrente. O problema transforma a pessoa em objeto, tonando-a descartável ou desnecessária em caso de descumprimento de ordens de serviço,  o que acaba por vezes na ausência de leis de seguridade social e trabalhistas.

o chamariz usado muitas das vezes é a promessa de trabalho, muitas das vezes no setor agropecuário, o que leva trabalhadores pobres e com pouco acesso à estudo, estrutura educacional e social à e submeterem, o que acaba ocasionando em uma série de de trabalhadores escravizados por um longo período, trazendo sintomas irreversíveis para a vida do trabalhador.  O termo contemporâneo é usado para empregar a situação em que as leis trabalhistas e os direitos humanos são violados, tornando a  figura do trabalhador em caricatura, explorando e violando seu direito de ir e vir ou de se comunicar com o mundo exterior, o que acaba tirando essas pessoas do raio de investigação dos órgãos competentes, tornando ainda mais difícil a tarefa de se identificar os responsáveis ou a região explorada.

Baseado no trabalho dessas equipes, é possível saber que, dentre as finalidades mais comuns do trabalho escravo contemporâneo no Brasil, encontram-se a derrubada de mata nativa e a limpeza de áreas para a constituição de empreendimentos agropecuários e extrativistas.

A obra ainda delineia sobre alguns casos ocorridos no Brasil:

Em outra operação ocorrida em Sinop, no Mato Grosso, foram libertados 22 trabalhadores em situação de escravidão na produção de arroz e soja. A ação foi motivada por denúncias de condições degradantes e cerceamento da liberdade. Algumas pessoas não eram pagas há meses, recebendo apenas comida e alojamento - pequenas barracas de lona nas quais se amontoavam, em redes, famílias inteiras.

Em outro flagrante, a mulher de um dos trabalhadores nos recebeu em seu barraco de madeira pedindo mil desculpas por não poder nos oferecer um café. É que ela estava sem água e, naquele momento, não dava para repor. Perguntamos o motivo. Envergonhada, explicou que aquele era o horário em que a vara de porcos do fazendeiro costumava ir até o córrego utilizado pelos trabalhadores e familiares para se banhar, lavar as roupas e captar água para beber. Como o curso dagua era lento, ele ficava todo revolvido e com cor marrom por longo período. Além, é claro, do tempo necessário para a água levar embora o estrume dos animais.


O termo, ainda que cunhado recentemente, é datado dos períodos de escravidão operando, as vezes, simultaneamente, mesmo após à abolição da escravatura, por meio da princesa Isabel, à lei áurea.

A obra é altamente recomendada e reflexiva, os textos organizados por autor percorrem diferentes nuances de um mesmo tópico, sob visões diferentes e óticas distintas, trazendo novas informações ao enredo elaborado pelo jornalismo. Uma obra para se ler e nunca esquecer.

[RESENHA #559] Meu caminho de volta para casa, de Dani Floresani

FLORESANI, Dani: Meu caminho de volta para casa / Dani Floresani. - 1ed. - São Paulo: Paraquedas, 2022. 184p

A busca por um propósito em meio da dor, livro de Dani Floresani é um emaranhado poético da busca pelo divino em meio á dor de momentos e lembranças enraizados no amor e afeto maternal.

Meu caminho de volta para casa, de Dani Floresani, é um discurso poético e doloroso da autora, uma descrição precisa, dolorida e minuciosa de um período ao qual não podemos fugir: a dor. A narrativa aborda os acontecimentos e percalços enfrentados pela autora ao descobrir o diagnóstico da doença de sua mãe: ELA (esclerose lateral amiotrófica), uma doença degenerativa progressiva que afeta o sistema nervoso central causando paralisia motora irreversível, os pacientes desta doença morrem de forma precoce ao perder a capacidade de executar tarefas cruciais como comer, caminhar e falar.

O diagnóstico veio de forma precoce, causando dor e sofrimento à toda a família, impactando diretamente o sentimental e emocional de Floresani, ela narra os períodos em que duvidou das certezas e da existência de um Deus, sobretudo, por sua ausência de contato com a religião, bem como sua ausência de conhecimento e sentimento de incapacidade de sentir os milagres impostos pela crença, o que a levou experienciar diversas religiões, sem preconceito, enxergando ali, a beleza da crença e da devoção.

O apoio emocional era apenas de uma amiga próxima, ao qual ela chamava carinhosamente de Tata, que por fim, morrera cedo, deixando-o órfã de um poderoso acolhimento. Agora, precisava se reerguer para o triste fim de sua mãe, enquanto os sintomas avançavam, até o momento em que sua mãe passa à depender de uma bengala para caminhar, o que a fez buscar um curso sobre a doença em um hospital, rodeado de pessoas e equipe médica que estavam transitando ou haviam transitado pelo período. A descoberta da progressão por meio de vídeos e palestras à fez chorar copiosamente, quase que de forma inconsolável, à levando para a capela do hospital para buscar acolhimento em Deus, na crença à qual ela, naquele instante, não era detentora.


A autora então, decide mudar-se para Três Lagoas, cidade interiorana localizada em Mato Grosso do Sul, o local de morada de sua mãe, onde crescera e compartilhara lembranças da fazenda onde morara, das brincadeiras, banhos de mangueira, momentos de descontração e felicidade, tudo isso, descrito como algo estranhamente certo à se fazer.

Nada fácil, nada difícil, apenas uma decisão que eu não gostaria de ter tomado. Porém, ela foi inspirada por uma estranha certeza. O próximo passo seria, então, tomar todas as providências práticas para aquela transição.

Naquele momento, a autora decidira mudar os rumos de sua vida e adotar novos caminhos, delineando novas rotas e sentimentos, abandonando para trás, tudo o que não lhe cabia, ela então se desfaz de tudo o que não quer levar para a nova vida: roupas, objetos, detalhes, lugares e momentos, era de fato, uma despedida para o inicio de um novo ciclo. Tudo isso para que ela pudesse se reconectar com Deus, o que a fez enxergar que o que ela buscara para o alívio estava ali o tempo todo: a fé.

Depois de um encontro como esse, a vida jamais voltaria a ser como era antes. Porém, para os olhos externos, eu era apenas mais uma paciente.

A partir dai, a autora narra viagens, encontros e desencontros dela com Deus, consigo mesma e com a mãe, tudo parte de um processo difícil de aceitação do momento, mas agora, sem o pesar da dor, mas a beleza da fé e das convenções por ela imposta. A autora descreve momentos lindos de conversa na varanda, de perdão, de entrega e de descoberta, sua narrativa é fluida e completamente envolvente, impossível não se emocionar. Uma obra, certamente, incrível e completa, dedico esta leitura à todos os amantes de uma escrita afetuosa, e para todos os desamparados buscando por soluções ou uma luz no fim do túnel, esta é, e sempre será, uma boa pedida.

Em cada lugar que eu visito, eu me lembro dela.

A autora

 Dani Floresani é formada em psicologia. Se mudou para os Califórnia, nos Estados Unidos, onde morou por onze anos, se tornou mestre em medicina tradicional chinesa e seguiu se especializando na China. Regressou ao Brasil e continuou seus estudos em terapias energéticas, integrando a sua prática. Trabalhou anos com atletas, aplicando a medicina chinesa para preparação e recuperação de competições. Foi professora na Faculdade Ebramec, em São Paulo e no Rio de Janeiro. É pesquisadora das artes cênicas desde a infância, e participou de grupos de estudos no teatro Vendo Forte e Grupo Tapa. Na Califórnia participou também de workshops e vivências. Começou a escrever poesia em 2018 e esta é sua primeira obra publicada.

“Bagdá noir”: coletânea reúne 14 contos policiais sombrios sobre a cidade mais famosa do Iraque

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Está chegando ao Brasil a coletânea de contos Bagdá noir, da série noir da Akashic Books. Após os sucessos de Beirute noir (org. Iman Humaydan) e Marraquexe noir (org. Yassin Adnan), a série pousa no Iraque com a antologia organizada por Samuel Shimon. “Bagdá noir”, que tem como protagonista uma das cidades mais devastadas pela guerra nas últimas décadas, recebeu a primorosa tradução direta do árabe de Jemima Alves, que já traduziu, na Tabla, poemas da coletânea Gaza, terra da poesia e o romance Gente, isso é Londres, da libanesa Hanan Al-Shaykh.

A ideia do projeto é reunir escritores locais que conhecem a fundo a cidade onde vivem, e propor a cada um que escreva um conto noir inédito, localizado em uma área específica da sua cidade. Porém, em Bagdá noir, você vai encontrar uma cidade um pouco diferente. De um lado, a Bagdá que ainda busca superar os traumas de uma ditadura opressora e violenta como a de Saddam Hussein, de outro, um país que foi completamente devastado e destruído pela invasão e ocupação americana em 2003. 

Na introdução do livro, o organizador Samuel Shimon comenta que “no seu conjunto, as histórias de Bagdá noir testemunham a duradoura resiliência do espírito iraquiano em meio aos desdobramentos da vida real e de um estado de desespero contínuo, do qual a literatura noir oferece apenas uma ideia.”

Perante uma cidade composta por uma algaravia de línguas como árabe, curdo, turcomeno, assírio, armênio, siríaco, persa e uma diversidade de povos e etnias, os contos traduzem uma espécie de “ethos iraquiano” capturando sua pluralidade de vozes, ainda que diante das situações mais adversas. 

“As contribuições deste livro também se sustentam como contos independentes, nos quais as tradições riquíssimas de interculturalidade transcendem a realidade política imediata — mesmo que nela se baseiem”, completa Shimon.

Alguns dos autores presentes na antologia são bastante conhecidos e premiados mundo afora, como é o caso de Sinan Antoon, autor de Morrer em Bagdá e vencedor do prêmio Saif Ghobash Banipal Prize, pela tradução de seu próprio livro The Corpse Washer. Também fazem parte da coletânea nomes como Muhsin Al-Ramli, Nassif Falak, Ahmad Saadawi, Salar Abdoh, Hadia Said, Hayat Raies, Mohammed Alwan Jabr, Salima Salih, Hassin Muzany, Dheya Al-Khalidi, Roy Scranton, Ali Badr, Layla Qasrany.


Bagdá noir é um livro com o melhor do suspense e do entretenimento noir que, aliado ao pano de fundo histórico das últimas décadas do Iraque, permite ao leitor conhecer um lado diferente de uma das cidades mais importantes do Oriente Médio. 

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Sobre o organizador:

Samuel Shimon nasceu no Iraque, em uma família assíria, em 1956, e desde 1985 vive em Paris. É cofundador da Banipal, renomada revista internacional dedicada à literatura árabe contemporânea, e fundador e editor do popular site literário árabe Kikah. É organizador de Beirute39, uma antologia da nova geração de escritores árabes. Em 2005, publicou o romance autobiográfico ‘Iraqi fi Baris (Um iraquinao em Paris), que se tornou um best-seller no mundo árabe e foi traduzido para vários idiomas.

Sobre a tradutora:

Jemima Alves é pesquisadora afiliada à Universidade de Nova York, sob a supervisão do professor e escritor iraquiano Sinan Antoon, e doutoranda em Letras Estrangeiras e Tradução e mestre em Estudos Judaicos e Árabes (FFLCH-USP). É pesquisadora e membro do grupo Tarjama – Escola de Tradutores de Literatura Moderna (USP). Atuou como intérprete árabe-português no contexto de refúgio no programa de voluntariado do Conselho Nacional para os Refugiados e da Caritas – SP. Realizou parte da sua formação acadêmica em Portugal (Universidade de Évora) e em instituições em países árabes, como Marrocos (Ibn Battuta Arabic Scholarship, oferecida a alunos reconhecidos pela dedicação e excelência no estudo da Língua e Cultura Árabe), e Omã (Sultan Qaboos College, ensinando língua árabe para estrangeiros).

Sobre a editora Tabla:

A editora Tabla tem como foco a publicação de livros referentes às culturas do Oriente Médio e do Norte da África e seus ecos mundo afora. Com o objetivo de ressaltar os pontos de contato, percorrendo e construindo pontes culturais, nosso desejo é apresentar e representar essas culturas de forma autêntica, longe dos estereótipos.

Assim como as tamareiras, o projeto Tabla foi semeado muito antes de prover seus frutos. Cultivada há mais de 10 anos, foi somente em 2016 que as primeiras bagas brotaram.

Ficha técnica:

Título: Bagdá noir

Série: Série Noir 

Organizador: Samuel Shimon

Autores: Muhsin Al-Ramli, Nassif Falak, Sinan Antoon e outros

Tradutora: Jemima Alves 

Editor: Lielson Zeni

Projeto Gráfico: Tereza Bettinardi

Editora: Tabla

Edição: 2023, 1ª edição

Número de páginas: 352

[RESENHA #558] Sonhos no terceiro reich, de Charlotte Beradt

Charlotte Beradt era uma jornalista que morava em Berlim e fugiu para a Inglaterra em 1939 e depois para Nova York em 1940. Ela pediu que as pessoas ao seu redor lhe contassem os sonhos que tiveram entre 1933 e 1939: sua tia, um médico, um leiteiro, uma vizinha, sua costureira, um amigo empresário... Ela reuniu cinquenta desses "sonhos impostos pela ditadura" em seu livro clássico de documentação onírica sonhos no terceiro reich , publicado pela primeira vez em 1966.

Os sonhos revelam como o regime nazista afetou o inconsciente coletivo dos alemães.

O psicanalista Christian Duker assina a apresentação desta obra, apresentando-nos os paradigmas que norteiam os estudos da psicanalise, as contribuições dos relatos de Charlotte e sua vivência familiar durante a ascensão do terceiro reich. O titulo de sua apresentação faz um complemento ao seu conteúdo, chamando-nos a atenção para o que vem a seguir: o sonho como ficção e o despertar do pesadelo.

Após passar um período estudando sonhos e a metodologia do discurso e a forma como a qual se desenvolvem os sonhos na literatura, bem como os reflexos, metodologias e as causas que norteiam estes relatos, o psicanalista apresenta-nos uma série de reflexões acerca dos resultados que reverberam na escrita de Charlotte.

O livro de Charlotte Beradt compõe uma terceira classe de relatos. Ele não propõe uma moral redentora ou punitiva. Ele não apresenta causas ou razões, mas reverbera relatos de sonhos de trezentas pessoas que viviam na Alemanha entre 1933 e 1939. (p. 7 - in. apresentação)

O primeiro capítulo, intitulado "a origem da ideia", a frase usada para representar o anagrama imposto pelo discurso presente na obra é uma citação bíblica do livro de Jó, 33:15-17:

Às vezes em um sonho, em uma visão da noite, quando um sono profundo envolve o homem adormecido em seu leito, Ele apura então os ouvidos do ser humano e lhe faz sua repreensão. - em síntese, o sonho tem o poder de apurar os sentidos do humano por meio da sinestesia dos acontecimentos ao seu redor, de acordo com a citação o homem adquire uma visão expandida de local e acontecimento mais assertiva durante o período do sono.

A ideia de documentar os sonhos veio por meio do sonho de um dono de fábricas, que ao narrar seus sonhos intermináveis da visita de Goebbels, narra um período de perda de identidade, submissão e perda de poder. Os sonhos ocorreram diversas vezes, e sempre com uma particularidade diferente à outra, sempre acrescido de novos traços e características que faziam o homem tremer e temer. Sua narrativa revelou que o medo o rondava constantemente, o fazendo fazer saudações e ter conversas que por si só, jamais teria. Desde então, Charlotte decide começar à relatar em um diário os sonhos de diferentes pessoas, de todas as classes e repartições sociais, claro, enfrentou dificuldades em meio à busca, que acabara pois, fomentada em tristeza e medo coletivo.

Comecei, então, a coletar sonhos ditados pela ditadura. A tarefa não foi muito fácil, pois alguns tinham medo de contar o que sonhavam [...] perguntei as pessoas do meu meio sobre os seus sonhos. Tive dificuldades de achar gente que se beneficiasse do regime ou bajuladores entusiasmados; de todo modo, suas reações intimas não seriam significativas para o meu projeto (in - a ideia p. 31, grifos meus)

Os sonhos descritos, a partir deste ponto, são, em sua maioria, relatos da perda de privacidade, identidade e de um controle mental que se seguia por meio do medo coletivo, todos descreviam sonhos de aprisionamento, vergonha e dor perante o ocorrido, sempre repleto de novas nuances descritivas acerca dos eventos à serem enfrentados, isso pode ser observado, principalmente, no relato de um médico, de 45 anos, após um ano do poder do terceiro reich:

Perto das nove da noite, depois de minhas consultas, quando quero me esticar calmamente no sofá com um livro sobre Matthias Grunwwald, minha sala e apartamento ficaram de repente sem paredes. Olho apavorado ao meu redor, e até onde meus olhos conseguiam alcançar, os apartamentos estão todos sem paredes. Ouço gritarem em meu megafone: "De acordo com o edital sobre a eliminação de paredes, datado do dia 17 deste mês..." (pág. 38 - in. a vida sem paredes).

Uma mulher de trinta anos em Berlim sonhou coisas estranhas logo após Hitler assumir o poder, em 1933. Em um sonho, ela viu que seu bairro não tinha mais os sinais de sempre, mas sim cartazes com vinte palavras banidas; a primeira era “Senhor” e a última era “Eu”. Em outro sonho, ela se encontrou rodeada por trabalhadores de diferentes profissões, como um gaseiro, um encanador, um jornaleiro e um leiteiro.

Nem quando dormiam os alemães tinham paz, sossego e privacidade, descoberto Charlotte, que, durante a pesquisa, trocou de marido, sobrenome (Beradt) e endereços. No Reich nazista as pessoas tiveram sonhos ou pesadelos com assombrações, perseguições, aflições paranóias, trocas de identidade, controle da mente, censura, prisões e tortura.

Ao se falar sobre o Holocausto, um dos questionamentos mais comuns que nos fazemos é "mas o que se passou na cabeça daquelas pessoas? Como elas assistiram a isso tudo aconteceu?". Em 1933, quando Hitler chegou ao poder, a jornalista Charlotte Beradt teve uma ideia brilhante (sério, que ideia maravilhosa) de colher sonhos de alemães comuns (operários, trabalhadores domésticos, donos de fábricas), numa tentativa de historicizar um período crítico talvez da maneira mais subjetiva possível. O que são revelados em imensa escala são a perda da identidade, a despersonalização, a quebra (literal, em um dos relatos) da espinha dorsal da diminuição humana, o estranhamento de si mesmo e a perda de referências, a sensação de isolamento frente a uma massa supostamente unificada, a imensa.

O primeiro sonho foi escutado apenas três dias após o golpe na República de Weimar. A Alemanha Nazista ou III Reich estava começando. Conscientemente, não se imaginava o que aconteceria, mas, em sonhos, as pessoas viviam como realidade o que durante a vida de vigília não conseguiam entender. Se esse sonhos poderiam ser considerados proféticos, é justamente porque mostravam o que era negado? O sonho que fez com que ela iniciasse a coleção lhe foi contado por um dono da indústria. Nesse sonho, que se repetira, esse homem era humilhado por Goebbels. Ao contar o sonho, a voz do homem ficará trêmula. O totalitarismo que levara Hitler ao poder era falado somente em sonhos? 

Sonhado por um oftalmologista de 45 anos em 1934. “As tropas de assalto estavam colocando arame farpado em todas as janelas do hospital. Eu tinha jurado que não toleraria que eles trouxessem seu arame farpado para minha enfermaria. Mas eu aguentei, afinal, e fiquei parado como uma caricatura de médico enquanto eles arrancavam as vidraças e transformavam uma enfermaria em um campo de concentração - mas perdi meu emprego mesmo assim. Fui chamado de volta, no entanto, para tratar de Hitler porque eu era o único homem no mundo que poderia. Fiquei com vergonha de mim mesma por me sentir orgulhosa e comecei a chorar.”


Deve ser assim em todas as ditaduras, mas Charlotte Beradt (1907-1986) foi a primeira a repertoriar os efeitos de um regime autoritário no inconsciente coletivo e a contaminação dos sonhos pelos "restos diurnos" de uma realidade tenebrosa.

Não há dúvida de que os sonhadores estavam processando suas experiências diárias e dúvidas sobre as intenções e métodos de Hitler, mesmo antes que ele os revelasse e os executasse. Se você está interessado em psicologia, sonhos e o meio social da era nazista na Alemanha, esta é uma leitura obrigatória.


A AUTORA
Charlotte Beradt (1907-1986) foi jornalista e ensaísta. De origem judaica, durante a ascensão de Hitler ligou-se ao Partido Comunista alemão. Em 1939, exilou-se com o marido nos Estados Unidos. Escreveu uma biografia sobre o líder comunista Paul Levi e foi a responsável pela edição de cartas de Rosa Luxemburgo.
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