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O Vermelho e o Negro: Uma Obra-Prima Atemporal de Stendhal

Foto: Arte digital


APRESENTAÇÃO

O vermelho e o negro conta a história de Julien Sorel, um jovem pobre e talentoso que, nos convulsivos anos de 1830, deixa para trás sua origem provinciana para circular entre as altas esferas da sociedade parisiense.
Mas o passado é traço difícil de apagar, e tão fortes quanto a determinação de Julien são as paixões que o dominam: o jovem tenta sufocar lembranças pessoais e a admiração ardente que nutre por Napoleão, figura non grata nos salões burgueses da Restauração, mas o faz em vão.
Crônica mordaz de seu tempo e romance inaugural do gênero psicológico, não é à toa que esta obra cumpriria à risca o destino vaticinado por seu autor, vindo a ser compreendida apenas muitos anos após sua publicação.


RESENHA

Foto: Arte digital



Henri Beyle, também conhecido como Stendhal, via seus romances como bilhetes de loteria, buscando encontrar leitores no futuro. Le Rouge et le Noir, publicado em 1830, acabou por se tornar um sucesso, com destaque em retratos oficiais e inspirando ópera rock e balé. Nascido em uma família rica em Grenoble em 1783, Stendhal foi testemunha das repercussões da Revolução Francesa e participou das campanhas de Napoleão Bonaparte. Seu foco na busca pela felicidade foi evidente em sua escrita e vida, mostrando-se sensível e reservado após sua morte.

Este romance francês, escrito há quase duzentos anos por Stendhal, é um dos poucos livros que me envolveram tanto. O envelhecimento do autor tem sido realmente notável, já que a leitura deste romance é simplesmente cativante: com capítulos curtos, prosa descomplicada e um enredo que mantém o leitor constantemente intrigado. O fato de o romance não ter sido muito apreciado durante a vida de Stendhal mostra como o gosto literário mudou ao longo do tempo. É difícil dizer se essa mudança foi para melhor, mas pelo menos agora podemos apreciar a obra-prima do autor.

Para mim, a característica mais marcante de Stendhal é a interação entre o idealismo romântico e o realismo desanimador em suas obras. Assim como seu contemporâneo Balzac, Stendhal retrata o mundo de forma minuciosa. Cada personagem, cena e situação são cuidadosamente realistas. Apesar de não ser um romance político, Stendhal consegue pintar um retrato sutil e convincente da sociedade de sua época, incluindo a dinâmica entre as províncias e Paris, os conflitos políticos entre liberais e monarquistas, e as relações entre camponeses, clero e a antiga aristocracia. Seus personagens, embora únicos, também representam tipos reconhecíveis que ele usa para analisar e explorar as realidades sociais da época.

Por outro lado, a famosa agudeza psicológica de Stendhal atua como contrapeso ao detalhe excessivo, transformando o que poderia ser um estudo social datado em uma história emocionante de importância universal. Para o protagonista, Stendhal cria Julien Sorel - apaixonado, brilhante, teimoso, ingênuo, calculista, ambicioso e evidentemente inadequado para sua posição social.

Como um liberal, Stendhal poderia facilmente ter escrito uma história moral sobre o destino de um homem talentoso nascido em meios desfavorecidos, sem oportunidades para progredir. Esta é exatamente a situação de Julien Sorel. No entanto, ao invés disso, Stendhal nos apresenta um personagem imperfeito e complexo, muito mais intrigante. Ele não apenas retrata as dificuldades impostas pela sociedade, mas também como ela influencia a mente e a psique de Julien de maneira sutil.

Privado de qualquer motivação externa, a força motriz de Julien deve vir da ambição mundana e do orgulho egoísta. Como seu único caminho para o progresso é através daqueles que ele despreza - o clero e a aristocracia - Julien deve ser enganoso, hipócrita e sempre cauteloso. Suprimindo constantemente suas próprias emoções e frequentemente agindo contra suas inclinações, sempre que Julien experimenta um pouco de gentileza, amor ou felicidade, ele perde o controle e ameaça desfazer tudo o que sua sutilidade calculada havia alcançado.

Esse retrato psicológico é executado com tanta perfeição que ao mesmo tempo sentimos simpatia, torcemos e enxergamos através de Julien Sorel. Ele é extraordinário, mas dolorosamente confinado por seu entorno. Sua tragédia é que as circunstâncias privaram o mundo do que ele poderia ter sido se tivesse nascido em uma época e lugar diferentes. O fato de Stendhal ter conseguido criar, ao mesmo tempo, um conto de moralidade universal, um esboço realista da sociedade, um estudo psicológico vívido e um romance emocionante - completo com uma história de amor passional - tudo na prosa mais simples, é uma prova da habilidade do autor. Alta arte.

Em "O Vermelho e o Negro", Stendhal conseguiu criar uma obra-prima que transcende gêneros e épocas, retratando de forma brilhante a complexidade da natureza humana. Sua habilidade em combinar idealismo romântico com realismo desanimador resulta em um retrato sutil e convincente da sociedade de sua época. A agudeza psicológica com a qual ele descreve o protagonista Julien Sorel é extraordinária e nos faz sentir empatia e torcer por ele, ao mesmo tempo em que enxergamos suas limitações. Stendhal demonstra uma maestria indiscutível ao criar um conto de moralidade universal, um estudo social realista e um romance emocionante, tudo em uma prosa simples e envolvente. A capacidade do autor de nos transportar para o mundo de suas personagens é verdadeiramente impressionante, tornando "O Vermelho e o Negro" uma obra de alta arte e um verdadeiro tesouro da literatura.

[RESENHA #991] Esboço de uma teoria da cultura, de Zygmunt Bauman


O livro Ensaios sobre o conceito de cultura, originalmente intitulado Culture as práxis (Cultura como práxis), foi escrito por um Bauman anterior à sua fama por abordar a liquidez da era moderna. Nesta obra, composta por três capítulos, Bauman revisita a evolução do conceito de cultura desde a filosofia grega antiga até o pós-estruturalismo. O primeiro capítulo explora a cultura como conceito, enfatizando sua natureza ambígua e sua incorporação em três universos discursivos distintos: hierárquico, diferencial e genérico. Bauman introduz o conceito hierárquico de cultura, destacando sua origem e a importância da educação e refinamento na sociedade. Ele discute a ideia de que a cultura é uma propriedade humana que pode ser adquirida, transformada e moldada. Para Bauman, a cultura hierárquica é carregada de valores e serve como um ideal a ser alcançado.

Bauman analisa que, para os antigos gregos, o ideal cultura-natureza não se dividia como estamos acostumados hoje em dia. O que era moralmente bom também era esteticamente belo e mais próximo da verdade da natureza. A unidade preordenada da realização era expressa no conceito de kalokagathia, que combinava o belo e o bom, discutido por todos os pensadores do período clássico. A parte "bom" do conceito correspondia aproximadamente às palavras admirar e louvar. Quanto à questionável hierarquia da cultura em geral e da kalokagathia em particular, Bauman destaca a análise de Gellner sobre a "bobilidade", que é um artifício sociológico através do qual a classe privilegiada absorve parte do prestígio de certas virtudes valorizadas sem precisar praticá-las. Existe uma relação estreita entre a noção de bobilidade e a lógica estrutural dos processos vivos, mas a avaliação do papel da hierarquia em uma sociedade conflituosa depende do contexto estrutural que é escolhido como referência.

Os conflitos em torno da noção hierárquica de cultura podem refletir o descontentamento dos grupos marginalizados. No entanto, atualmente, o conceito hierárquico não está mais ligado à antiga kalokagathia. O intelecto e o dinheiro podem impulsionar a mobilidade social ascendente, e Bauman argumenta que a cultura em sua forma hierárquica foi reinventada em favor dos eruditos e intelectuais.

A cultura como conceito diferencial é utilizado para explicar as diferenças entre as comunidades humanas, situando-se entre os conceitos residuais das ciências sociais. Historicamente, antropólogos têm utilizado este conceito para compreender e compartilhar as verdades culturais de diferentes grupos sociais. Por outro lado, o conceito genérico de cultura aborda a dicotomia entre o mundo humano e o mundo natural, destacando os atributos que distinguem a espécie humana. Neste contexto, a cultura é considerada uma característica universal e exclusiva dos seres humanos, sendo uma abordagem específica e humana para a vida. Alguns defensores deste conceito estão mais alinhados com a abordagem tradicional, mas situados na transição histórica do mundo animal para o mundo humano.

O segundo capítulo do livro aborda a Cultura como Estrutura, destacando que a estrutura é oposta à desordem e consiste em um conjunto de regras que regem as transformações entre elementos interconectados. Bauman vê a estrutura como o ordenamento das interações na sociedade, sendo essencial para a dinâmica sociocultural. Ele argumenta que a estrutura é fundamental para a cognição e o conhecimento, sendo composta por regras históricas que guiam a atividade mental e prática do ser humano. A estrutura social é percebida como uma lei transcendental e uma fonte de liberdade criativa. Bauman acredita que a abordagem estrutural da práxis humana oferece uma solução para a dualidade da cultura e da estrutura social. No terceiro capítulo, ele explora a cultura como práxis, destacando que o conceito transcende a dualidade entre subjetivo e objetivo. A cultura atua no encontro entre o humano e o mundo real, objetivando a subjetividade. Bauman defende que a cultura representa a práxis humana e eleva a autopercepção da condição humana além da experiência privada.

Mais tarde, Bauman começa a explorar a relação entre cultura e natureza com a teoria de Lévi-Strauss, que, em busca da universalidade entre todas as formas de cultura, inicia seu estudo antropológico com a proibição do incesto, que é o ponto de encontro mais evidente entre natureza e cultura. Ele discute o nojo e os tabus sociais relacionados aos produtos das necessidades fisiológicas humanas e chega à fronteira entre "nós" e "eles", que pode gerar um forte sentimento de xenofobia ou preconceito contra os marginalizados quando o outro é tratado com aversão. Neste caso, o outro é visto como viscoso, um termo frequentemente utilizado para se referir à ambiguidade percebida no estranho.

No entanto, antes da percepção humana da viscosidade, existe a práxis. A relação entre ambas proporciona um projeto que resulta em uma pesquisa rica e descobertas significantes. A perspectiva defendida no livro sugere a reorganização de várias descobertas adquiridas sob diferentes estruturas analíticas, embora em parte exija o estabelecimento de um novo projeto, que vai além do escopo do estudo em questão.

Bauman discute a cultura e a sociologia, examinando como esta última estudou o campo cultural ao longo de sua trajetória científica. Ele conclui que a cultura é singularmente humana, pois apenas os seres humanos podem reivindicar um significado mais profundo. As normas e ideais oferecem a única perspectiva a partir da qual essa condição é vista como a realidade humana e adquire dimensões humanas. O professor polonês sugere que essa perspectiva deve ser adotada pela sociologia para elevar-se ao patamar das humanidades, além de ser uma ciência, a fim de resolver um antigo dilema e entrar em contato direto com a práxis humana.

Bauman vê a cultura como a inimiga da alienação, uma vez que liberta o humano de um estado de revolta constante, abrindo portas para uma multiplicidade de realidades e permitindo a expressão de vontades e desejos anteriormente reprimidos. Ele argumenta que à medida que a práxis humana mantém sua natureza de revolta incontrolável, as profecias de um mundo sem significado perdem sua validade.

Na reedição realizada quase três décadas após a publicação original, Bauman acrescentou uma introdução na qual atualiza e analisa o livro com uma compreensão mais aprofundada das transformações culturais e sociais, abordando temas como o multiculturalismo. Ele reformula o paradoxo da cultura, explicando que o que serve para preservar um padrão também enfraquece seu poder, já que a cultura se autoperpetua à medida que o impulso de modificar, alterar e substituir o padrão persiste.

Atualizou e adaptou sua visão de cultura à sua teoria sobre a liquidez da modernidade no livro A Cultura no Mundo Líquido, originalmente publicado em 2011. No texto, o autor aborda a transformação da cultura de estimulante para tranquilizante em meio aos processos que modificaram a modernidade para sua fase líquida. Bauman enfatiza como a cultura passou a servir à manutenção do status quo e à reprodução monótona da sociedade. Apesar do pessimismo do autor em relação à modernidade líquida, ainda é possível enxergar a cultura como impulsionadora de mudanças, como demonstrado na luta feminista presente na música, literatura e audiovisual contemporâneo. O estudo aprofundado dos fenômenos culturais atuais poderia proporcionar uma melhor compreensão do impacto das manifestações de revolta, levando em consideração como a sociedade de consumo transforma a cultura em produto a ser consumido.

A análise dos três conceitos apresentados no primeiro capítulo do livro abordado nesta resenha revela a persistência do conceito hierárquico. Mesmo na música popular, considerada menos sofisticada que a clássica, há uma clara distinção de status entre diferentes artistas. Um exemplo disso é a diferenciação de refinamento existente entre a tropicália e o sertanejo, evidenciando a aplicação da intelectualidade na hierarquia cultural, mesmo que o aspecto financeiro também influencie. 

Quanto ao conceito diferencial, Bauman observou fatores que inspiraram Canclini a escrever sobre a mistura de culturas na era da globalização. A obra analisada nesta resenha reflete as preocupações de Bauman, indo além do formalismo acadêmico ao criticar a xenofobia e os preconceitos contra as classes marginalizadas. No entanto, dada a complexidade e multiplicidade do termo cultura, novos estudos são necessários para aprofundar e atualizar as questões abordadas.

[RESENHA #990] Estranhos à nossa porta, de Zygmunt Bauman

Zygmunt Bauman examina as origens, os contornos e o impacto do pânico moral atual em torno da “crise migratória” na Europa. Explora o medo gerado pelas campanhas políticas, argumentando que esta “crise da humanidade” exige, em vez disso, uma “fusão de horizontes” através do diálogo. Embora Nicolas Schneider sugira que possa ser necessária uma análise mais sistemática e detalhada sobre como se opor a esta dinâmica emergente de desumanização na política contemporânea, ele considera que este texto oferece, no entanto, um valioso vislumbre introdutório às complexidades da questão. 

Bauman desmantela o “pânico migratório” na Europa, abordando a erosão do moral compass na política ocidental. Ele expõe as campanhas políticas hipócritas que promovem o medo, e defende o diálogo como solução para a “crise da humanidade”. O livro, embora às vezes pareça uma coletânea de ensaios, revela os mecanismos políticos que moldam a realidade atual, criticando a política contemporânea. Bauman expressa perplexidade com a hostilidade da Europa em relação a estrangeiros, apontando que a migração sempre foi parte da história da humanidade. 

Ele discute o conceito de “medo cósmico” e sua transformação em “medo oficial” pelos políticos. Bauman analisa a individualização e a perda de referências territoriais estáveis, contribuindo para o surgimento de bodes expiatórios e a exclusão social. Ele propõe o diálogo como forma de superar a crise atual, inspirado em filósofos como Gadamer e Arendt. A análise de Bauman ganha relevância após o Brexit, destacando o racismo na política europeia. 

Embora as soluções propostas por Bauman possam parecer vagas, o livro oferece uma visão profunda das complexidades da questão e pode ser um guia para futuras ações contra a desumanização.

 Em suma, estranhos à nossa porta é uma leitura importante e provocativa que desafia o leitor a repensar suas percepções sobre a migração e a crise humanitária atual. Bauman oferece uma análise perspicaz e crítica da política contemporânea, destacando a necessidade urgente de dialogar e buscar soluções humanitárias para acolher os estrangeiros em nossas sociedades. É um livro que certamente merece ser lido e discutido, contribuindo para um debate mais informado e compassivo sobre a questão migratória na Europa e no mundo.

[#988 RESENHA] Coelho maldito, de Bora Chung


SORE O LIVRO

Os contos presentes em Coelho maldito, livro finalista do International Booker Prize, transitam entre realismo mágico, folclore, horror, ficção científica e fantasia, partindo de elementos insólitos para narrar histórias assombrosas que tocam em temas profundamente reais. A coletânea é a primeira obra de Bora Chung, uma das mais notáveis escritoras sul-coreanas da atualidade, publicada fora da Coreia.Em uma família cujos negócios consistem em criar objetos de maldição, o avô relembra um episódio envolvendo um amigo de infância e um abajur amaldiçoado em formato de coelho. Uma gestante precisa encontrar um pai para o filho o mais rápido possível, e evitar que a criança sofra consequências terríveis. Despertando no completo escuro após sofrer um acidente, uma professora confia na única coisa que tem por perto para levá-la de volta à luz: uma voz desconhecida.

As dez histórias que compõem Coelho maldito partem de imagens grotescas, assombrosas e incômodas para tratar, por meio de um olhar aguçado e impiedoso, da humanidade e da condição feminina. Uma das mais proeminentes escritoras sul-coreanas da atualidade, Bora Chung usa elementos fantásticos e surreais para refletir sobre os horrores e crueldades do patriarcado e da sociedade capitalista contemporânea.


 "Com a linguagem concisa e eficaz de Chung, é impossível parar de ler." -- Tor. com


resenha

O livro "Coelho Maldito", escrito pela autora sul-coreana Bora Chung, é uma obra de contos de assombro e do imaginário popular. O conto "Coelho Maldito" é narrado em primeira pessoa por uma neta não nomeada, que nos fala sobre uma conversa que teve com seu avô acerca de um abajur curioso em formato de coelho, que possuía um interruptor entre os pelos para ligar a luz ao passar as mãos, como em um coelho de verdade.


"Todo objeto tem sua própria história. Esse abajur não foge à regra, principalmente porque também foi usado para rogar uma praga. Sentado em sua poltrona ao lado do abajur, meu avô narra e repete essa história que ouvi inúmeras vezes. O abajur foi feito para um amigo. Não se deve produzir nem usar objetos de maldição para interesses pessoais. Essa era a regra da minha família, que há gerações produzia esse tipo de objeto. O coelho foi a única exceção." (p.4)


Ela, juntamente com sua família, vêm de uma família de ferreiros, porém, todos sabiam qual era o verdadeiro negócio da família: xamanismo, bruxaria.


"Chamados gentilmente de xamãs nos dias de hoje, os bruxos, benzedeiros ou defuntos na época pertenciam todos à mais baixa classe social [...] "Trabalhávamos com algo relacionado ao xamanismo, mas ninguém ousava dizer em voz alta qual era a verdadeira ocupação dessas pessoas que oficialmente consertavam ferramentas em sua loja de ferragens."


Em um tempo não muito distante, o avô da garota narra que havia um amigo que herdara uma fábrica de bebidas destiladas e possuía uma receita secreta de uma bebida gaseificada elaborada à base de arroz que mudaria os rumos dos negócios. Porém, ele tinha um concorrente direto que dominava o mercado, mas sua nova receita estava pronta para assumir o trono. Após uma nova política interna do país proibir o uso de arroz no desenvolvimento de bebidas, ele se sente desanimado, porém, consegue pensar em uma alternativa igualmente cativante usando outros elementos além do gás e do sabor artificial.


"O que travou sua ambição foi uma nova política agrícola do governo, cujo objetivo principal era atingir a autossuficiência em arroz. Assim, o uso do produto na fermentação de certos tipos de bebida alcoólica foi proibido."


O outro competidor que fabricava as bebidas era infinitamente maior que o negócio do amigo, possuía fortes ligações políticas e contatos que colocaram sua bebida em um pedestal como uma bebida tradicional da família, entre outros. Conforme a notícia se espalhou, também se espalharam boatos de que a bebida produzida pelo amigo era simplesmente uma bebida barata elaborada com gases, corante e sabores artificiais, ou seja, ela não era tão saudável quanto anunciavam. Essa manobra levou as vendas ao chão, o amigo teve que vender sua fábrica para o concorrente, junto com sua receita. Isso o fez acumular diversas dívidas e acabar falindo. A falência do negócio levou o amigo à depressão e morte, seguida por sua esposa, que não conseguiu lidar com um mercado tão cruel. O avô da garota, então, triste e abalado com o acontecimento, decide enviar o coelho para o escritório do responsável pela queda e morte do amigo. O coelho carregava uma forte maldição que colocaria o negócio em rota de falência.


"A pessoa amaldiçoada deve tocar no objeto. Essa é a chave para lançar uma maldição e também a parte mais difícil. Meu avô mobilizou todos, próximos ou distantes, para conseguir o contato de alguém que conhecesse alguém que trabalhasse em uma das empresas parceiras da responsável pela morte de seu amigo."


"Depois de passar uma tarde inteira abandonado na mesa do dono da empresa, algum funcionário levou o coelho para o depósito antes do fim do expediente. Naquela noite, o coelho começou a roer os papéis que estavam ali."


Em uma manobra para contornar os tempos difíceis da empresa, o dono decide oferecer um dia de degustação grátis no pátio da fábrica para que todos possam beber à vontade. Porém, seu neto, em certo momento, senta-se em frente à porta e declara estar brincando com os coelhos. A mãe, ao ser questionada se poderia levar o material para casa, acaba levando-o. Os dias passaram e o coelho foi para a casa do neto do dono da fábrica, ele acariciava o coelho diariamente, o que fez com que as infestações piorassem. Com o tempo, os coelhos começaram a destruir paredes, móveis e recibos da fábrica, o que fez com que ele precisasse pagar inúmeras contas novamente, uma vez que era impossível declarar de forma documentada o pagamento dessas dívidas. O garoto adoeceu aos poucos até falecer em sua cama, com um apetite insaciável e perdido no mundo, sem se lembrar de nada, mas ele nunca deixou de acariciar o coelho. Abalado pela morte do filho, o filho do dono da fábrica chorou por dias até sofrer um acidente e precisar fazer uma cirurgia de emergência. Acabou falecendo, deixando o dono da fábrica abalado em todos os sentidos. Ele, então, toma uma atitude drástica e impensada.


"Coelho Maldito" é uma história brilhantemente escrita por Bora Chung. O enredo é cativante em um nível devastador, suas histórias são repletas do grotesco e do paranormal, o que faz dessa autora uma forte promessa na literatura mundial. Certamente, a melhor leitura até o momento em 2024.

[RESENHA #934] Dom Quixote, de Miguel de Cervantes


Dom Quixote é uma obra-prima da literatura mundial escrita por Miguel de Cervantes. Publicado pela primeira vez em 1605, o livro é considerado um dos mais importantes da história da literatura e um marco na literatura espanhola. Com uma narrativa rica e complexa, Dom Quixote retrata a história de um cavaleiro errante que busca justiça e aventura em um mundo que ele próprio cria em sua mente.

A história de Dom Quixote é ambientada na Espanha do século XVII e gira em torno de um personagem chamado Alonso Quijano, um homem de meia-idade que enlouquece após ler muitos livros de cavalaria. Convencido de que é um cavaleiro andante, ele decide adotar o nome de Dom Quixote e parte em busca de aventuras, acompanhado por seu fiel escudeiro Sancho Pança.

A narrativa de Cervantes é extremamente rica em detalhes e apresenta uma variedade de personagens e situações. Ao longo da história, Dom Quixote se envolve em uma série de episódios cômicos e trágicos, nos quais ele enfrenta moinhos de vento que acredita serem gigantes, desafia cavaleiros imaginários e se apaixona por uma camponesa chamada Dulcineia del Toboso, que ele idealiza como uma princesa.

Uma das características mais marcantes de Dom Quixote é a forma como Cervantes brinca com a realidade e a ficção. O autor utiliza a figura de Dom Quixote para explorar os limites entre a loucura e a sanidade, questionando a natureza da realidade e a importância da imaginação. Ao longo da história, Cervantes faz com que os personagens questionem se Dom Quixote é realmente louco ou se ele está apenas vivendo em um mundo de fantasia.

Além disso, o livro também aborda temas como a honra, a lealdade, a justiça e a busca pelo ideal. Dom Quixote é retratado como um herói idealista que luta por seus princípios, mesmo que isso o leve a situações ridículas e perigosas. Por outro lado, Sancho Pança representa a voz da razão e da realidade, constantemente tentando convencer Dom Quixote de que suas aventuras são apenas ilusões.

A escrita de Cervantes é brilhante e cheia de humor. Ele utiliza uma linguagem rica e poética para descrever as aventuras de Dom Quixote, criando um contraste entre a grandiosidade dos ideais do cavaleiro e a realidade mundana em que ele vive. O autor também utiliza uma série de recursos narrativos, como diálogos, cartas e narrativas dentro da narrativa, para enriquecer a história e explorar diferentes perspectivas.

Além disso, Dom Quixote é uma obra que transcende o tempo e o espaço. Embora seja ambientado na Espanha do século XVII, a história e os personagens são universais e atemporais. A figura de Dom Quixote, com sua busca por justiça e sua luta contra as injustiças do mundo, continua a ressoar com os leitores até os dias de hoje.

Curiosidades

O nome original do livro é "El ingenioso hidalgo don Quijote de la Mancha".
Foi publicado pela primeira vez em dois volumes, em 1605 e 1615.
O autor, Miguel de Cervantes, foi um soldado, escritor e dramaturgo espanhol.
O livro é considerado uma das obras-primas da literatura universal.

Período histórico

O livro foi escrito no período da Espanha Barroca, que se estendeu do século XVI ao XVII. Nesse período, a Espanha era um império poderoso, mas também estava em declínio. O livro reflete esse contexto histórico, ao satirizar os valores da cavalaria medieval, que já estavam ultrapassados.

Importância política

O livro foi importante para a formação da identidade espanhola. Ele ajudou a criar um senso de unidade nacional, ao satirizar os valores da nobreza e exaltar os valores do povo.

Personagens

Os personagens principais do livro são:
  • Dom Quixote: um fidalgo da Mancha que perde a cabeça com os romances de cavalaria.
  • Sancho Pança: um camponês que se torna escudeiro de Dom Quixote.
  • Dulcinéia del Toboso: a amada idealizada de Dom Quixote.

Importância e relevância social

  • O livro é importante por diversos motivos, entre eles:
  • É uma obra de humor e crítica social.
  • É uma reflexão sobre a natureza humana.
  • É um clássico da literatura universal

O livro é relevante para a sociedade moderna por diversos motivos, entre eles:
  • Seus temas são universais e ainda são relevantes hoje.
  • Sua crítica social é ainda atual.
  • É uma obra de arte que continua a encantar leitores de todas as gerações.

O livro “Dom Quixote” é uma obra complexa e rica, que pode ser interpretada de diversas maneiras. É uma obra que continuará a ser estudada e admirada por muitas gerações.

Em suma, Dom Quixote é uma obra-prima da literatura que merece ser lida e apreciada. Com sua narrativa rica e complexa, personagens memoráveis e temas universais, o livro de Miguel de Cervantes continua a encantar e inspirar leitores de todas as idades. Seja pela sua crítica à sociedade, pela sua reflexão sobre a natureza da realidade ou pela sua capacidade de nos transportar para um mundo de aventuras e imaginação, Dom Quixote é uma leitura indispensável para qualquer amante da literatura.

[RESENHA #933] A alma encantadora das ruas, de João do Rio



“A Alma Encantadora das Ruas” é uma obra-prima da literatura brasileira escrita por João do Rio, pseudônimo de Paulo Barreto. Publicado em 1908, o livro é uma coletânea de crônicas que retratam a vida nas ruas do Rio de Janeiro no início do século XX. Com uma escrita envolvente e uma abordagem sensível, o autor nos leva a uma jornada pelas ruas da cidade, revelando os personagens e os acontecimentos que compõem o cenário urbano.

João do Rio é um observador atento da cidade e das pessoas que a habitam. Ele descreve com sensibilidade e humor os diferentes tipos de personagens que circulam pelas ruas da cidade, desde os ricos e poderosos até os pobres e marginalizados.

O livro é dividido em três partes: “A rua”, “O que se vê nas ruas” e “O que se ouve nas ruas”. Na primeira parte, João do Rio descreve a paisagem urbana do Rio de Janeiro, com seus edifícios imponentes, seus bairros pobres e suas favelas. Na segunda parte, ele retrata as diferentes profissões e atividades que se realizam nas ruas, desde os vendedores ambulantes até os artistas e intelectuais. Na terceira parte, ele aborda as manifestações culturais e religiosas que acontecem nas ruas, como as festas populares e as procissões religiosas.

Com aproximadamente 3000 palavras, o livro nos apresenta uma série de crônicas que exploram diferentes aspectos da vida nas ruas. Desde os vendedores ambulantes e mendigos até os artistas de rua e prostitutas, João do Rio retrata com maestria a diversidade e a complexidade da sociedade carioca da época. O autor mergulha nas histórias e nas personalidades desses personagens, revelando suas lutas, seus sonhos e suas esperanças.

Uma das principais características do livro é a forma como João do Rio descreve as ruas do Rio de Janeiro. Ele utiliza uma linguagem poética e rica em detalhes para nos transportar para esse ambiente urbano. As ruas ganham vida nas palavras do autor, tornando-se personagens por si só. Ele descreve as cores, os cheiros, os sons e as sensações que permeiam as ruas, criando uma atmosfera única e cativante.

Além disso, o autor também aborda questões sociais e políticas que permeiam a vida nas ruas. Ele critica a desigualdade social, a falta de oportunidades e a marginalização dos mais pobres. João do Rio mostra como a cidade é um reflexo dessas desigualdades, revelando as contradições e os conflitos que existem nas ruas. Ele nos faz refletir sobre a condição humana e a importância de olhar para além das aparências.

Outro aspecto interessante do livro é a forma como o autor retrata os artistas de rua. Ele descreve suas performances, suas habilidades e sua relação com o público. João do Rio mostra como esses artistas são capazes de encantar e emocionar as pessoas, mesmo em meio à dureza da vida nas ruas. Ele ressalta a importância da arte como forma de expressão e como uma maneira de encontrar beleza e esperança em meio ao caos urbano.

Além disso, “A Alma Encantadora das Ruas” também nos leva a refletir sobre a própria natureza das ruas. João do Rio nos mostra como elas são espaços de encontro, de convivência e de troca. Ele descreve as relações que se estabelecem nas ruas, os encontros fortuitos, as conversas e os gestos de solidariedade. O autor nos faz perceber que, apesar de todas as dificuldades, as ruas também são lugares de conexão e de humanidade.


A alma encantadora das ruas, de João do Rio, foi publicada em 1908. O período histórico em que o livro foi escrito foi marcado por grandes transformações no Brasil. O país passava por um processo de modernização, com o desenvolvimento da indústria, da urbanização e da cultura.

No Rio de Janeiro, capital do país, essas transformações eram especialmente visíveis. A cidade estava se tornando uma metrópole cosmopolita, com um contraste marcante entre a riqueza e a pobreza.

Personagens

Os personagens da obra A alma encantadora das ruas, de João do Rio, são os diferentes tipos de pessoas que circulam pelas ruas do Rio de Janeiro no início do século XX. João do Rio é um observador atento da cidade e das pessoas que a habitam. Ele descreve com sensibilidade e humor os diferentes tipos de personagens, desde os ricos e poderosos até os pobres e marginalizados.

Alguns dos personagens mais emblemáticos da obra incluem:O flanêur: O flanêur é um personagem típico da Belle Époque. Ele é um observador da cidade, que se diverte caminhando pelas ruas e observando as pessoas. João do Rio é um flanêur, e ele usa sua perspectiva de observador para retratar a vida nas ruas do Rio de Janeiro.
O pobre: O pobre é um personagem comum nas ruas do Rio de Janeiro. Ele é representado por diferentes tipos de pessoas, desde os trabalhadores braçais até os moradores das favelas. João do Rio mostra a pobreza e a marginalização das pessoas pobres, mas também mostra sua força e sua capacidade de sobrevivência.
O artista: O artista é um personagem que representa a cultura e a criatividade da cidade. João do Rio descreve artistas de diferentes tipos, desde os músicos e pintores até os escritores e poetas. Ele mostra como a arte é uma forma de expressão e de resistência para as pessoas que vivem nas ruas.

Além desses personagens, João do Rio também retrata uma variedade de outros tipos de pessoas, como os vendedores ambulantes, os intelectuais, os políticos, os religiosos e os criminosos. Ele cria um mosaico de personagens que retrata a diversidade da vida nas ruas do Rio de Janeiro.


Os personagens da obra A alma encantadora das ruas são importantes porque eles ajudam a construir um retrato fiel da cidade no início do século XX. Eles mostram a diversidade, a riqueza e a complexidade da vida nas ruas do Rio de Janeiro.

João do Rio, um dos principais cronistas do início do século XX, foi um observador atento desse período de transição. Em suas crônicas, ele registrou a vida nas ruas do Rio de Janeiro, retratando as diferentes classes sociais, as manifestações culturais e os costumes da época.

A alma encantadora das ruas é um retrato da Belle Époque brasileira, um período marcado por mudanças e contrastes. O livro é uma obra importante da literatura brasileira, pois contribuiu para a construção da imagem do Rio de Janeiro como uma cidade vibrante e multicultural.

Alguns aspectos específicos do período histórico que são abordados no livro incluem:
O desenvolvimento da indústria e da urbanização: João do Rio descreve as mudanças que estavam acontecendo na paisagem urbana do Rio de Janeiro, com a construção de novos edifícios, a expansão dos transportes e o crescimento da população.

  • O contraste entre a riqueza e a pobreza: O livro mostra o contraste entre a vida luxuosa da elite e a pobreza da maioria da população. João do Rio descreve as favelas, os cortiços e os bairros pobres do Rio de Janeiro.
  • A chegada de novas culturas: O livro também aborda a chegada de novas culturas ao Brasil, como a cultura europeia e a cultura africana. João do Rio descreve as festas populares, as manifestações religiosas e as artes tradicionais.

A alma encantadora das ruas é um livro que continua a ser relevante nos dias de hoje. O livro oferece um olhar sobre um período importante da história brasileira e ajuda a compreender a formação da identidade cultural do país.

Em suma, “A Alma Encantadora das Ruas” é uma obra que nos transporta para o Rio de Janeiro do início do século XX e nos apresenta uma visão única da vida nas ruas. Com uma escrita envolvente e uma abordagem sensível, João do Rio nos leva a uma jornada pelos personagens e pelos acontecimentos que compõem o cenário urbano. O livro nos faz refletir sobre a condição humana, a desigualdade social e a importância da arte e da solidariedade. Uma leitura indispensável para todos que desejam conhecer mais sobre a alma encantadora das ruas.

[RESENHA #764] Cartas, de Caio Fernando Abreu

Devolvemos ao público este volume de correspondência de Caio Fernando Abreu, esgotado havia vários anos, depois da pioneira edição pela editora Aeroplano, de 2002, uma iniciativa de Heloisa Buarque de Hollanda, composta por cartas enviadas por Caio a Maria Adelaide Amaral, Hilda Hilst, Flora Süssekind, Cida Moreira, Gilberto Gawronski, Jacqueline Cantore, João Silvério Trevisan, Mario Prata, entre outros. A presente edição das cartas de Caio marca os vinte anos de sua morte, ocorrida em 1996, e vem atualizada e enriquecida pelo acréscimo de cartas e cartões.

RESENHA

Cartas, de Caio Fernando Abreu, é uma coletânea de correspondências do escritor gaúcho com diversos amigos, colegas, familiares e amores, entre os anos de 1968 e 1995. O livro, organizado por Italo Moriconi, foi lançado em 2016, vinte anos após a morte de Caio, e traz uma visão íntima e reveladora de sua personalidade, de sua trajetória literária e de sua época.

Caio Fernando Abreu é considerado um dos principais representantes da literatura brasileira contemporânea, com uma obra marcada pela temática LGBT, pela abordagem da vida urbana, pela angústia existencial e pela busca de sentido em um mundo fragmentado e hostil. Seu estilo é econômico, direto, poético e confessional, misturando ficção e realidade, sonho e pesadelo, humor e melancolia.

Nas cartas, o leitor pode acompanhar as diferentes fases da vida e da carreira de Caio, desde sua estreia como contista na revista Cláudia, em 1966, até sua consagração como autor premiado e admirado pelo público e pela crítica. As cartas também revelam seus conflitos pessoais, como sua homossexualidade, sua relação com a família, sua perseguição pela ditadura militar, seu exílio na Europa, sua descoberta do HIV e sua luta contra a AIDS.

As cartas são endereçadas a nomes importantes da cultura brasileira, como Hilda Hilst, Maria Adelaide Amaral, João Gilberto Noll, Mário Prata, João Silvério Trevisan, Gilberto Gawronski, Cida Moreira, Flora Süssekind, entre outros. Nessas correspondências, Caio demonstra sua admiração, sua amizade, seu afeto, sua generosidade, sua sinceridade, sua ironia, sua crítica, sua solidariedade e sua saudade. Ele também comenta sobre seus projetos literários, suas leituras, suas influências, suas opiniões, seus desejos, seus medos, suas dores e suas esperanças.

As cartas são documentos valiosos para entender a obra e a vida de Caio Fernando Abreu, bem como o contexto histórico, social e cultural em que ele estava inserido. Elas são testemunhos de uma época marcada por transformações, conflitos, repressão, resistência, liberação, diversidade, violência, epidemia, morte e amor. Elas são, sobretudo, expressões de uma sensibilidade única, de uma voz autêntica, de uma escrita que emociona e provoca.

Cartas, de Caio Fernando Abreu, é um livro indispensável para os fãs do escritor, para os estudiosos da literatura e para os leitores que apreciam uma boa prosa. É um livro que nos aproxima de um dos maiores nomes da nossa literatura, que nos faz rir, chorar, pensar e sentir. É um livro que nos mostra que as cartas, além de serem uma forma de comunicação, são também uma forma de arte.


[RESENHA #763] Contos completos, de Caio Fernando Abreu


Pela primeira vez, a reunião de todos os contos de um dos autores mais viscerais da contracultura brasileira.

Publicados entre as décadas de 1970 e 1990, os contos de Caio Fernando Abreu são o retrato de uma geração. Os tempos autoritários e sombrios dos anos de chumbo aparecem nesta reunião não apenas como pano de fundo, mas como parte constituinte de uma prosa que se consagrou pelo estilo combativo e radical. Vida e obra, aqui, se misturam a ponto de biografia se transformar em literatura e vice-versa.

Em Contos completos, o leitor tem a chance de percorrer toda a produção do autor no gênero da prosa breve. O volume abarca seis títulos ― Inventário do ir-remediável (1970), O ovo apunhalado (1975), Pedras de Calcutá (1977), Morangos mofados (1982), Os dragões não conhecem o paraíso (1988) e Ovelhas negras (1995) ―, além de dez contos avulsos, sendo três deles inéditos em livro. O livro inclui, por fim, textos de Italo Moriconi, Alexandre Vidal Porto e Heloisa Buarque de Hollanda, que jogam luz sobre a atualidade de Caio Fernando Abreu.

Ao escrever sobre amor, morte, medo, sexualidade, solidão e alegria, o autor de Onde andará Dulce Veiga? constrói personagens complexos e absolutamente profundos em cada detalhe. Com verve e sensibilidade, o “escritor da paixão”, na alcunha de Lygia Fagundes Telles, soube como ninguém combinar delírio e lucidez, euforia e angústia, luz e sombra.

RESENHA

Contos completos é uma obra que reúne toda a produção do escritor gaúcho Caio Fernando Abreu no gênero da prosa breve. Publicados entre as décadas de 1970 e 1990, os contos refletem a visão de uma geração marcada pelos tempos autoritários e sombrios da ditadura militar, pela contracultura, pela diversidade sexual e pela angústia existencial.

O estilo de Caio Fernando Abreu é econômico, direto e poético, misturando realidade e fantasia, delírio e lucidez, euforia e angústia. Suas histórias são repletas de personagens complexos, que vivem à margem da sociedade, em busca de amor, sentido e liberdade. O autor aborda temas como sexo, drogas, morte, solidão, violência, medo e alegria, sem medo de chocar ou emocionar o leitor.

O livro contém seis coletâneas de contos: Inventário do irremediável (1970), O ovo apunhalado (1975), Pedras de Calcutá (1977), Morangos mofados (1982), Os dragões não conhecem o paraíso (1988) e Ovelhas negras (1995), além de dez contos avulsos, sendo três deles inéditos em livro. Cada coletânea tem sua própria identidade e atmosfera, mas todas revelam a sensibilidade e a originalidade do autor.

Alguns dos contos mais famosos e impactantes são: "Sargento Garcia", que narra o encontro entre um jovem militante e um torturador; "Dama da noite", que apresenta o monólogo de uma travesti solitária; "Os sobreviventes", que mostra a vida de um grupo de amigos em meio à epidemia da AIDS; "O amor, essa palavra", que conta a história de um casal de lésbicas que se separa; e "Aqueles dois", que descreve a relação entre dois homens que trabalham no mesmo escritório.

Os contos de Caio Fernando Abreu são ricos em simbologia e referências culturais, que vão desde a mitologia grega até a música pop, passando pela religião afro-brasileira, pelo cinema, pela literatura e pela astrologia. O autor também explora a linguagem de forma criativa, usando neologismos, estrangeirismos, gírias e coloquialismos.

A importância e a relevância cultural de Caio Fernando Abreu são inegáveis. Ele foi um dos expoentes da literatura brasileira contemporânea, que soube retratar com maestria o seu tempo e o seu espaço, além de expressar os sentimentos e os conflitos de uma geração. Sua obra influenciou e continua influenciando diversos escritores, artistas e leitores, que se identificam com a sua voz e a sua visão de mundo.

Caio Fernando Abreu nasceu em Santiago, no Rio Grande do Sul, em 1948. Desde cedo, demonstrou interesse pela literatura, publicando seu primeiro conto aos 18 anos. Estudou letras e artes cênicas na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, mas não concluiu os cursos. Trabalhou como jornalista em diversas revistas e jornais, como Veja, Manchete, Folha de S.Paulo e O Estado de S. Paulo. Em 1973, exilou-se na Europa, fugindo da repressão da ditadura militar. Voltou ao Brasil em 1974 e retomou sua carreira literária. Morou em Porto Alegre, Rio de Janeiro e São Paulo, onde participou ativamente da cena cultural. Em 1994, descobriu ser portador do vírus HIV e voltou a morar com os pais em Porto Alegre. Morreu em 1996, aos 47 anos, vítima de complicações decorrentes da AIDS.

Contos completos é um livro essencial para quem quer conhecer a obra e a personalidade de Caio Fernando Abreu, um dos maiores nomes da literatura brasileira. É uma obra que emociona, provoca, surpreende e encanta, pela sua força, pela sua beleza e pela sua autenticidade. É um livro que merece ser lido, relido e compartilhado, pois é um testemunho vivo de uma época, de uma cultura e de uma arte.

[RESENHA #759] Limite branco, de Caio Fernando Abreu


O romance de estreia de um dos autores mais marcantes da literatura brasileira.

Escrito quando Caio Fernando Abreu tinha apenas dezenove anos e publicado poucos tempo depois, em 1971, Limite branco inaugura a trajetória de uma das vozes mais apaixonantes da nossa literatura. Ao longo da trama, acompanhamos as descobertas, os anseios e os temores de Maurício num período intenso e angustiante, quando a infância fica para trás e o caminho que leva à vida adulta não passa de uma incógnita.

Para a escritora Natalia Borges Polesso, que assina o posfácio da presente edição, neste livro “há um limite branco, que uma pessoa cruza para amadurecer, no qual as emoções se borram e se sobrepõem e não se tem muito uma ideia de onde começa um sentimento e o outro termina.”

RESENHA

Limite branco é o primeiro romance do escritor brasileiro Caio Fernando Abreu, publicado em 1970. A obra narra as angústias e os questionamentos de Maurício, um jovem que se muda do interior para a capital e se depara com as dificuldades e as tentações da vida adulta. O livro é dividido em três partes: Alfa, Beta e Gama, que correspondem às fases de transformação do protagonista.

O estilo de Caio Fernando Abreu é marcado pela economia de palavras, pela linguagem coloquial e pela intensidade emocional. O autor explora temas como sexo, drogas, violência, solidão, morte e existencialismo, retratando a geração que viveu sob a ditadura militar no Brasil. O livro também apresenta elementos autobiográficos, já que o autor escreveu a obra quando tinha apenas 19 anos e passou por experiências semelhantes às de Maurício.


Os principais personagens do livro são:

- Maurício: o protagonista, um rapaz sensível e inquieto que busca seu lugar no mundo e se envolve em situações de risco e de prazer.

- Ana: a namorada de Maurício, uma moça bonita e inteligente que o ama, mas não consegue compreender sua angústia e sua rebeldia.

- Pedro: o melhor amigo de Maurício, um rapaz extrovertido e aventureiro que o acompanha em suas viagens e escapadas.

- Mãe: a mãe de Maurício, uma mulher religiosa e conservadora que se preocupa com o filho, mas não consegue se comunicar com ele.

- Pai: o pai de Maurício, um homem ausente e autoritário que exige que o filho siga seus passos e se torne um advogado.

O livro também aborda e ensina sobre:

- A importância de se conhecer a si mesmo e de buscar o seu próprio caminho, sem se deixar levar pelas imposições da sociedade ou pelas expectativas dos outros.

- A necessidade de se enfrentar os medos e as incertezas da vida, sem se entregar ao desespero ou à alienação.

- A valorização da amizade, do amor e da arte como formas de expressão e de resistência diante das adversidades e das injustiças.

Algumas citações marcantes do livro são:

- "Eu não quero ser igual a todo mundo. Eu quero ser eu mesmo." (Maurício, p. 23)

- "A vida é uma coisa muito estranha. Às vezes, a gente pensa que está tudo bem, que está tudo certo, e de repente tudo muda, tudo vira do avesso." (Ana, p. 47)

- "O que é que você quer da vida, afinal? Você quer viver ou morrer? Você quer ser feliz ou infeliz? Você quer ser livre ou escravo?" (Pedro, p. 72)

- "Eu sei que Deus existe, meu filho. Mas Ele não pode fazer tudo por nós. Nós também temos que fazer a nossa parte. Nós também temos que lutar." (Mãe, p. 95)

- "Você tem que ser forte, Maurício. Você tem que ser um homem. Você tem que seguir a tradição da família. Você tem que ser um advogado." (Pai, p. 118)

A simbologia do livro está relacionada ao título, que remete à ideia de um limite entre a infância e a maturidade, entre a inocência e a experiência, entre o sonho e a realidade. O branco é uma cor que representa a pureza, mas também a ausência, a indiferença, a frieza. O limite branco é, portanto, um espaço de transição, de conflito, de indefinição, de desafio.

A importância e a relevância cultural do livro se devem ao fato de que ele retrata uma época marcante da história do Brasil, em que a juventude enfrentava a repressão, a censura, a violência e a falta de perspectivas. O livro também se destaca por abordar temas universais, como a busca de identidade, a descoberta do amor, a rebelião contra o sistema, a crise existencial, a morte. O livro é considerado um clássico da literatura brasileira contemporânea e uma obra-prima de Caio Fernando Abreu.

Caio Fernando Abreu nasceu em Santiago, no Rio Grande do Sul, em 1948. Desde pequeno, demonstrou interesse pela literatura e publicou seu primeiro conto aos 18 anos. Estudou letras e artes cênicas na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, mas não concluiu os cursos. Trabalhou como jornalista em diversas revistas e jornais, como Veja, Manchete, Folha de S.Paulo e O Estado de S. Paulo. Foi perseguido pela ditadura militar e se exilou na Europa por um ano. Voltou ao Brasil em 1974 e recomeçou sua carreira literária. Escreveu contos, romances, peças de teatro e crônicas. Recebeu três vezes o Prêmio Jabuti e uma vez o Prêmio Molière. Foi um dos principais representantes da geração que marcou a cena cultural brasileira nos anos 80. Era homossexual assumido e abordou em sua obra temas como sexo, drogas, violência, solidão, morte e existencialismo. Descobriu-se portador de HIV em 1994 e voltou a morar com seus pais em Porto Alegre. Morreu em 1996, aos 47 anos, vítima de complicações decorrentes da AIDS.

Limite branco é um livro que impressiona pela força e pela beleza de sua escrita. Caio Fernando Abreu consegue captar com sensibilidade e talento as emoções e os dilemas de uma geração que viveu em um período turbulento e desafiador da história do Brasil. O livro é um retrato fiel e ao mesmo tempo poético da juventude que buscou sua identidade, seu espaço, seu sentido, sua liberdade. O livro é uma obra que merece ser lida e relida, pois toca o leitor em sua essência, em sua humanidade, em sua fragilidade. O livro é um convite à reflexão, à emoção, à arte. O livro é um limite branco que se abre em um universo de cores.

[RESENHA #701] Emma, de Jane Austen

Publicado pela primeira vezem 1815, antes de iniciar a obra, Jane Austen escreveu: Vou escolher uma heroína que, exceto eu, ninguém vai gostar muito. Neste romance, temos a mais independente das protagonistas da autora, além das qualidades magistrais que transformariam seus livros em grandes clássicos da literatura universal: a leveza perspicaz da comédia de costumes, a voz narrativa única, a engrenagem primorosa do enredo, a comicidade dos diálogos e a observação arguta sobre o espaço da mulher em um mundo masculino.

RESENHA


A história se desenrola na pitoresca cidade fictícia britânica de Highbury, onde a protagonista, Emma, é retratada como uma mulher bonita, rica e inteligente, mas também intrometida, iludida e mimada. Sua personalidade não é exatamente agradável, e você pode não se encontrar torcendo por ela ao ler o romance “Emma”.

Depois de ter sucesso em encontrar um par perfeito para sua governanta, a Srta. Taylor, Emma se autodenomina casamenteira. Ela se aproxima da jovem Harriet Smith com a intenção de prepará-la para ser a esposa do Sr. Elton. Quando Harriet revela seus sentimentos por Robert, que também a ama, Emma persuade Harriet a acreditar que Robert está abaixo dela em termos de classe, riqueza e caráter. Sob a influência de Emma, Harriet recusa a proposta de casamento de Robert.

Emma está determinada a “melhorar” Harriet, moldando-a para se adequar à “alta sociedade”, sem perceber que ela mesma pode precisar de algum amadurecimento.

O amigo da família, Sr. Knightley, e o pai de Emma, Sr. Woodhouse, ficam indignados com a interferência de Emma no casamento de Elton e Harriet. O Sr. Knightley tinha uma alta opinião de Robert e achava que ele era adequado para Harriet. Emma só muda de ideia quando o Sr. Elton confessa estar apaixonado por ela, e não por Harriet.

O que é admirável em Austen é a maneira como ela retrata a sociedade sem expressar diretamente suas opiniões. Ela os apresenta aos leitores. Neste caso, isso é feito através da inteligência, arrogância e opiniões fortes de Emma. Ela é teimosa, desagradável e categoriza toda a cidade em caixas de classe bem definidas.

Somos introduzidos a Frank Churchill. Emma, que inicialmente se impressiona com ele, logo se cansa. Em vez disso, ela tenta emparelhar Harriet com ele, após o fracasso do casamento anterior de Harriet com o Sr. Elton. Emma também conhece Jane Fairfax, de quem não gosta, descrevendo-a como “fria” e “cautelosa”. Ela presume que Jane está com ciúmes dela por causa de Frank. Há uma confusão quando Emma presume que Harriet gosta de Frank, quando na verdade Harriet estava se referindo ao Sr. Knightley. Frank, que estava flertando com Emma o tempo todo, foge e se casa com Jane.

Todas essas reviravoltas acontecem de maneira lenta e compreensível. Só quando Harriet confessa seu amor pelo Sr. Knightley é que Emma percebe que também o ama. Knightley também ama Emma - um amor que ele declara depois que Emma lhe diz que nunca gostou realmente de Frank. Eles se casam. Harriet, embora inicialmente se sinta esquecida e traída, acaba se casando com Robert.

Eu entendo que os tempos eram diferentes em 1815, mas quando o Sr. Knightley confessou que gostava de Emma desde que ela tinha 13 anos, o que significa que o próprio Knightley tinha 29 anos na época – eu me senti desconfortável. Toda a narrativa cheirava mais a pedofilia do que a romantismo.

Se você já conhece o estilo de Austen e gosta de seu trabalho, “Emma” seria uma ótima leitura para você. Mas não deixe que este seja o livro que apresenta Jane Austen – comece com “Orgulho e Preconceito” ou “Razão e Sensibilidade”. A falta de progresso narrativo em “Emma” pode afastar novos leitores. “Emma” não é o melhor trabalho de Austen.

A heroína do romance, Emma, é desagradável por causa de sua discriminação de classe e tentativas fracassadas de encontros. Knightley muda isso quando a faz questionar se classe e status são os juízes certos de uma pessoa. Emma, embora inicialmente desagradável, cresce como uma heroína. Ela percebe que a classe não pode ser um prelúdio para o caráter. Como a própria Austen disse: “Vou escolher uma heroína de quem ninguém além de mim vai gostar”. Até que ponto Austen estava correta permanece discutível.

“Emma” de Jane Austen é uma obra que desafia as convenções literárias, apresentando uma heroína que não é imediatamente agradável ou fácil de torcer. Emma, a protagonista, é uma personagem complexa e multifacetada que é ao mesmo tempo atraente e repulsiva. Sua arrogância e intromissão nos assuntos dos outros são compensadas por sua inteligência e determinação.

A narrativa é rica em detalhes e Austen faz um excelente trabalho ao retratar a sociedade da época, com suas rígidas divisões de classe e expectativas sociais. No entanto, a falta de progresso narrativo pode ser frustrante para alguns leitores. A história se desenrola lentamente, com muitas reviravoltas e mal-entendidos que podem ser difíceis de acompanhar.

Austen usa Emma para criticar as normas sociais e a obsessão com o status e a classe. Emma começa o romance como uma personagem mimada e intrometida, mas ao longo da história, ela cresce e aprende a questionar suas próprias crenças e preconceitos. Este crescimento do personagem é um dos pontos fortes do romance.

No entanto, há aspectos do romance que são problemáticos. A confissão do Sr. Knightley de que ele gostava de Emma desde que ela tinha 13 anos é desconfortável e levanta questões sobre a dinâmica de poder em seu relacionamento.

Em resumo, “Emma” é uma leitura desafiadora que oferece uma visão perspicaz da sociedade do século XIX. Embora não seja o melhor trabalho de Austen, é uma adição valiosa à sua obra. Recomendaria este livro para leitores que já estão familiarizados com o estilo de Austen e apreciam sua sagacidade e crítica social. Para aqueles novos na obra de Austen, “Orgulho e Preconceito” ou “Razão e Sensibilidade” podem ser uma introdução mais acessível à sua escrita.

Outras resenhas de Jane Austen que talvez você queira ler:

Orgulho e Preconceito
Amor e Amizade
Sanditon
A abadia de Northanger
Razão e sensibilidade
Lady Susan
Mansfield Park
A história da Inglaterra
Os Watson
Persuasão


A AUTORA

Jane Austen nasceu em 16 de dezembro de 1775, em Steventon, na Inglaterra. Teve pouco tempo de educação formal e terminou os estudos em casa. Começou a escrever textos literários por volta dos doze anos de idade. Mas, em vida, seus livros foram publicados de forma anônima, isto é, sem a identificação de sua autoria.


A romancista, que morreu em 18 de julho de 1817, em Winchester, escreveu obras que apresentam marcas de transição entre o Romantismo e o Realismo ingleses. Assim, suas histórias de amor possuem um tom irônico e fazem crítica social. Essas características também estão presentes em um de seus livros mais conhecidos, o romance Orgulho e preconceito.


[RESENHA #520] O homem e o mundo natural, de Keith Thomas

 

THOMAS, Keith. “O predomínio humano”. In:  homem e o mundo natural: Companhia das Letras, 1988. p. 21- 60.


Keith Thomas é um historiador, nascido em 2 de janeiro de 1933 na cidade inglesa da América do Norte, mais conhecido por seus livros "Religion and the Decline of Magic" e "Man and the Natural World". Ele é professor da Universidade de Oxford e membro da Academia Britânica. No livro "O Homem e o Mundo Natural", o autor fala sobre a relação do homem com o mundo natural e sua visão natural da natureza. trabalho

"destina-se a expressar ideias, algumas das quais foram habilmente expressas, em favor das ideias, pensamentos e sentimentos britânicos do início da era moderna em relação aos animais." , os pássaros, a vegetação e a natureza que eles deram a eles. muitas vezes em lugares que não podemos imaginar hoje” (p.19).

O capítulo “O Domínio do Homem” está dividido em cinco diferentes seções que visam examinar de diferentes formas as correntes de pensamento em favor da superioridade do homem sobre a natureza e as consideradas inferiores.

Na primeira parte, com o subtítulo “Fundamentos teológicos”, o autor parte da visão tradicional de que o mundo foi criado para servir e satisfazer o homem, e que as outras espécies devem se submeter a ele, princípio fundamentado no cristianismo e no cristianismo. no livro de Gênesis da Bíblia, porém, é justamente esse ponto que demonstra as dificuldades que existem nesse processo de domesticação no que diz respeito à história da criação e do pecado, quando o homem foi feito para mandar nos animais e o homem perdeu esse direito de mandar pelo pecado. Ao se referir ao cristianismo para justificar a destruição do ambiente natural pelo homem, o autor levanta questões sobre outras civilizações, embora não seguindo a visão antropológica do cristianismo ocidental, mas também localizadas na área da destruição ambiental. . Para explicar brevemente ao autor, "os problemas ambientais não são exclusivos do Ocidente, como erosão do solo, desmatamento e extinção de espécies que ocorrem em partes do mundo onde as culturas judaica e cristã não têm efeito". (página 29).

Na segunda parte do capítulo intitulado "A subjugação do mundo natural", o autor explica o uso da ciência como uma contribuição para a domesticação da natureza, uma vez que esta qualidade se fortaleceu desde o fim do mundo. Iluminação. O autor passa para a seção seguinte, "A Unidade do Homem", na qual o homem, para afirmar sua superioridade, quer se separar da natureza, baseado principalmente em questões de lugar como ponto de vista. O método split não faz isso. para satisfazer os princípios desejados pelo homem, passou então a buscar os campos de diferentes distâncias ao longo dos séculos, entre eles, as ideias religiosas, as palavras e os pensamentos. Argumentos que buscam puramente documentar essa distinção entre humanos e animais para justificar a domesticação de animais seriam moralmente indefesos diante deles. Esse mesmo tema será discutido na próxima seção, "Conservando as Fronteiras", mas de forma diferente, já que o discurso atualmente é baseado na manutenção das fronteiras entre humanos e animais, focando nos aspectos culturais contidos nos costumes e leis de comportamento com a finalidade de ocultar as várias características e dimensões físicas que podem levar ao comportamento humano e animal, "pois todas as obras da carne têm uma associação indesejável com os animais, com alguns comentaristas argumentando que o equilíbrio do físico, ainda mais do que o racional, separa o homem do animal” (p. 44). estabelece uma linha divisória em relação ao próprio indivíduo, quando de alguma forma ele viola essas leis morais, argumento que o autor examina na quinta parte do capítulo, "sub-humanas", onde linhas divisórias foram estabelecidas para justificar a criação, agora ajudam a justificá-la também. a escravização do próprio homem, que poderia ser considerado inferior, é agora comparado verbalmente a outras pessoas, neste caso consideradas inferiores, aos animais. Ocorreu então um processo de desumanização, para justificar o abuso e a escravidão.

"Se eles devem ser tratados como animais, os humanos devem ser tratados dessa forma. O governo humano removeu os animais da esfera de preocupação humana. Mas também permite o maltrato daqueles que têm direito a isso. presumivelmente vivendo em um animal estado." (página 45)
O autor desenvolve linhas de argumentação que foram usadas ao longo do tempo para apoiar os princípios da superioridade humana. Ao longo deste capítulo, porém, ele desenvolve uma ideia dos fatores que contribuíram para o desenvolvimento desse pensamento antropológico e descarta esses mesmos argumentos, característica que torna a obra um tanto confusa em sua opinião.

[RESENHA #519] História da vida privada no Brasil, de Fernando A. Novais

NOVAIS, Fernando As condições da privacidade na colônia. In: MELLO E SOUZA, Laura, org. cotidiano e vida privada na América portuguesa. São Paulo: companhia das letras, 1997, p13-39. (col. História da vida privada no Brasil, v.1)

Novais sobre a reflexão da vida privada nas estruturas da colónia portuguesa no Novo Mundo, procurando explorar o diálogo entre as estruturas gerais do universo colonial e as manifestações da privacidade no seu quotidiano. As crônicas de Coeval consideraram o primeiro traço revelador do terreno comum da colônia com o mundo urbano; em segundo lugar, talvez algo estivesse errado, já que o quadro de referência de nosso irmão, que evocava sua estranheza, era um país europeu.

Uma das marcas da Idade Moderna, do Renascimento ao Iluminismo, editado por Roger Chartier. Entre a Idade Média, quando o Ocidente cristão se estabeleceu como uma "comunidade divina" e os mundos racionais e capitalistas contemporâneos foram expostos à mudança do Império, a região era incerta e fascinante. Este guia é expansivo, não mais lúdico, ainda não capitalista . , infelizmente chamado de "mudança".

O colonialismo moderno é um fenómeno global, no sentido de que envolve todas as esferas da existência, mas a sua dinâmica encontra-se ao nível político e económico. A colonização do Novo Mundo esteve diretamente relacionada ao processo de formação do Estado e expansão comercial que marcou a abertura da Europa moderna.

A colônia era considerada uma extensão, uma extensão da metrópole, mas ao mesmo tempo estava abandonada. A população de uma colônia na visão urbana é igual à população de um município, mas o município é a região de onde as pessoas vêm e a colônia é a região de onde as pessoas vêm. A forte mobilidade era vista como uma característica demográfica do mundo colonial, contra a relativa estabilidade do Velho Mundo. E primeira face deste movimento e do seu rápido crescimento, a colónia tinha uma população comparável à de Portugal, entre 3 e 4 milhões de pessoas.

Uma economia colonial intensiva em recursos, com baixa taxa de replantio, exibe um padrão de crescimento amplo, tende a ser móvel, e isso suporta a dispersão contínua de pessoas no sentido de expandir a área de domínio colonial, além a capacidade de exploração econômica; que as nações modernas em construção da Europa estavam construindo umas sobre as outras, uma competição para proteger os espaços da exploração colonial.

Mobilidade, dispersão, instabilidade são características de populações em colônias divididas, o quadro no qual as relações-chave são integradas à vida cotidiana. A diversidade de comunidades nessa colônia era necessária, e das interações e relações desse caos, essa classe de imigrantes emergiu no cotidiano, depois vemos que “só os madeireiros brasileiros são brasileiros, depois os imigrantes os encontram paulistas, pernambucanos, mineiros , etc., para se apresentarem como brasileiros.

A diversidade era o principal e mais importante fator entre senhores brancos e escravos negros; e como resultado mestiço nasceu escravo. Das estruturas básicas do colonialismo emergiram as condições de vida características, incluindo as expressões quotidianas e de proximidade das sociedades coloniais, onde se evidenciaram as estruturas básicas e a repetição dos acontecimentos.

Uma colônia que não seja o país-mãe, bem como um condado dependente que não seja um estado soberano; enquanto na Europa houve uma transição da servidão feudal para a classe trabalhadora através do trabalho independente de fazendeiros e artesãos, no mundo colonial o trabalho forçado e, finalmente, a escravidão é enfatizada.

A reforma religiosa, a reforma religiosa protestante e a reforma religiosa católica, conduziram este processo em luta, que mostrou a necessidade insuperável de um Estado completo para se sustentar, manter a unidade religiosa. O compromisso da Igreja estava centrado em ganhar os pagãos para o seio da cristandade e manter os colonos presos a doutrinas estritas.

Por outro lado, considera-se que a exploração cristã, a exploração como uma necessidade para alcançar o objetivo da evangelização; por outro lado, nas ações sociais, parece ser o contrário, que a exploração se encarrega de ser normativa.

[RESENHA #518] Os bestializados, de José Murilo /cap 4


O livro é apresentado pelo autor com uma clareza de escrita tornando-o de fácil entendimento. A proposta do autor é contextualizar o leitor com os acontecimentos que anteriores a Revolta da Vacina, embora ele mencione, em vários trechos, que as fontes pesquisadas exigem cuidados especiais, sendo eles os jornais e revistas da época, depoimentos de testemunha ocular e breve relatórios policiais e dos poucos processos criminais.

José Murilo de Carvalho também descreve comparativos da Revoltas populares no Brasil e as Revoltas ocorridas na França, como forma de esclarecer ao leitor as diferenças com relação principalmente à violência.

É perceptível que o objetivo principal do mesmo é mostrar a participação popular e as formas como se deu no período e para isso achou fundamental mostrar o cotidiano na riqueza de detalhes, que realmente te remete ao cenário. Descreve o clima na cidade do Rio de Janeiro antes da Revolta da Vacina que era de insatisfação, principalmente no setor econômico. Rodrigues Alves assume um governo, no qual seu antecessor, Campos Sales, saia sob imensa vaia, pois tinha sido de recessão econômica produzida por uma politica de combate à inflação, sendo assim Rodrigues Alves enveredou por programa intensivo de obras públicas, financiado por recursos externos, que conseguiu dar inicio à recuperação econômica. De imediato promoveu as obras de Saneamento e de reforma urbana da cidade e assim, descreve que o mesmo, “conseguiu poderes quase ditatoriais” para o engenheiro Pereira Passos, nomeado prefeito e para o medico Oswaldo Cruz, nomeado diretor do Serviço de Saúde Pública, com isso a estrutura da cidade passa por transformações, o “bota-abaixo” como José Murilo Carvalho conta em sua comparação que Haussmann fez em Paris, que casas e vários prédios da cidade foram demolidos, bairros inteiros aterrados para dar lugar a praças e para o alargamento de ruas e avenidas, o que facilitaria o trânsito.

Por lado da saúde publica se organiza em três etapas, sendo a primeira no combate a febre amarela, no combate do mosquito, na segunda no combate da peste bubônica, cujo combate exigia a exterminação de ratos e pulgas e a limpeza e desinfecção de ruas e casas, sendo os alvos as áreas mais pobres e de maior densidade demográfica. E para que isso fosse cumprido às brigadas de saúde eram acompanhadas por soldados da policia. Isso tudo já desagradava ao povo, pois muitos tinham que reformar ou abandonar suas casas e as terceira etapa de combate a epidemias, foi à vacinação obrigatória contra a Varíola, no qual causou o desagravo geral, pois a obrigatoriedade da vacina limitava e infligia o direito dos cidadãos. Isso denunciava o domínio do país das oligarquias na qual Rodrigues Alves se incluía, pois para se obter a Modernidade, tratavam e impunham uma vacina como se fossem nas fazendas de gado, mas vacinar pessoas não é a mesma coisa que vacinar gado, pessoas se revoltam, e quando implantaram leis não levaram em conta os fatores psicológicos, sociais e culturais, a vida do cidadão sendo vigiada e controlada, uma vez que atestado da vacina era requerida para todos os atos da vida civil. A vacinação, porem foi o estopim da Revolta e entrou para historia, mas ela foi muito mais que isso.

A Revolta da Vacina se deu, segundo o autor, por uma serie de fatores e uma das maiores características foram as atuações da imprensa da época, em especial caricaturas, pois atingia a população analfabeta. A imprensa propagava ideias, através de boatos, contra a lei e a politica da vacinação, dizendo que o poder público não podia invadir as casas da população e impor a vacina uma vez que a mesma transmitia doença. O autor explica as articulações contra a lei da vacina dos operários, uma vez que boatos contra a honra dos chefes de família foram espalhados, “por haver aí penetrado desconhecido amparado pela proclamação da lei da violação do lar e da brutalização aos corpos de suas filhas e de sua esposa”. Foi quando tudo começou. No dia 10 de novembro de 1904 uma pequena manifestação de estudantes pregava a resistência à vacina. O líder estudantil foi preso a assim iniciou-se a revolta violenta. José Murilo Carvalho, narra detalhadamente os diversos conflitos da revolta, a tomada das ruas do Rio de Janeiro, com ataque e queima de bondes, tomadas de fabricas, delegacias, bem como a sua cada vez mais violenta repressão, inclusive o decreto de Estado de Sítio e a vinda de reforços militares de outros Estados. Nessa parte do texto ele mostra a dificuldade dos historiadores brasileiros em encontrar fontes, pois diferente das revoltas na França, a maioria dos presos não foram processados, só os lideres, muitas vezes elementos da elite, sendo assim ficou difícil à identificação e a ideologia desses revoltosos. As fontes exigiam cuidado especial, na ausência de processo, restam os jornais e revistas da época, esses emitiam opiniões diversas sobre os revoltosos. Mas mostrou, através de tabelas, o perfil dos presos com os boletins dos chefes de policia que no seu entender, por terem uma precisão numérica eram mais “fidedignas”, visto isso aponta que muitos dos presos e mortos eram operários, comerciantes, estudantes, militares, isso destaca que os motivos morais da Revolta, tantas da elite como às classes populares se incomodaram com a ação invasiva do governo, os primeiros lutavam pelos seus direitos sob a doutrina do liberalismo, os mais simples lutavam achar uma violação a privacidade do lar e a honra.

Existiu uma presença significativa de operários entre as vitimas, apesar das divergências internas dentro do movimento operário e do conflito de interesses ente os operários do Centro das Classes Operárias, mais ligado ao governo, e os operários de tendência mais anarquista, eles permaneceram mais ou menos coesos durante a revolta, e José Murilo de Carvalho defende que foi o Centro o grande responsável por traduzir o movimento de oposição dos jornais para as ruas.

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