[RESENHA #573] Meu nome é Selma, de Selma Van de Perre



APRESENTAÇÃO

A autobiografia de uma judia, disfarçada de ariana que sobreviveu às atrocidades da Segunda Guerra e combateu um dos regimes mais autoritários da nossa história. Mas, não espere uma biografia qualquer, a autora Selma van de Perre revela com firmeza - e também delicadeza - como saiu viva de Ravensbruck, na Holanda. As palavras de Selma são repletas de esperança e coragem. Ela tinha 17 anos quando foi deflagrada a Segunda Guerra Mundial. Até aquele momento, ser judia na Holanda não era algo digno de nota. Já em 1941, era questão de vida ou morte. Ela se juntou ao movimento de Resistência e assumiu uma identidade falsa para se passar por ariana. Usando o nome “Marga”, Selma fez “o que foi preciso” para combater o regime nazista. Mas, em 1944, sua sorte acabou, e ela foi levada como prisioneira política para o campo de concentração de Ravensbrück. Hoje, prestes a completar cem anos, ela continua sendo uma força da natureza.

RESENHA

A extraordinária biografia de uma combatente da resistência judaica holandesa e sobrevivente do campo de concentração de Revensbruck. 

Quando o exército do terceiro reich invadiu a Holanda em 1940, Selma, uma estudante de apenas dezoito anos, viu sua vida mudar da noite para o dia com a perseguição sistemática do povo judeu. Afastados e despojados de seus bens, trabalho, educação e vida cívica, o povo judeu holandês se viu perseguido pela Gestapo, pela policia colaborativa, pelos delatores e pelos milhares de aliados. Enviados para o campo de extermínio de Ravensbruck. Começava ali, um início do cenário de horror inimaginada.

Ravensbrück é uma cidade no nordeste da Alemanha, isolada, mas facilmente acessível a partir de Berlim. Os primeiros prisioneiros chegaram em 18 de maio de 1939. Havia cerca de 132.000 mulheres e crianças trancadas no campo de concentração, 92.000 das quais morreram de fome, doenças e execuções. [p.100]

Selma conseguiu fugir da perseguição por um tempo, adotando um nome diferente (Marga), agindo clandestinamente entre Holanda, Bélgica e França, falsificando documentos, abrigando centenas de judeus expatriados, até que foi presa em 1944 e enviada para o campo de extermínio Ravensbruck, ela conseguiu manter-se viva até o dia de sua libertação sob o uso de um pseudônimo, o que não ocorreu da mesma forma que seus pais e irmãos que acabaram sendo mortos no campo.

Nada em nossos rostos denuncia o que estava por vir nos próximos três anos: as mortes de meu pai, minha mãe e Clara, minha avó, tia Sara, seu marido Arie e seus dois filhos, e muitos outros membros da família, não por causas naturais ou um acidente, mas das atrocidades que se espalhavam na Europa na época da foto e logo chegariam também à Holanda. [p.11]

O livro foi escrito por Selma no auge de seus 98 anos de idade, suas descrições acerca dos ocorridos, da infância e de todo processo de expatriação são incrivelmente profundos e tocantes. Assim como toda grande catarse, a obra desenvolve primeiramente na narrativa acerca da infância e vida com a família, uma grande e amorosa família e seus desdobramentos até o dia de sua remoção social até o campo de extermínio. 

[...] . É uma imagem banal de uma família normal; estamos passando uma tarde agradável, curtindo o jardim e a companhia um do outro. Uma imagem de como deve ser o tempo gasto com os membros da família: amoroso, seguro, agradável, previsível. (grifos meus) [p.11]

Selma narra que o processo de expatriação ocorreu de forma gradativa, os oficiais retiravam aos poucos os seus poderes sociais e sua participação política, bem como limitavam seus ganhos, participação pública e empresas.

No ano seguinte, em maio de 1942, além de documentos valiosos, também tivemos que entregar todos os nossos bens, e um dos escritórios do banco tornou-se depósito de nossas mercadorias. Era preciso depositar obras de arte, joias e móveis, além de objetos mais cotidianos como louças e bicicletas: enfim, tudo que pudesse render renda aos nazistas. Nada era muito insignificante; até as colheres de chá foram confiscadas.  [p.37]

Em 1942, o governo iniciou a divisão dos povos que futuramente seriam levados aos campos de concentração, marcando-os obrigatoriamente com marcas que pudesse tornar fácil a identificação de um grupo específico, para os judeus, todos os documentos de identidade foram carimbados com um J, enquanto eram obrigados à costurar em suas vestes a estrela de Davi no alto do peito, nascia ali, o começo do fim de uma população.

Em 23 de janeiro de 1942, os judeus foram carimbados com um grande "J" em seus documentos de identidade, que serviam para distingui-los do resto da população. Em 3 de maio, todos os judeus com seis anos ou mais receberam a ordem de usar uma estrela de Davi amarela com a palavra Jood, "judeu". A estrela tinha que ser costurada em nossas roupas na altura do peito, para que fôssemos facilmente reconhecíveis. Foi um momento terrível: percebemos o quanto éramos estigmatizados. [pag.37]

A autora descreve que a situação tornou-se cada vez mais sombria. Em 1942, exatos setecentos judeus foram detidos em Amsterdã e, no dia seguinte, transportes para o campo de trânsito de Westerbork, com destino final em Auschwitz, na Polônia ocupados por alemães.

A partir deste ponto, Selma narra todo seu medo, anseio e luta durante os anos de cárcere no campo de concentração. Seus relatos são repletos de sofrimento e de uma resiliência inimaginada para alguém de 98 anos descrevendo tais acontecimentos.

A escrita de Selma é honesta e envolvente, transmitindo as emoções vividas durante esse período sombrio da história. Ela nos faz refletir sobre a importância da coragem e da solidariedade em tempos de opressão. Um livro memorável e obrigatório a todo leitor que busca uma compreensão mais assertiva dos eventos da ocupação nazista durante o terceiro reich na Holanda por meio da visão de uma resistente.

[RESENHA #572] Feminismo em comum, de Marcia Tiburi


APRESENTAÇÃO

Podemos definir o feminismo como o desejo por democracia radical voltada à luta por direitos de todas, todes e todos que padecem sob injustiças sistematicamente armadas pelo patriarcado. Nesse processo de subjugação, incluem-se todos os seres cujo corpo é medido por seu valor de uso - corpos para o trabalho, a procriação, o cuidado e a manutenção da vida e a produção do prazer alheio -, que também compõem a ampla esfera do trabalho na qual está em jogo o que se faz para o outro por necessidade de sobrevivência.

O que chamamos de patriarcado é um sistema profundamente enraizado na cultura e nas instituições, o qual o feminismo busca desconstruir. Ele tem por estrutura a crença em uma verdade absoluta, que sustenta a ideia de haver uma identidade natural, dois sexos considerados normais, a diferença entre os gêneros, a superioridade masculina, a inferioridade das mulheres e outros pensamentos que soam bem limitados, mas ainda são seguidos por muitos.

Com este livro, Marcia Tiburi nos convida a repensar essas estruturas e a levar o feminismo muito a sério, para além de modismos e discursos prontos. Espera-se que, ao criticar e repensar o movimento, com linguagem acessível tanto a iniciantes quanto aos mais entendidos do assunto, Feminismo em comum seja capaz de melhorar nosso modo de ver e de inventar a vida.

“O feminismo nos leva à luta por direitos de todas, todes e todos. Todas porque quem leva essa luta adiante são as mulheres. Todes porque o feminismo liberou as pessoas de se identificarem como mulheres ou homens e abriu espaço para outras expressões de gênero - e de sexualidade - e isso veio interferir no todo da vida. Todos porque luta por certa ideia de humanidade e, por isso mesmo, considera que aquelas pessoas definidas como homens também devem ser incluídas em um processo realmente democrático.” - do capítulo “Para pensar o feminismo”.

RESENHA 

Feminismo em comum, da filósofa e professora Márcia Tiburi, é um livro político-crítico do movimento feminista como num todo, de acordo com a autora, o feminismo deve ser pensado de forma analítica e crítica, por se tratar de um movimento arraigado de responsabilidades cívicas teóricas e práticas para erradicação de problemáticas advindas do campo social. Para a autora, o campo de estudo é repleto de autocríticas que merecem uma reflexão social profunda da análise dos atos por meio do poder de representação político-pública, modelo de ação de geração de impacto por meio da ação coletiva de um grupo em busca de uma transformação de comportamento social.

A crítica, na visão da autora, não é uma porta para destruição de um ideal, mas a oportunidade para se conhecer o campo no qual a problemática se desenvolve.

Ela pode ser uma desmontagem organizada que permite a reconstrução do objeto anteriormente desmontado [...] Toda forma de crítica, desde que seja honesta, é válida, mas considero que nesse último sentido, como atenção cuidadosa, é possível seguir aproveitando ao máximo as potências do pensamento que visa à transformação do mundo ao qual o feminismo, como ético-político necessariamente se liga. (grifos meus) (p.5)

O uso de todes, como categoria arbitrária de reconhecimento de gênero não-binário também é abraçado pelo feminismo, uma vez que a luta feminista englobou em seu campo de atuação todas as vertentes sexuais e a liberdade de expressão comum individual e prol do bem coletivo.

Todes porque o feminismo liberou as pessoas de se identificarem somente como mulheres ou homens e abriu espaço para outras expressões de gênero - e de sexualidade - e isso veio interferir no todo da vida. (p.6)

A luta feminista reordenou os aspectos das lutas de caráter coletivo, tornando-se de uma importância para o desenvolvimento de uma democracia radical, o que não ocorre com o machismo, uma vez que este designou de forma abstrata os desdobramentos da vivência coletiva social por meio do poder e ação dos homens em benefício do próprio coletivo, excluindo ações de performance que beneficiam o todo social.

A luta surgiu como uma ferramenta de análise própria de seu campo de atuação, fazendo-se necessário analisar os campos de atuação, os impactos e os resultados obtidos, todos por meio de um exercício crítico de pensamento e posicionamento individual de cada combatente, analisando não somente o feminismo como uma ação político-social, mas como uma ferramenta de construção constante de mudança de comportamento social, coletando informações e digerindo de forma minuciosa os próximos passos que idealizarão as buscas efetivadas por meio das performances coletivas de um todo.

Questionar os ideais nos quais acreditamos, ao contrário do que imaginamos, serve para nos situar no mundo. No entanto, perguntar se praticamos o feminismo como uma crença ou se ele é um instrumento de transformação da sociedade muda tudo. (p.7)

O patriarcado é, como em síntese geral, um sistema retrógrado que está arraigado nos sistemas e nas diretrizes constitucionais vigentes, colocando em benefício vantajoso a figura do homem, excluindo as mulheres, os diretos coletivos e as demais catracas sociais que fazem o mundo girar no dia-a-dia.

O que chamamos de patriarcado [figura responsável pelo sustento do machismo estrutural] é um sistema profundamente enraizado na cultura e nas instituições [...] Em sua base está a ideia sempre repetida de haver uma identidade natural, dois sexos considerados normais, a diferença entre os gêneros, a superioridade masculina, a inferioridade das mulheres e outros pensamentos que soam bem limitados, mas que ainda são seguidos por muita gente. (grifos meus - p.12).

Não é possível pensar o caráter dialógico do feminismo se não pensarmos no machismo como uma profunda falta de diálogo entre seres singulares. O machismo se sustentou no mando, na autoridade e no autoritarismo. Vimos que a misoginia é uma espécie de ódio histórico às mulheres, que aparece no mundo patriarcal em momentos diferentes da história [p.22]

O feminismo se constitui a partir da real necessidade de se dizer o que se pensa e se posicionar, uma vez que o patriarcado tomou para si todas as conquistas femininas, apagando da história os relatos de mulheres e sua vivência, como diz a autora, tudo o que se sabe sobre as mulheres foi documentado e exposto por homens, não tendo assim, um espaço de fala, o que criou a necessidade de se impor e buscar portas e caminhos que fossem-se abertas para que se criasse um diálogo de igual para igual, assim como podemos observar na luta histórica do feminismo em busca de direitos, sobretudo, do direito a fala.

Os homens produziram discursos, apagaram os textos das mulheres e se tornaram os donos do saber e das leis, inclusive sobre elas. Tudo o que sabemos sobre as mulheres primeiro foi contado pelos homens. Da filosofia à literatura, da ciência ao direito, o patriarcado confirma a ideia de que todo documento de cultura que restou é um documento de barbárie. (p.22)

A obra também elucida de forma clara a descrição do feminismo como um todo:

Mas o feminismo é ainda mais do que elucidação, crítica e luta. É também a conquista do direito de ser quem se é. Uma conquista comemorada a cada dia por quem se sente comprometido, em sua vida, com aqueles que não--puderamser-aquilo-que-poderiam-ter-sido em função de preconceitos de gênero e sexualidade, de raça e classe. É o feminismo que alerta para a forma de sujeição inscrita no gênero e na sexualidade. Pensar o que chamamos de gênero e pensar também a sexualidade como mecanismo de opressão: eis o que o feminismo busca. [p.34]

Em síntese, a obra da autora Marcia Tiburi é m convite para todos em busca da compreensão do campo de atuação do feminismo, tornando-o uma luta necessária a todas as classes e sexualidades, não causando uma divisão social como propagada, mas como uma ação conjunta de melhora da sociedade para todo o coletivo existente, não se abstendo de oposições e posicionamentos assertivos que viabilizem uma pauta geracional de diálogo entre todas as partes. Uma obra muito bem elaborada e escrita que esclarece e elucida conceitos e definições pouco conhecidas e de suma importância, trazendo visibilidade para todos por meio de suas ações e lutas diárias como uma ferramenta de mudanças que devem e são necessárias à todos.

Box inédito especial Rachel de Queiroz entra em pré-venda


Box inédito especial Rachel de Queiroz entra em pré-venda com três grandes obras da primeira escritora imortal da Academia Brasileira de Letras.

Este box apresenta três grandes romances de Rachel de Queiroz, para quem deseja conhecer diferentes momentos de sua produção, com personagens femininas fortes: O quinze,As três Marias e Dôra, Doralina.


1. O quinze foi lançado originalmente em 1930, em edição financiada pela própria autora, então com 20 anos, em sua estreia literária. Ao narrar as histórias de Conceição, Vicente e a saga do vaqueiro Chico Bento e sua família, Rachel de Queiroz expõe de maneira única e original o drama causado pela histórica seca de 1915, que assolou o nordeste brasileiro. Clássico da literatura brasileira, O quinze projetou Rachel de Queiroz na vida literária do país, firmando-a como escritora regionalista, preocupada com as questões sociais. A edição é brochura, 208 páginas.



2. As três Marias, que teve a primeira edição em 1939, conta a história de três amigas – Maria Augusta (Guta), Maria da Glória e Maria José –, desde a infância em um colégio de freiras até a vida adulta. Maria da Glória dedicou-se à maternidade e à família; Maria José, sempre devota, voltou a morar com a mãe e se tornou professora; e Maria Augusta, determinou-se a construir um caminho outro, que não o da família e da religião. Nesse romance de formação, Rachel de Queiroz retrata o processo de ajustamento ao mundo pelos olhos das meninas, acompanhando-as desde os medos e as incertezas da juventude até aos dilemas da vida adulta. Sempre juntas, independentemente das escolhas. A edição é brochura, 256 páginas.

3. Dôra, Doralina, publicado pela primeira vez em 1975, narra a história de Maria das Dores, viúva que sai de uma vida de submissão no interior do Ceará para tornar-se atriz e passa viajar pelo Brasil como integrante da trupe de uma companhia de teatro mambembe, vivendo a vida que sempre desejou. Após a publicação dessa obra, Rachel de Queiroz foi convidada a Academia Brasileira de Letras, tornando-se assim a primeira mulher a fazer parte da instituição. A edição é brochura, 432 páginas.

O box pode ser adquirido na Amazon com preços especiais garantidos na pré-venda. Compre aqui no valor promocional de R$129,90 com entrega grátis.

Biografia da Rainha Elizabeth II, por Andrew Morton, já está disponível na pré-venda



Em A rainha, o biógrafo Andrew Morton, autor best-seller referência em biografias sobre a monarquia britânica, apresenta ao leitor detalhes inéditos a respeito da monarca mais singular e consagrada da Grã-Bretanha.


Em “A rainha, Andrew Morton, autor do best-seller “Diana: Sua verdadeira história, celebra o longo reinado de Elizabeth II com um compilado de todas as polêmicas, desafios e também os méritos da singular soberana; além de contar com um encarte que atravessa toda a vida da soberana e trazer um Epílogo com considerações a respeito das futuras gerações da monarquia britânica após essa segunda era elisabetana.

 

O livro relata como, tendo ascendido ao trono aos 25 anos, a discreta monarca enfrentou uma série de conflitos familiares— rumores sobre a infidelidade do marido, o lapso conjugal da irmã, a trágica morte da princesa Diana, e o recente distanciamento de Harry e Meghan dos deveres reais—  mas também protagonizou importantes triunfos, sempre com muita seriedade, comprometimento e respeito à tradição.


APRESENTAÇÃO

Após a morte prematura do pai, George VI, Elizabeth Alexandra Mary se viu como Elizabeth II, a mais nova rainha da Grã-Bretanha.

A rainha relata como, tendo ascendido ao trono aos 25 anos, a discreta monarca enfrentou uma série de contratempos e conflitos familiares, mas também protagonizou importantes triunfos, sempre com muita seriedade, comprometimento e respeito à tradição ― características que se tornaram símbolos marcantes dos setenta anos de seu reinado.

Ao mesmo tempo chefe de Estado e da Igreja da Inglaterra e líder da Grã-Bretanha e da Commonwealth, Elizabeth II provou sua resiliência e seu comprometimento ao dar tudo de si para manter a monarquia britânica relevante cultural, social e politicamente ― enfrentando, por vezes, resistência dentro da própria instituição. Ainda assim, as maiores crises que ela precisou administrar surgiram em sua família, sempre sob intenso escrutínio da opinião pública: os rumores sobre a infidelidade do marido, o príncipe Philip, o lapso conjugal da irmã, a princesa Margaret, a trágica morte da princesa Diana, na época sua nora, e o recente distanciamento de Harry e Meghan dos deveres reais.

Em A rainha, Andrew Morton, autor do best-seller Diana: Sua verdadeira história, celebra o longo reinado de Elizabeth II com um compilado de todas as polêmicas, os desafios e também os méritos da singular soberana; além de contar com um encarte que atravessam toda a vida da soberana e trazer um Epílogo com considerações e previsões a respeito das futuras gerações da monarquia britânica após essa segunda era elisabetana.

“Uma narrativa que aborda todos os grandes momentos e reviravoltas… Certamente é o que a rainha Elizabeth iria querer.” ― The Washington Post

[#LeiaNacional] Entrevista com Hugo Bessa, autor de ❝por um momento, um dia, uma vida ou sei lá o quê❞


Hugo Bessa nasceu em Volta Redonda (RJ), mas foi em Cruzeiro (SP), onde cresceu e vive hoje, que descobriu sua paixão pelas histórias. É jornalista, especialista em Língua Portuguesa, e atua na produção de conteúdo para comunicação empresarial. O livro por um momento, um dia, uma vida ou sei lá o quê  é seu terceiro livro, e como era de se esperar, conta com uma abordagem agridoce e fermentada com bastante drama familiar, e é sobre esta obra na qual iremos falar hoje.

01. De onde surgiu o enredo do livro?

Eu tenho essa história na cabeça há muitos anos, talvez tenha sido a minha

 primeira ideia literária. Nunca havia colocado no papel, sempre ficou guardada em algum lugar aqui dentro. Ela veio de uma frase atribuída a Carl Jung, e que li em um livro: "o encontro de duas pessoas é pura química, pois, se houver reação, elas se transformam".

 No momento em que li essa frase, imaginei uma batida de carro que faz duas pessoas terem suas vidas misturadas e que acabam se transformando. Essa simples ideia permeou meu pensamento por anos e, quando comecei efetivamente a escrever, acho que em 2020, pensei

 nos desdobramentos e acabei incorporando outros elementos à história.


02. Quais foram suas principais inspirações para o desenvolvimento deste enredo?


A frase que eu mencionei acima foi a faísca que acendeu a história, mas outros
elementos me inspiraram, como os pequenos momentos do dia a dia, as pequenas coincidências, os pequenos encontros, em como podemos mudar o estado de espírito de alguém com um simples 'bom dia' ou o nosso próprio, ao escutarmos, por acaso, a conversa de alguém, o que nos leva a pensar na nossa vida. Acho que a maior inspiração é esse emaranhado que é a vida, esses vários caminhos se cruzando, o que é bem representado na capa do livro.


03. Um recurso que transforma a experiência com sua escrita é a possibilidade
de analisar as situações sob óticas distintas de cada personagem durante os encontros acalorados dos protagonistas. Por que optou por fazer uso deste recurso?


Como eu queria falar sobre essa transformação que um causa na vida do outro, precisávamos ser íntimos dos protagonistas, e enxergar a partir do ponto de vista deles. Eu sempre quis contar a história assim, é uma forma que gosto muito e que usei no meu primeiro livro, Em um lugar melhor, porque permite que a gente entenda que nem tudo aquilo que o personagem mostra o traduz de verdade. Agora, trazer também o ponto de vista dos personagens que circulam pelo mundo dos protagonistas foi algo que eu decidi na hora de começar o livro, porque eu queria abordar não apenas as grandes transformações, mas também as pequenas, às vezes imperceptíveis, que duram apenas um momento.


04. Não é muito comum livros que abordam a vida de protagonistas com mais de
50 anos, porém, isso aproxima o leitor da realidade, visto que, todos nós estamos propensos a fazer escolhas erradas. De que forma e por que motivo você optou por construir uma história focada nesta faixa etária tão inexplorada nos livros ?


Acho que era importante para a história ter essas duas pessoas adultas, com uma grande bagagem e desiludidas com suas escolhas. Não é um livro sobre o amor romântico, é um livro sobre outras formas de amor e desamor, é uma história que pergunta até quando podemos nos transformar. E a mudança ganha outro peso com a passagem do tempo. Nunca enxerguei outro universo para a história que não fosse esse. Poderia fazer dois jovens batendo de carro e se apaixonando? Poderia, e seria muito mais conveniente e fácil em vários sentidos, mas não seria esse livro.


05. Um tema bastante frequente na realidade e presente na obra é o enfraquecimento
da relação entre mãe e filho em relação à pauta sexual. É muito comum a ausência de compreensão dos pais acerca da sexualidade dos filhos. Este acontecimento marca uma série de outros que ocorrem com Joana. A pauta foi uma forma de mostrar a personagem sob uma ótica específica acerca de suas próprias escolhas? O que o motivou à partir para esta pauta na vida da personagem?


Essa falta de compreensão da Joana em relação à sexualidade do filho foi mais um elemento para mostrar como ela é uma pessoa dura, fechada em suas crenças, preconceitos e escolhas, e acabou enriquecendo muito a história. Além disso, trazer personagens LGBTQIAPN+ em meus livros, seja como trama principal ou não, é um compromisso que eu tenho comigo mesmo desde o meu segundo livro. Como autor gay, eu acho importante usar a minha voz, minhas vivências e minha realidade para abrir a mente das pessoas e contribuir para um mundo mais diverso e inclusivo.


06. De todos os personagens secundários criados e não explorados, Berenice, tornou-se a mais marcante, ela foi responsável por tornar o enredo leve já nas primeiras páginas. De que forma ocorreram as construções destes personagens, e por que você acredita que Berenice tenha sido a mais marcante ?

Acredito que ela ficou marcada por ser a primeira coadjuvante que ganha seu próprio capítulo, e por completar o arco narrativo, sem dar muitos detalhes. A construção desses personagens veio da necessidade de mostrar que, às vezes, mudamos o momento ou o dia de alguém e nem nos damos conta disso, o que tem tudo a ver com a história central. Para localizar essas pessoas na narrativa, eu sempre pensava onde estariam Roberto e Joana naquele ponto da história e que tipo de personagens poderiam cruzar com eles. Foi também uma oportunidade de desenvolver melhor o marido, a esposa e os filhos, que já estariam no livro, de uma maneira ou de outra.


07.Que outras interpretações da obra são possíveis? Você já leu ou ouviu uma
interpretação interessante acerca da leitura de sua obra ?


Eu acho que mais do que interpretações, ela pode tocar nas pessoas de formas diferente, seja pela leveza, pelas partes dramáticas ou pela revelação, que acontece mais perto do final e que muda o olhar para a história. Já li pessoas trazerem detalhes ou questionamentos que eu achei que não fossem surgir, mas ler é uma experiência tão única, que é normal que seja assim. E eu amo escutar tudo o que têm para me dizer sobre o livro.


08. Como tem sido a recepção do público em relação a sua obra?


Muito positiva. Quem lê, gosta bastante, e claro que eu me sinto muito lisonjeado. Estou no meu terceiro livro e é, sem dúvidas, o que as pessoas mais gostam. Espero que eu consiga fazer com que ele chegue a um público cada vez maior. Confesso que esse é o primeiro livro que me faz deixar a Síndrome do Impostor de lado e me enxergar como um escritor de verdade. 


09. Qual foi a parte mais difícil durante todo processo de escrita ?


O meio do livro. Porque eu sabia o começo, sabia o final, mas não tinha ideia de como seria o recheio. E comecei sem saber! Fui descobrindo aos poucos, durante a escrita, o que tornou tudo ainda mais emocionante. O curioso é que eu comecei achando que sabia o final, mas eu o mudei completamente. Na verdade, os personagens me conduziram a ele. Não posso entrar em detalhes, mas o final original seria basicamente o oposto do que foi.


10. você pretende desenvolver novos livros com uma abordagem semelhante?


Pretendo, sim. Cada autor tem o seu estilo próprio, e muito do que há em "Por um momento, um dia, uma vida ou sei lá o quê..." faz parte do meu. Inclusive, eu acho que é o livro que mais traduz quem eu sou, com essa mistura de drama e humor


11. O que podemos esperar para os próximos lançamentos?


Eu tenho três histórias na cabeça, e já escrevi o primeiro capítulo da próxima. Vai ser um romance LGBTQIAPN+ e para um público um pouco mais jovem. As outras duas histórias são mais adultas e, em uma delas, o protagonista é um idoso. Nenhuma das três histórias é tão leve, mas eu gostaria de me dedicar depois a tramas mais softs. O difícil é conseguir, porque a veia dramática aqui é forte.



12. onde podemos acompanhar melhor o seu trabalho?

Pelo meu Instagram: @hugobessaescritor . Não levo muito jeito para a vida de influencer, mas estou me esforçando para aparecer e criar conteúdo. Hoje em dia, o escritor tem que fazer de tudo um pouco.

[RESENHA #571] escova de dentes, de Cris Oliveira


APRESENTAÇÃO

A poeta não é uma fingidora. O que ela fingiu por um tempo foi que não era poeta. Segurou, disfarçou, mas as palavras que ela tanto tinha começaram a sair, a ocupar espaço, a voar. Palavra presa quer sair; pessoa, então... “Minha coragem é minha liberdade”, ela escreveu e eu li.

Corajosa e livre, Cris Oliveira lança seu primeiro livro colocando nosso cotidiano em poesia e nos fazendo repensar cada palavra. Para ler e reler sem cansar e sempre descobrindo coisas novas.

— Roberta Martinelli

RESENHA

Cris Oliveira é uma escritora nata, em seu primeiro livro ela desdobra sobre as minúcias do cotidiano da vida, como escovar os dentes ou espetar o bolo quente com palito de dente. Sua prosa altamente revigorante transita entre o agora e o amanhã, livre de pretensões ou planejamentos, é tudo assim, solto no ar como a poesia deve ser. 

A obra é um emaranhado poético elaborado com um fio condutor espelhado, não começando do início e não tendo um caminho específico à se tomar, mas se estilhaçando em diversos pedaços e lugares distintos, pois sua poética soma-se em sua totalidade, alternando entre um poema e outro sempre com resquícios de um poema anterior, todos fomentados de forma minuciosa pelas descrições do cotidiano, do medo, do fracasso, da dor e dos desejos que circundam a esfera cívica emocional.

o poema palito de dente, na página 22 é uma descrição sobre a vida cotidiana que as vezes levamos solitariamente de forma descontinuada sem percebermos enquanto vivenciamos o agora, a crítica é, de certa forma, uma forma de pensar e repensar o agora e o depois por meio da própria companhia, bem como o desenvolvimento que encontramos na solitude que desfrutamos em nossa própria companhia.

ando meio sem verbo nem verbete

tenho um pingente

de coração

uso palito de dente

para furar

bolo quente

fincar azeitonas

limpar as unhas

desentupir o bico da super cola

quase não vejo gente


ando sem ter o que

dizer sem

saber o quem

pra quem (p.22)

o poema que dá título ao livro é uma descrição daquilo o que fazemos continuamente todos os dias, daquilo que ansiamos e sentimos saudade, é a experimentação da prova do desapego às rotinas, ao passo de que somos levados à completar-nos com a saudade do que fazíamos e do que fazemos para distrair a saudade daquilo o que costumávamos vivenciar. A obra contem 102 páginas e diversos poemas que transitam entre os sentimentos aflorados no cotidiano e nos sentimentos que sentimos ou deixamos de sentir por meio da ação do tempo, cada poema carrega em si uma particularidade única que torna a experiência com a escrita da autora algo mágico, único e que vale a pena viver, não apenas uma outra vez, mas sempre, como num exercício de autoreflexão.

Já no poema sobre o desperdício (p.45), a autora nos fala sobre a importância de dizer o que temos para declarar ou enfatizar, de não deixar passar a hora, nem o momento não desperdiçando oportunidades de falar o que sentimos no momento em que sentimos.

tudo o que eu não digo

cai no despercebido

um maldito não dito (p.45)

 já o poema se (p.49), é o mais proeminente quanto o assunto é sentir e viver.

se

não cutucar mais a ferida

botar panos quentes

tocar o sapato velho

descascar o abacaxi

arrumar a gaveta

vestir a camisa

acertar os relógios

juntar             o ir e vir

dobrar mais uma esquina

jogar o jogo

não perder o      fôlego

voltar para casa

virar a maçaneta

entrar

A obra de Cris trabalha na síntese de que somos tomados por sentimentos durante o dia-a-dia, observa-se, que, em seu primeiro livro, a autora optou por uma abordagem não-direta, abrindo caminhos para interpretações eu em detrimento do sentimento que nos evoca no momento, entre outras palavras, a obra tensiona uma experimentação individual de cada leitor, afinal, cada um vive e sente de uma forma diferente, mas a receita é apenas uma: o dia-a-dia.

la bise, poema que me tomou por completo, pag. 91, é uma experimentação acerca dos sentimentos que nos tomam quando menos esperando -  quando bate o vento frio, são ares ou pesares? quando somos tomados pela ansiedade somos invadidos pelo processo do agora, mas não focamos no final, e por fim, somos dominados pelo poder do agora, não refletindo no porvir, tudo não passa de um eterno ferme de budé, p.90 :

penso no vento

que balança

o trigo

penso no trigo

não penso no pão.

poemas que nos lembram da brevidade dos momentos, como em na fotografia:

não sei e você está tirando ou calçando o sapato, p.87.

Em síntese, a obra é um convite à experienciarmos o simples da vida. Neste primeiro livro a autora traz questões relevantes para uma reflexão diária, a leitura de seus poemas torna-se necessária durante todos os dias, como um exercício de auto-análise e reflexão. Sem dúvidas, uma autora proeminente que conquistará uma legião de fãs de poesias.

A AUTORA

Cris Oliveira (@cris_taiane) (São Paulo, 7 de março de 1974) é formada em Biblioteconomia e Documentação pela Universidade de São Paulo e trabalha com gestão de coleções digitais e metadados na sede da OMS em Genebra. Frequentou os cursos Escrevendo Poesia da Oxford University, Escrita Criativa da Esc. Escola de Escrita e Narrativas Curtas da Universidade de Cambridge. Atualmente frequenta o curso de Tradução: Inglês-Português da Universidade de Toronto. Participou em antologias da I Jornada de Poesia Virtual e do VI Festival de Poesia de Lisboa, tem textos publicados na Ruído Manifesto, selo Off Flip e no blogue da Bibliotrónica Portuguesa da Universidade de Lisboa. Escova de dentes (Paraquedas, 2023) é seu primeiro livro.


[RESENHA #570] Prostituição à brasileira, de José Carlos Sebe B. Meihy


APRESENTAÇÃO

Muito se fala sobre a vulgarmente chamada “profissão mais antiga do mundo”. Termos recorrentes nos noticiários (e também na ficção) como “tráfico de pessoas”, “turismo sexual”, “indústria do sexo”, assim como o montante de dinheiro movimentado pela prostituição são repetidos à exaustão. Porém, poucos dão voz aos verdadeiros protagonistas dessa história. Estima-se que o número de pessoas se prostituindo no mundo ultrapasse os 40 milhões. Mas quem são realmente essas pessoas?

Neste livro, José Carlos Sebe B. Meihy nos traz o relato de cinco vidas, de cinco histórias de brasileiras e brasileiros que entraram no universo da prostituição internacional, narradas por eles mesmos. O autor nos oferece, assim, múltiplos olhares e experiências vindos de dentro do mundo que trata o sexo como negócio, deixando aberto para que o leitor julgue por si cada um desses impressionantes relatos. 


RESENHA

Meihy, José Carlos Sebe B. Prostituição à brasileira : cinco histórias / José Carlos Sebe B. Meihy. – São Paulo : Contexto, 2015.

Prostituição à brasileira é um livro que abre precedentes para um diálogo acerca da exploração comercial do corpo como meio de sustento. O professor e autor da obra, José Carlos Sebe B. Meihy, descreve o cenário através da narrativa de cinco pessoas: três mulheres e dois homens que vivem da comercialização do próprio corpo em terras estrangeiras.

A obra aborda as questões legais, físicas, emocionais e históricas da prostituição e a visão social acerca deste campo de atuação. Já nas primeiras páginas o autor desenvolve um breve ensaio explicativo acerca da importância de uma escrita e exposição de uma obra com esta temática, fugindo do clichê e abordando de forma séria as nuances através das óticas de pessoas que vivem na pele o dia-a-dia da comercialização sexual do próprio corpo. Os relatos foram escolhidos pelo autor através de uma série de entrevistas elaboradas com vários profissionais do sexo durante um longo período de estudo, cada narrativa possui descrições e experiências distintas com uma visão assertiva dos eventos fora do país.

Como ir além das avaliações estatísticas, crônicas policiais, questões de direito internacional e trabalhista ou crítica moral? Por que e para quem expor narrativas íntimas de tipos sempre situados no limite da transgressão, envolvidos em polêmicas infindáveis? Como inscrever o tópico em debates que valham por fundir aspectos da sociedade globalizada e de indivíduos singulares, em particular os vulneráveis? Com essas perguntas, busquei dar sentido a tantos casos que há cerca de 15 anos me comovem, desafiando a registros difíceis e análises incômodas. (p.13)

Os desdobramentos espelham-se no fato da profissão do sexo ser a mais antiga do mundo, datada de longos períodos que seguem-se sendo analisados de forma cautelosa com uma sondagem histórico-explicativa, bem como os resquícios dos estudos acerca da temática, da exploração do corpo, da vivência cultural em outro país, bem como os tráficos envolvendo homens e mulheres no meio comercial sexual.

Identificada na Antiguidade oriental e ocidental e na Idade Média como ilhas de experiências isoladas, a prostituição ganhou feições universais quando se estabeleceram as rotas do mundo moderno, integradas gradativamente pelo estabelecimento do sistema colonial. (p.15)

A obra também expõe os desdobramentos e procedimentos adotados para as análises e proposta histórico-literária:

Dois procedimentos foram assumidos como hipóteses analíticas para a compreensão da prostituição contemporânea, em particular a que inscreve pessoas vulneráveis: a constatação dos números da prostituição contemporânea e a retomada histórica que, num assomo rápido, permite o entendimento de conceitos semeados no pretérito longínquo, projetados nos dias de hoje. (p.16)

A história dos protagonistas revelam o equívoco já esperado por muitos: a possibilidade de uma vida melhor, o exercício da prostituição como qualquer outro trabalho, o sonho de se residir em outros países e localidades e a banalização do cotidiano dos profissionais do sexo.

O propósito primordial do livro consiste em apresentar como exemplo das pessoas que operam na indústria do sexo como atividade comercial. Ao longo da obra, o autor estabelece paralelos entre a história da prostituição, que sofreu uma transformação significativa com a expansão colonialista, adquirindo características universais com o estabelecimento das rotas comerciais do mundo moderno, e o fato de que, nos dias atuais, a prostituição em nível internacional ainda apresenta elementos dessa relação colonial, o que, em parte, explica o aumento contínuo e progressivo da rede de tráfico de seres humanos. Em suas tentativas, José Carlos aborda essas questões conflitantes.

A utilização do corpo como um meio capitalista para fins coloniais é um aspecto crucial para a compreensão das relações sociais que envolvem o comércio sexual. Embora seja amplamente aceito e considerado como algo natural, é moralmente condenável em diversos aspectos, principalmente naqueles que impactam diretamente a representação das mulheres.

As narrativas de Lindalva, Miro, Margarida, Leide e Cristóvão discorrem sobre informações valiosas sobre suas origens e a vida que deixaram para trás no Brasil. Descrevem detalhadamente o cotidiano da prostituição, suscitando questionamentos que muitas vezes não são ampliados devido às dificuldades em vislumbrar outras possibilidades. É possível notar, também, uma certa engenhosidade nos primeiros contatos com o universo da prostituição, uma vez que essas pessoas acreditam que não haverá tanta violência e que se trata de um negócio como qualquer outro. 

A maternidade é descrita de maneira significativa na história de Margarida, enquanto o tráfico de pessoas é mais explorado sob a visão das descrições de Miro. Já a questão das travestis é comentada na parte de Cristóvão Jorge. Leide e Lindalva desenvolveram histórias mais comuns de se terem contato, refletindo na realidade das prostitutas brasileiras, marcadas por violência sexual e racismo. Essas narrativas são o ponto alto do livro, e por isso, peço desculpas por não selecionar trechos e citá-las, uma vez que isso as retiraria de seus contextos.

Em síntese, a obra é uma ótima leitura para quem deseja se aprofundar no tópico, bem como para amantes de livros que abordam a realidade.

Livro sobre a história do BTS já está disponível em pré-venda

A editora Galera Record, em parceria com a BIGHIT MUSIC, anunciou na última quinta-feira, 19 de junho, a pré-venda do primeiro livro oficial de memórias do grupo sul-coreano BTS. Intitulado BEYOND THE STORY: UMA HISTÓRIA DOS 10 ANOS DE BTS, o lançamento comemora o aniversário de 10 anos de estreia da banda.

O livro, escrito pelo jornalista Myeongseok Kang, apresenta histórias compartilhadas por meio de entrevistas e mais de três anos de acompanhamento da banda. A obra narra cronologicamente a jornada dos integrantes desde o período de treino até a atualidade, além de incluir fotos inéditas, códigos QR dos vídeos e informações dos álbuns.

BEYOND THE STORY: UMA HISTÓRIA DOS 10 ANOS DE BTS estará disponível mundialmente em 9 de julho, data oficial do ARMY, nome dado aos fãs da banda.


Mês do Orgulho: poeta paulista ousa em procedimentos de escrita, como uso de IA, para discutir questões políticas e eróticas da masculinidade


"Testoste-TRIP", estreia de Felipe Eduardo Lázaro Braga, é uma das primeiras obras brasileiras a experimentar com poesia gerada por Inteligência Artificial

“Pisar (com o pé direito) no acidentado e por vezes movediço campo da poesia brasileira contemporânea trazendo debaixo do braço elementos como a matemática, a psicanálise, Warhol & Wesley Safadão, Blue Space & Shakespeare, a deliciosa putaria conversada em aplicativos de encontros, diálogos com inteligências artificiais e tantos outros elementos magnificamente desconcertantes é tarefa arriscada. Lemos aqui uma espécie de Joaquim Cardozo atravessado pelo riso e pelas questões queer. Talvez do risco e do riso nasçam, justamente, os pontos altos deste alto livro”

Trecho da orelha de “testoste-TRIP", 

assinada por Matheus Guménin Barreto,

 poeta, editor da Revista Ruído Manifesto e tradutor


A capa de "testoste-TRIP" (150 págs., Kotter Editorial), livro de estreia do poeta paulista Felipe Eduardo Lázaro Braga, chama atenção não apenas pelo tom rosa-choque, mas pela ilustração, que sugere um movimento fálico e, de certa forma, violento. Em um olhar mais atento, percebe-se que a imagem chocante não vem despropositada — na verdade, ela referencia o obsceno gesto do goleiro Emiliano Martinez ao receber o Prêmio Luva de Ouro na Copa do Mundo de 2022, no Qatar. 


Para o autor, essa provocação da capa é, na verdade, a chave de leitura da obra. "Essa imagem sintetiza alguns dos pontos do livro e, mais do que tudo, o tom do livro: subjetividade fálica, muita imaturidade, certo homoerotismo (esse sujeito aí atrás tá com uma cara super engraçada), piada, política (o cara fez um gesto profundamente obsceno no Qatar, um dos lugares mais conservadores e homofóbicos do mundo)", explica Felipe.


O processo de escrita se iniciou durante o período pandêmico, em que Felipe observou um movimento em que a humanidade e o desrespeito pareciam caminhar juntos, seja na dimensão política do país, seja na dimensão afetiva. “As duas coisas se juntaram: estresse ideológico e estresse sexual, isolamento e incerteza. Acho que o livro tem os temas que tem, sexo e política, porque eram as angústias afetivas inerentes ao isolamento, a todos os sentidos de isolamento”, analisa.

Os poemas de "testoste-TRIP", dessa forma, abordam importantes discussões que tangenciam a sexualidade e a política, principalmente no âmbito da masculinidade, sendo enfaticamente direcionado ao público LGBTQIA+. Estes temas, porém, são trabalhados a partir de uma ampla liberdade de experimentação do autor, que concebe uma tessitura que se destaca por amarrar uma diversidade de referências, que vão de um universo erudito — como Andy Warhol e Álvaro de Campos —a figuras do cenário pop (caso do próprio Emiliano Martinez e do cantor sertanejo Wesley Safadão), perpassando também por eixos pouco convencionais, como a matemática.


Além disso, "testoste-TRIP" também se destaca ao trazer para jogo uma ferramenta amplamente debatida no universo artístico: a Inteligência Artificial. Segundo Felipe, alguns dos poemas têm inspiração ou foram integralmente produzidos por meio de IA, sendo uma das primeiras obras publicadas com o uso do recurso.

O autor, porém, optou por não sinalizar a autoria dos textos. "Se eu selecionar dez, quinze poemas do livro, e pedir para as pessoas tentarem adivinhar quais poemas foram escritos por mim, e quais poemas foram escritos pela IA, as pessoas dificilmente vão acertar", afirma. "Acho que isso já dá uma dimensão interessante para a leitura, uma meta-dimensão para a leitura, pensar quando não será mais possível distinguir a obra poética de um autor de carne e osso, da poesia, sensibilidade e criação de uma IA".


Felipe Eduardo Lázaro Braga: a escrita como libido 


Felipe Eduardo Lázaro Braga nasceu em Osasco, na Região Metropolitana de São Paulo, em 1989. É filósofo e atualmente cursa pós-graduação no programa de Sociologia da USP (Universidade de São Paulo). Além de poesia, escreve sobre arte urbana, matemática e política, tendo textos publicados em veículos como Justificando, Caos Filosófico, Revista Híbrida, Money Times e Público.


Como escritor, já colaborou com diversas revistas literárias, como a Pixé, a SubVersa e a Desenredos. Possui textos publicados antologias e jornais impressos, como o jornal O Estado de São Paulo. 


Apesar disso, Felipe conta que seu processo criativo é pouco definido, sem metas ou prazos diários. "Se eu conseguir escrever uma frase bonita, que realmente faça sentido, o dia tá mais do que maravilhoso. Se eu não conseguir, também não fico muito desesperado não", expõe.


Para ele, a escrita deve ser sincera e partir de um desejo interno, sem ser movida pela pressão de publicar, por exemplo. E dá dicas para quem deseja seguir na escrita: "Escreva o que cair em cima da sua libido naquele momento, curta o próprio momento de escrever, de pensar, de sacar uma sequência legal de palavras", aconselha. "Acho que essa é a fronteira entre a honestidade e o texto meio postiço, afetado, artificial, que quer ser publicado, e não escrito.”


Confira o poema “Beijo livre III”, que integra “testoste-TRIP” :

"sei tanta coisa sobre você

entrecortada por dois passos

e uma volta


(geometria de vários pontos

sem nome: etc e eu)

\/\/\/\/\/\/\/\/\/\/\/\/\/ eu \/\/\/\/


para que o próprio andar te desvie

do sol e de ser abrupto,

dois olhares irresistíveis:


ambos meus,

e um para cada glúteo

torneado de andar a esmo


(oxigenada musculatura de voltar bem, é partir sempre)"



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