“Quantas vezes você se perguntou qual é o sentido da vida?”. Esta é a primeira de muitas perguntas que Juliana Moura faz ao longo do seu livro Você não existe. Sua obra, em geral, pode ser sintetizada, jamais resumida, a essa questão. Tal interrogação vai se desdobrando nas páginas seguintes revelando aspectos ocultos inerentes ao universo e ao ser humano. É um livro que instiga a participação do leitor a fim de promover uma revolução de consciência através da reflexão e do autoconhecimento. Afinal, ninguém muda ninguém. É uma obra totalmente inspirada pelo universo e tem o propósito de trazer à tona a verdade de cada um desde que este esteja disposto e comprometido com seu próprio processo evolutivo. Evoluir exige consciência. Consciência exige presença. Se este livro chegou até você é porque tem algo valioso a dizer para sua alma. Afinal, nada é por acaso. Leia e descubra, por si só, o que o universo tem para te dizer.
[lançamento] A jornada do despertar, de Antonina Buriti
[lançamento] A morte também aprecia o jazz, de Edimilson de Almeida
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[lançamento] O Girassol, de Oscar Pilagallo
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[lançamentos] Sequelas, de Karla França
Karla França escreve sobre realidades que viveu ao tentar a sorte em outro país
Sequelas, da designer gráfico Karla França, reúne histórias vividas pela autora a partir da sua decisão irrevogável de tentar a sorte em outro país. O recheio do livro mistura personagens inusi- tados, amores encerrados e partidas cheias de saudade. Repleto de humor e de birra, de crise existen- cial e melancolia madura, Sequelas conduz seus personagens e seus leitores às questões pungentes de imigração, do que a vida tem de pior e, acima de tudo, de melhor.
Mas o sabor predominante da obra vai além disso: é uma história de superação e redenção, construída por uma personagem dúbia e dupla, feita de arrogância e fragilidade, em busca de si mesma. Não se trata somente de uma obra de quem fincou sua bandeira em outro país, mas compartilha-se o prazer que é traduzir as palavras em vida. Vida que esconde-se por trás das sequelas. O jogo da vida. O livro, com narrativa leve, proporciona uma leitura dinâmica e agradável, é uma leitura-viagem devoradora que nos leva a incríveis descobertas. Alimenta a alma, o corpo e a mente com as reflexões transmitidas. Prende também pelo coração, com confidências da autora sobre sua relação com a vida e tudo que ela pode trazer.
Karla França, em Sequelas, oferece uma abordagem diferente, pouco vista, provocando no leitor um outro olhar sobre o significado da vida. Indo além do simples compartilhar, produziu um livro inspirador, levando o público a uma incrível viagem pelo mundo sem sair do lugar.
SOBRE A AUTORA
Karla França é designer gráfico e escritora. Já escreveu alguns ensaios e crônicas, entre os quais, Sequelas, seu primeiro romance, que está sendo adaptado para o espanhol e francês. Nasceu em 1971 e cresceu em Belém do Pará. Aos 34 anos decidiu partir do Brasil e fixou residência na França, onde vive até hoje. Desde 2006 a autora mora em Paris com o marido e as quatro filhas.
[Lançamento] Formas feitas no escuro, de Leda Cartum
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[RESENHA #529] Tempo aberto, vários autores
Tempo aberto é uma obra de ficção comemorativa publicada pelo Grupo Editorial Record em celebração aos oitenta anos de existência do conglomerado editorial, que atualmente abarca onze selos que publicam os mais variados gêneros literários. O titulo é uma alusão ao tempo que se encontra em percurso contínuo, assim como o compromisso do Grupo e de seus editores com as publicações e o compromisso com a qualidade do material publicado ao longo dos anos.
80 anos de existência em 8 grandes contos que narram as oito décadas de vida brasileira em períodos históricos que abarcam de 1942 à 2022. As narrativas aqui distribuídas se relacionam com diferentes acontecimentos e críticas, como: o papel da mulher na sociedade, a violência das ruas, o alcance do regime militar durante o período da repressão, a redemocratização, dentre outros. Para tal, reuniu-se nesta edição oito autores inesquecíveis: Nélida Piñon; Alberto Mussa; Francisco Azevedo; Carla Madeira; Nei Lopes; Antônio Torres; Cristovão Tezza e Claudia Lage.
Vale ressaltar que as obras aqui apresentadas são carregadas de mensagens e simbolismos característicos do tempo ao qual foi-se proposto representar, de forma tal que deve-se atentar-se em se obter uma leitura além das entrelinhas, percorrendo as nuances descritivas que delineam caminhos distintos de narrativa, foco e acontecimento.
Fazem parte desta edição comemorativa os contos:
Aberto Mussa - Encruzilhada na ladeira do Timbau (1942-1952)
A violência nas cidades: Este conto mantem sua essência original dos anos 40 e fala-nos sobre uma ficção que ocorre durante a ocupação do morro da formiga. A narrativa aborda a vida de Tião Saci, um homem que decide se mudar para o morro da formiga e morar com Déo, porém, seu real interesse estava nos trabalhos espirituais e na entidade que por lá habitava na figura de um rapaz conhecido por Lacraia.
Nélida Piñon - I love my Husband (1952-1962)
O papel da mulher na sociedade: Uma história narrada em primeira pessoa por uma mulher que fala-nos acerca de seu convívio com seu marido e seus desdobramentos, suas descrições sobre o cotidiano e o tratamento que levara de seu marido e a visão da sociedade sobre o casamento são arcaicas, antigas e características do século 18, apesar da história dar todos os indícios de se tratar de algo ambientado entre o século dezenove e vinte.
Francisco Azevedo - Em 1969, um concurso literário e uma viagem de contrastes (1962-1972)
Oposição da ditadura x contracultura: A história narra o percurso de Frájara, um entusiasta da escrita que vence um concurso literário e uma viagem para terras estrangeiras durante o período da ditadura militar no Brasil, durante o processo de contracultura em que se encontravam Brasil x EUA. Chumbo e censura, uma história sobre o impacto da escrita e das experiências durante um período de retrocesso cultural.
Antônio Torres - Atrás da cerca (1972-1982)
O alcance do regime militar no sertão: Uma narrativa sobre o impacto do regime militar do sertão e a instauração da censura e a preocupação de um morador em relação à como proceder: não posso contar o que não vi, não posso falar o que não vi.
Carla Madeira - Corte seco (1982-1992)
O despertar da juventude durante o período de redemocratização: Narrado em primeira pessoa pela personagem Elizabete, a história fala-nos do processo de confiança de pais e filha durante o desespero pelo sumiço de um blazer e a quebra de confiança.
Nei Lopes - Manchete de Jornal (1992-2002)
A força da cultura popular às vésperas da revolução digital: Narrativa que começa com um possível fato curioso: um homem de nome Alvimar da Silva, recém falecido, havia sido enterrado vivo. Este foi o estopim e surgimento de uma série de manchetes investigativas regradas à boas doses de sensacionalismo.
Claudia Lage - um delírio por moira (2002-2012)
As pressões cotidianas no mundo contemporâneo: As pressões de uma garota para realização de coisas básicas com um pano de fundo fluído. Aluguel, energia, comida, água e despesas básicas e a pressão para ser o melhor a cada dia para sobrevivência.
Cristovão Tezza - O herói da sombra (2012-2022)
A história da venda de um carro antigo e problemático e os desdobramentos de um bem feitor.
A obra em si é uma construção significativa em contribuição literária, a decisão da editora em republicar estes contos traz a tona a importância do debate e da literatura como instrumento de fomento principal da educação e dos movimentos ligados à cultura. 80 anos de história do Brasil e do grupo, certamente um número significativo e único.
Indicado para todo leitor de bons contos.
[RESENHA #528] Odisseia erótica, de Bento Verboto
Bento Verboto é o pseudônimo da autora Umbra.
A odisseia é caraterizado por uma viagem marcada por eventos imprevisíveis, e na voz e definição do autor, ela é a chance que temos de nos reinventar em meio à mudança. Esta obra é um emaranhado poético que caracteriza e elucida em suas páginas sentimentos que afloram em meio ao encontro e desencontro de almas, do sexo e da falta dele, do desejo e do sentimento tudo por meio do desejo e de uma narrativa que provoca-nos diferentes sensações, pois ela nos aborda em diferentes óticas e perspectivas dos encontros e dos amantes que conquistamos ao longo da nossa vida.
Das características da obra, duas delas merecem destaque: os poemas possuem link de músicas que complementam a leitura, o que torna tudo mais pessoal e garante uma experiência única, trazendo a tona os sentimentos que, certamente, ocasionaram na escrita desta obra. Outro ponto interessante é a possibilidade de ler o livro de trás para frente, como em uma joga de vira-vira, ou seja, é possível abrir o livro por ambas as capas e realizar a leitura, uma vez que ambas contemplam uma série de poéticas.
O livro, como revelou o autor em nota, é sobre as dores insuportáveis e suportáveis sofridas por grandes amores e por ilusões amorosas, todas marcantes.
Ele
era sobre ele
a falta dele
o medo dele
A música que toca
E eu fujo
Dele
de tudo o que envolva
Ele
(p.226)
Algo interessante de se observar é que à depender da parte lida do livro (capa frente-verso) os sentimentos se diversificam, a impressão que temos é que de um lado somos apresentados à uma mistura de sentimentos em meio à paixão, já do outro, somos contemplados com a visão amadurecida do processo do amor, repleto de reflexões que trazem a tona uma série de encontros com o passado e as pazes com o presente. Uma tática magistral.
Das terras que cruzei
Em poucas já botei
O pé
E habitei de verdade
somente em mim
(p.163)
Fala-nos sobre lembranças:
Eu estive me observando nos espelhos das ruas
Nos reflexos da cidade
Agora estou escondido no seu quarto, pelos meus textos que você guardou.
Queime minhas cartas como o sol queimou minha pele
Você me machucou de qualquer maneira.
Era uma questão de tempo para que alguém se ferisse.
Me observo, mas não sei se te vejo.
sou eu mesmo?
(p.126 em incorporando afetos)
...de saudade
Ainda tenho a sensação
de sua boca mordendo o meu pescoço
e todos os jogos que você gosta
mãos em torno do meu corpo
senti que estava sozinho de novo
coloquei você num altar:
criei fantasias e fetiches de amor
(p.113 em meu corpo)
...do despertar
O amor não surge, e a gente culpa
nossos corpos de não terem química,
quando toda essa nossa biologia era só na teoria.
(p.100 em a noite na minha cabeça)
Bento Verboto é profundo em todas as suas nuances, sua escrita nos rasga de dentro para fora em distintas regiões, seus escritos penetram a carne e o íntimo do leitor, parte em direções opostas e múltiplas e nos convida à viver e vivenciar sua dor, seu gozo, suas paixões e sua evolução.
Um livro feito para quem ama poesia e reflexões profundas sobre amores e desilusões.
[RESENHA #527] Flow por grafia, de Taz Mureb
Flow por grafia não tem definição, não tem forma, é um livro livre que não se encaixa em um padrão normativo de publicação, mas se diferencia de tudo e todos em poética e sinestesia. Taz Mureb, trouxe em suas páginas um misto de tudo o que acredita e luta em vida em suas músicas. Artista do rap, a escrita da autora caracteriza-se por ser multifacetada, há aqui, ausência de forma predominante, mas mistura-se entre todas suas escritas um misto de poesias, poemas, cartas, confissões e músicas, tudo poeticamente alinhado à uma diagramação repleta de ilustrações que casam-se em passos lentos ao propósito da narrativa: mostrar quem é Taz Mureb.
Flow por grafia é uma obra que fala por si só, suas páginas, repleta de poesias e poemas de parachoque de caminhão, caminham-se e se somam com uma diagramação que transmite a mensagem de imposição e imponência, há aqui força e bravura. Páginas com destaque em vermelho, poesias e poemas que transitam entre um capítulo e outro e um emaranhado poético construído dentre os inúmeros gêneros que conversam entre si na construção de uma unidade de sentido ampla e única.
Sua obra nos convida a pensar sobre a vida, realizações, sonhos e acaso. A cada página uma nova reflexão, um novo questionamento e uma nova posição. Você estaria pronto para enfrentar de frente as verdades que a vida impõe ou você só caminha e espera que a vida lhe explique?
A vida sabe melhor do que nós mesmos o que é melhor para nós
A questão é: você aceita os caminhos da vida?
ou vive na ilusão de achar que tem
controle e atrapalha todos os planos?
[...])(p.18)
dinheiro move o mundo, mas não se mova só por dinheiro (p.41)
e algumas provocações doem na alma:
Certos tipos de
Felicidade são muitos específicos.
Tem gente que só vai ser feliz
depois que morrer [...](p.53)
e outros nos convidam à entender que somos dotados de limitações:
Sou apenas a metade de um todo
Uma parte de algo em constante evolução
Assim consigo ser algo mutável movimento
Que se transforma por e para você
Sendo a metade consigo ser inteiramente aquilo que quis ou sonho de tudo o que deveria ser
[...](p.107, em apenas metade)
e outras nos fazem refletir sobre nossa condição:
O valor da vida não pode ser
sentido individualmente.
Nós somos apenas peças do jogo
A gente só entende
a parte que participamos.
Não sabemos qual é o fim da partida
O verdadeiro valor da vida
só se entende coletivamente
[...](p.135 em colombina de maio)
Taz consegue transmitir muito mais que apenas uma escrita, ela transmite sentimento e vida em suas letras e palavras. Seu dom transmite reflexão e afrontamento de ideias que nos fazem pensar sobre nossa vida, limitações e sobre nós mesmos e nossa conduta. Uma obra poética repleta de vida.
Um livro que fala por si, indicado para todo bom leitor, filósofo ou para amantes de uma poesia pungente e reflexiva.
[RESENHA#526] Agridoce, de Andréa Rezende
Falar de poesia sempre evoca um sentimento de responsabilidade maior do que de outros livros, isso ocorre pois a subjetividade habita nas entrelinhas do sentimento. A poesia é, costumo dizer, a leitura da alma, ou seja, a real interpretação da obra nos é revelada no momento em que nosso caminho se cruza com os desdobramentos da verdades impostas em suas linhas.
Agridoce é como chamamos a mistura que ocorre entre o doce e o salgado ou entre o ácido e o doce. O titulo não poderia ser melhor. A obra transmite um misto entre o doce dos desejos e o ácido da realidade, o salgado das lutas e o doce das conquistas. A autora, professora, traz em seus versos muito daquilo o que acredita e luta, e para tal, ela debruça-se em desvencilhar os sentimentos decorrentes de sua formação e carreira, trazendo para o leitor um misto de sentimentos que lhe são únicos, fazendo-nos caminhar por seus anseios e desejos de uma forma sublime.
Este emaranhado poético ao qual Andréa Rezende nos submete é um livro de frente de batalha, de militância, de relevância e importância. A autora nos apresenta uma construção poética que trava e batalha com a realidade. Suas linhas denunciam o crime impune, o amor não vivido, a sorte não semeada, o caminho não traçado e a impunidade tão praticada.
O primeiro poema, homônimo do livro, é uma descrição breve da poética desta artista, aqui, ela nos revela todo lado acri-doce de sua obra.
O que é doce em mim
Desliza, suporta discursos,
Temas em curso ou desuso
Neste trecho observa-se que a autora caracteriza seus sentimentos como algo que desliza e se transforma em discursos, podemos inferir que que todo este emaranhado poético nasceu de uma necessidade pungente de expurgar todo sentimento enraizado em sua crenças, o que originou toda esta escrita militante.
O poema a espera é uma alusão à espera que ocorre durante o processo de transformação do alunado por meio da experiência de ensino escolar e das metodologias de ensino, aqui, a autora usa de sua expertise para elaborar uma proposta de intervenção em favor da espera de um futuro melhor para o professor, para o aluno e para o ensino.
Porque sou professor
sou a paz, a espera, a possibilidade
Porque sou professor,
sou a favor do amor
Do conhecimento, da verdade
[...]
seguindo com sua narrativa que milita e grita, a autora nos brinda com um poema/homenagem à Marielle Franco.
Marielle da maré
tão jovem, tão densa
tão cheia de fé
Marielle da maré
tão forte, tão negra
tão genuinamente mulher
[...]
Em CondeNAÇÃO, a autora traz um visceral poema acerca do julgo popular, do preconceito e da criminalização do pobre, do negro, do nordestino, do favelado, das minorias por meio de uma repulsa que é característica da nação, não como uma culpabilização, mas como o reconhecimento de que estas problemáticas sociais são enraizadas no sentido de estarem por todos os cantos e lados, mostrando assim, a necessidade de reconhecermos a importância destas pautas para diminuir o impacto de nossas ações sobre nossos semelhantes, não como diferentes por seus atributos, mas por sermos iguais em existência.
Condenem a nação
esqueçam todo o seu legado
todos os acertos e bravuras
todos os feitos e inclusão
seu crime foi maior
[...] grifos meus.
condem também o pobre
o negro, o nordestino
a mulher, as minorias
o oprimido, os esquecidos
[...] grifos meus
O momento é doce, seus desdobramentos salgados, a vida é doce, os acontecimentos, salgados. A educação é doce, a ignorância salgada, e é seguindo esses preceitos que a autora segue, ela caminha entre a linha tênue da verdade dos fatos e das dores dos acontecimentos, ela se desdobra por meio de gritos que podem - e certamente vão - ser ecoados pela eternidade e por todas as ruas e bairros à quem pretende alcançar. Este não é um livro de poesias (apenas) é uma obra que nos convida à olhar para dentro e depois para fora e analisar ao nosso redor. Andréa Rezende escreve como quem escreve com a alma, como quem delineia os sentimentos de insatisfação por meio da escrita, da poesia e das artes.
Um livro memorável para todo aluno, pai, negro, nordestino, e para quem deseja ler e encontrar em uma narrativa uma boa poesia, uma boa dose de vida e verdade.
[RESENHA #525] Mad Maria, de Márcio Souza
SOUZA, Márcio. Mad Maria / Márcio Souza - 6.ed. - Rio de Janeiro: Record, 2023 ISBN978-65-5587-555-3
Mad Maria (apelido locomotiva da Madeira-Mamoré) narra-nos a história da construção da ferrovia Madeira-Mamoré, no norte do Brasil, um dos maiores desafios arquitetônicos do início do século XX. Este enredo versa-nos acerca de um acontecimento real e drástico acerca da construção de uma das maiores ferrovias já construídas durante o período em que Rio de Janeiro ainda era considerada a Capital Federal do Brasil. A abertura do livro avisa-nos acerca de que há em suas páginas muito da verdade do ocorrido, mas alerta-nos também sobre o fato da obra ser um romance, o que considero, nada bonito, ao contrário, totalmente tenebroso, ainda que visceral e verídico.
Marcio Souza escreve uma obra dividida em dois grandes períodos da história, o primeiro, claro, diz-nos a respeito da construção de uma grande ferrovia que massacrou diversos trabalhadores levando muito deles à morte em nome do capitalismo parasitário vivenciado no século XX, também nos aventuraremos em um período onde Rio de Janeiro ainda vivenciava seus dias como a Capital Federal do Brasil, o que mostra-nos bastante acerca da história da cidade durante o período e todas as problemáticas sociais, políticas e problemáticas da época. Esta edição da obra conta com um novo projeto gráfico, bem como uma nova revisão e um projeto de expansão, o que no cenário atual soa quase como uma denúncia em relação ao que vem acontecendo - inclusive nos dias atuais - com a Amazônia e todo seu desmatamento em busca de uma expansão comercial capitalista, trazendo-nos a tona uma admiração em relação à poética versada pelo autor, bem como um horror pelas descrições tão minuciosas em suas páginas.
A obra narrada no período de 1911 traz-nos revelações acerca das mortes e dos grandes acordos políticos firmados para sua realização, e claro, toda trama por trás de uma das grandes construções ferroviárias que traz-nos a tona os sentimentos de insatisfação, ao passo de que somos levados a entender a totalidade dos acontecimentos acerca do processo acelerado de desenvolvimento do capitalismo parasitário em um período quase que periférico acerca do trabalho e da exploração de mão de obra.
A obra, intitulada muito verdadeiramente como ferrovia do diabo carrega em si um mar de sangue das vidas que se perderam para sua realização, bem como para o seu desenvolvimento no meio político, o que nos faz aprender um pouco mais acerca dos acordos políticos que, em suma, permanecem vigente dos dias de hoje - o capital acima da vida em prol das realizações megalomaníacas dos grandes investidores da atualidade.
[RESENHA #526] Jimi Hendrix - uma sala cheia de espelhos, de Charles R. Cross
Cross, Charlie R. Jimi hendrix - uma sala cheia de espelhos: A verdadeira história por trás do mito do maior guitarrista de todos os tempos / Charles R. Cross; Tradução: Martha Argel.- 1. Ed. - São Paulo: Editora Seoman, 2022.
Esta biografia, escrita pelo autor best-seller e reconhecido jornalista musical Charles R. Cross, traz relatos inéditos sobre a vida e obra do maior guitarrista de todos os tempos. Muito já foi escrito sobre ele, contudo, Hendrix é muito mais conhecido pelo seu mito do que por sua verdadeira biografia, por sua infância e pelos bastidores da sua curta e incendiária carreira como músico, o que é corrigido neste livro de forma impecável. Baseado em mais de 300 entrevistas, documentos nunca antes revelados e diversas pesquisas, este livro apresenta um profundo e fascinante retrato do gênio da música que conseguiu sair da pobreza para o sucesso, colocar fogo no mundo do rock e inadvertidamente pôr fim em seu próprio talento. A obra inclui também muitas informações sobre a verdadeira história de sua saída do serviço militar, um relato alucinante de Woodstock e os detalhes de seus muitos amores.
[RESENHA #525] Samba de enredo, de Alberto Mussa e Luiz Antonio Simas
MUSSA, ALBERTO. Samba de enredo: história e arte / Alberto Mussa, Luiz Antonio Simas - 2ºed. rev, ampl. - Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2023.
Apresentação/sinopse Samba de enredo: história e arte surgiu em 2009, da parceria entre Alberto Mussa e Luiz Antonio Simas, ambos escritores apaixonados pela cultura do samba. O livro apresenta análises minuciosas de sambas de enredo e suas relações com a história social do país. Em meio a ritmos, letras e personagens, leitores e leitoras conhecem o modo como esse gênero tipicamente brasileiro vem sendo construído e se desenvolvendo, de 1870 até a atualidade.
Para analisar a letra e o contexto desses sambas-enredos, Alberto Mussa e Luiz Antonio Simas ouviram cerca de 1.600 canções gravadas, além de outras, que estão registradas na memória acumulada ao longo de vários carnavais.
Nesta nova edição, revista e ampliada, os autores atualizaram o livro com um posfácio, que trata das mudanças nos sambas de enredo, de 2010 a 2022. O texto de orelha é assinado pelo mestre Haroldo Costa. Tanto para quem deseja se iniciar no mundo do carnaval quanto para quem busca um aprofundamento, Sambas de enredo: história e arte é leitura essencial.
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O livro Samba de enredo é uma bibliografia acerca da história do samba e do gênero enredo, um gênero genuinamente brasileiro e das modificações estéticas sofridas ao longo dos anos. A obra é um estudo de anos de dedicação do autores, que dedicaram-se de corpo e alma à acompanhar o samba, o carnaval e todas as marchinhas e disputas de samba nas quadras, elucidando assim, o enredo discorrido nesta narrativa que percorre transições e criações poética das escolas de samba e suas capacidades de se reinventarem, quase que, espontaneamente.
O samba de enredo, é, segundo o autor um poema que discorre e transcreve as alegorias do carnaval em uma estética única estabelecidas pela escola de samba. O livro narra acontecimentos históricos dentro e fora dos desfiles e seus efeitos na classificação do samba de enredo de como musicalidade poética e suas transfigurações até o dia de hoje, estabelecendo-se assim, uma linha do tempo tênue entre acontecimentos e formas de expressão das escolas durante o percurso de criação dos desfiles. Nota-se um estudo vasto acerca do tópico, percorrendo por assuntos que discorrem desde outros estilos até à consolidação do samba de enredo, bem como seu destaque dentre todos os outros subgêneros existentes dentro do samba, o que o caracterizou como algo único e inconfundível.
O livro divide-se em diversos capítulos que transitam entre a história do samba e a criação da identidade dentro dos gêneros, percorrendo entre os períodos clássicos [1951-1968] (p.55), época de ouro [1969-1989] (p.73), até o surgimento das escolas de samba de enredo (p.135).
A narrativa mostra-nos como o enredo consolidou-se como uma ferramenta de luta, tornando-se assim, característica de suas criações o enfrentamento de problemáticas sociais, temas de grande escala e importância social, o que pode caracterizar-se no capítulo época de ouro, que nos é mostrado a importância das letras de diferentes escolas de samba durante o período ditatorial.
Para caminhada do samba dentre o ontem e o hoje, nota-se que o samba de enredo transformou-se inúmeras vezes e continua se transformando e se tornando inconfundível por quem o ouve, para onde ele vai? só o tempo dirá (p.201).
A obra finaliza com uma listagem de todas as composições originais de samba de enredo durante o passar das décadas. O livro é poético em suas estruturas, o samba está em todas as suas páginas, e é possível imaginar-se em um desfile curtindo o carnaval em um misto de samba e efervecência política em suas letras, uma obra majestosa.
[RESENHA #524] A teoria do Estado de Dante Alighieri, por Hans Kelsen
São Paulo: KELSEN, Hans. A teoria do Estado de Dante Alighieri. Editora Contracorrente: Tradução: Luiz Felipe Brandão Osório 2021, 186p
Sinopse/apresentação: A Editora Contracorrente tem a satisfação de anunciar a publicação da primeira edição em português do livro A Teoria do Estado de Dante Alighieri, do celebrado jurista e filósofo Hans Kelsen.
Trata-se da obra inaugural de Hans Kelsen, publicada em 1905, na qual o jurista de Viena examina o trabalho “político” de Dante Alighieri.
Nela se prefigura o interesse de Kelsen pela democracia, pela legitimação do poder e pelos sistemas internacionais de manutenção da paz, como também são reconhecidas algumas perspectivas metodológicas que encontrarão máxima expressão na produção madura de Kelsen.
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Para que possamos analisar a escrita de Kelsen, faz necessário revisitar o significado de Estado de Direito, de acordo com a enciclopédia jurídica da PUC-SP, Estado de Direito nada mais é:
O Estado de Direito em seu sentido amplo “significa que as pessoas devem obedecer às leis e serem reguladas por elas. Porém, em uma teoria política e jurídica, ele deve ser lido de uma maneira mais estrita, no sentido de que o governo deve ser regulado pelas leis e submetido às mesmas. Entre outras palavras, o direito é uma ordem da ação humana, ou seja, um conjunto de normas. O mestre vienense afirma que a lei não é, como comumente se acredita, uma norma. É mais do que isso: Direito é um conjunto de normas que possuem uma unidade que constitui um sistema.
Já para Hans Kelsen:
[RESENHA #523] Amigos, Amores e aquela coisa terrível, de Matthew Perry
PERRY, Matthew. Rio de Janeiro: Amigos, amores e aquela coisa terrível, ed BestSeller, 2023, 289p
Amigos, amores e aquela coisa terrível é um livro autobiográfico do astro de friends, Matthew Perry. O livro é uma narrativa sincera da vida de Perry enquanto homem e astro, trazendo relatos surpreendentes do autor durante uma fase difícil em sua vida: o abuso de álcool e drogas, o que justifica o e aquela coisa terrível [vício, dependência] presente no titulo. A narrativa é objetiva, sincera e crua, fornecendo ao leitor uma viagem no tempo na vida de Perry, percorrendo por sua ascensão em friends à seus medos e angustias, os momentos nos set de filmagens e toda sua luta contra o alcoolismo.
O prefácio da obra foi assinado pro Lisa Kudrow, a Phoebe, também do seriado friends. Lisa nos conta sobre como era frequentemente rechaçada com perguntas sobre o astro: Como anda Matthew Perry? A atriz revela que as questões acerca do astro eram demasiadamente delicadas para serem compartilhadas como a impressa que cada vez a pressionava a fazer, e na impossibilidade de esclarecer com clareza a dúvida dos fãs e da imprensa, Lisa, se contentava em apenas responder acho que está bem.
o mais interessante em tudo isso é acompanhar a vida de Matthew Perry durante seus anos na tevê, e agora, em suas próprias palavras em uma narrativa triste e voraz de sua vida e escolhas.
Devemos aplaudir Perry por trazer um assunto tão delicado à tona, fomentando assim, uma discussão saudável acerca do tópico, e nos fazendo enxergar o mundo a nossa volta e todas as pessoas que, de certa forma, vivem algum tipo de vicio e precisam se libertar.
A obra possui fotos e relatos profundos e comoventes, o autor assegurou-se de estar o mais próximo possível do leitor por meio da sinceridade das narrativas, a clareza e luz sobre os acontecimentos, e sobretudo, o uso de recursos de transição entre passado e presente a todo momento, transitando entre narrativas de sua família, relacionamentos, uso e abuso de drogas e outras substâncias, à vida como Chandler Big, os medos e inseguranças e todo processo de libertação e cura de sua doença.
O único adendo da obra é que o autor percorre por passado e presente de maneira leviana, você se perde durante a narrativa e precisa reler ou se atentar no capítulo ou página em que se está, algumas vezes ele bate o martelo em pontos já mencionados em capítulos ou citações passadas, nota-se também que o autor ainda está trabalhando sua capacidade de falar de si mesmo, talvez por todo trauma e história acerca de sua vida. O que muitos não sabem é que este não é o primeiro livro do autor, Perry também escreveu um ensaio sobre cavalaria, que em português ficaria algo como um soldado profissional: história da cavalaria, com excelentes críticas na web, o que me fez delirar na ideia de que alguém possa ser tão talentoso e bom com as palavras a ponto de transitar tão bem entre narrativas tão distintas.
Se você está realmente interessado em se emocionar por duas horas e meia (sim, lie m duas horinhas, incrível, né?), este livro é para você. E engana-se quem acha que é necessário ser fã da série para se emocionar, você só precisa estar pronto e afim de se deixar levar pela narrativa do autor, que, com certeza fará você se apaixonar e chorar ao mesmo tempo.
[RESENHA #522] Autoajude-me, de Marianne Power
Os livros de autoajuda podem até mudar a sua vida, mas não necessariamente para melhor... Em Autoajude-me!, Marianne Power narra sua hilária e comovente trajetória em busca do autoaperfeiçoamento e do autoconhecimento a partir da leitura dos clássicos desse gênero literário. Marianne Power era viciada em literatura de autoajuda. Suas prateleiras eram repletas de livros dos clássicos aos mais recentes lançamentos sobre como encontrar a melhor versão de si mesma. No entanto, aos 36 anos, se sentia perdida, como se sua vida estivesse empacada. Ela percebeu que, apesar de ter lido tantos guias de auto-aperfeiçoamento, nunca havia seguido à risca nenhum deles. Então, um dia, decidiu mudar tudo. A autora escolheu finalmente ir atrás da vida perfeita que os livros prometiam aquela na qual não havia dívidas, ansiedade, ressacas ou horas intermináveis na frente da TV; aquela em que ela andava pela cidade com autoconfiança e dentes perfeitos, e conhecia o homem dos seus sonhos. Marianne [...]
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Estranho como este livro me lembrou Bridget Jones, ele é engraçado ao ponto de que você não consegue parar de ler. Confesso, eu, ao contrário da autora, detesto todos os livros possíveis de autoajuda, mas este...me pegou de uma forma com a qual eu não estava preparado. O roteiro e a ideia da autora me surpreenderam, eu não achei que algum dia alguém escreveria um livro contando suas experiências e avaliações pessoais acerca da escrita de outras pessoas dentro do universo de autoajuda. A ideia é simples e direta: seguir durante um ano os conselhos dos livros de autoajuda, para tal, ela selecionou doze livros para acompanhar um por mês e testar os efeitos de seus conselhos em sua vida privada. Power conta-nos como foi sua experiência seguindo à risca conselhos como: faça uma coisa na qual tem medo todos os dias, controle suas finanças, diga foda-se à seus problemas, dentre outros, e ela o faz com maestria e muito bom humor.
A ideia veio prontinha: ler um livro por mês, segui-los ao pé da letra, checar se os livros de autoajuda poderiam mudar a minha vida. Eu faria isso por um ano - logo, leria 12 livros. Então eu superaria um problema de cada vez: dinheiro, preocupações, meu peso...E, no fim do ano eu seria...perfeita! (p.23)
A cada capítulo do livro a autora aborda um livro de autoajuda diferente e narra os acontecimentos acerca dos aprendizados. O primeiro livro, por exemplo, tenha medo e siga em frente, de Susan Jeffers, o conselho era pegar alguma atividade a qual temos medo, e assim assim, fazê-la. Power então decidi investir um tempo em tudo o que ela jamais pensou em fazer: paraquedismo, modelagem, stand-ups, dentre outros, o que acaba a levando para segunda etapa: terapia de rejeição, o que a leva a conversar com estranhos e pedir coisas grátis em cafés, dentre outros. Ao que parece, alguns conselhos parecem funcionar, ainda que temporariamente.
Depois de muitas semanas de experiência, a autora percebe que está frustrada. Ela prejudicou-se no trabalho, afastou pessoas, gastou mais dinheiro do que podia e causou tensão em seus relacionamentos.
A cada livro, as minhas expectativas para vida aumentavam. Eu não queria apenas uma vida feliz, queria uma vida fenomenal. Quanto mais alto a meta era posta, mais eu sentia que estava falhando. Quanto mais perseguia a Eu Perfeita, mais ela fugia de mim. Quanto mais desesperada em ser feliz eu me tornava, menos feliz ficava (p.343)
porém, foram experiências que transformaram a autora, ela nos revela que falar com estranhos sobre assuntos com os quais ela normalmente não compartilharia, a deixou assustado e feliz ao mesmo tempo
[...] isso marcou o inicio de um novo mundo para mim (p.343)
O livro em si, depois de todos os conselhos, nada mais é do que um ensaio da autora em prol da vida bem vivida, daquela que não nos lembramos atentamos ou vivemos. Viver a vida, talvez este seja o conselho mais sábio de toda obra, a autora nos traz reflexões poderosas, fruto de suas experiências com os livros e com o passar dos dias, ela tornou-se mais atenta aos acontecimentos da vida, narrando sua visão acerca do mundo novo que se formava ao seu redor. A autora transformou sua visão por meio de todas nuances que foram encontrando-se à sua frente.
É como eu me sinto agora. Estou vivendo a vida no presente. Cada momento parece pronto para explodir em sua perfeição. Até mesmo as coisas banais como pendurar roupa lavada, ou lavar pratos, parecem carregada de significados. Não sei porquê. Acho que acabou de chegar ao fim de uma jornada apenas para me dar conta de que não há outro lugar onde eu quisesse estar (p.342)
Autoajude-me é um olhar efervescente e ponderado sobre a autoajuda e da busca pela felicidade. Power nos ensina através de sua escrita uma receita prática que não está escrito em nenhum livro: VIVA, seja feliz e faça seu caminho sem medo de errar. A segunda Briget Jones, repleta de humor.
[RESENHA #521] Preconceito linguístico, de Marcos Bagno
Marcos Bagno, mineiro de Cataguases, é autor de livros infantis, juvenis e, além disso, já escreveu um livro de contos, A invenção das horas, ganhador do IV Prêmio Bienal Nestlé de Literatura em 1988. Em o Preconceito Linguístico – O que é, como se faz - publicado em 1999 pela editora Loyola, Bagno traz uma discussão sobre as implicações sociais da língua. Ele já havia discutido em seu livro A língua de Eulália, Novela Sociolinguística forma preconceituosa com que a língua é tratada na escola e na sociedade e, no Preconceito Linguístico, retoma essa discussão.
Na edição mais atual de seu livro (15ª), encontrei algumas modificações significativas em comparação com a primeira edição. Segundo o autor, essas mudanças devem-se à vontade de manter o livro sempre atualizado, sintonizado com a evolução e a maneira de ver as coisas; com as críticas, sugestões e comentários que o trabalho recebe. Dentre as mudanças, destaco o acréscimo de um capítulo final - O Preconceito contra a linguística e os linguistas, o anexo de uma carta de Bagno à Revista Veja, e a história da capa do livro.
Bagno recusa a noção simplista que separa o uso da língua em " certo" e " errado" , dedicando-se a uma pesquisa mais profunda e refinada dos fenômenos do português falado e escrito no Brasil.
Ao mesmo tempo, convida o leitor a fazer um passeio pela mitologia do preconceito linguístico, a fim de combater esse preconceito no nosso dia-a-dia, na atividade pedagógica de professores em geral e, particularmente, de professores de língua portuguesa. Para isso. O autor analisa oito mitos inseridos no primeiro capítulo do livro A mitologia do preconceito linguístico.
No Mito nº 1 – A língua portuguesa falada no Brasil apresenta uma unidade surpreendente, em que o autor fala da diversidade do português falado no Brasil e destaca a importância de as escolas e todas as demais instituições voltadas para a educação e a cultura abandonarem esse mito da unidade do português no Brasil e passarem a reconhecer a verdadeira diversidade linguística de nosso país Qualquer manifestação linguística que escape desse triângulo escola-gramática-dicionário é considerada, sob a ótica do preconceito linguístico, " errada" , como Bagno discute no Mito nº 4 – As pessoas sem instrução falam tudo errado.
No Mito nº 2 – Brasileiro não sabe português / Só em Portugal se fala bem português, o autor faz uma longa análise levando em conta a história desses dois países e desmistifica mais esse preconceito. Quanto ao ensino do português no Brasil, questão também abordada no Mito nº 3 - Português é muito difícil, o problema é que as regras gramaticais consideradas " certas" são aquelas usadas em Portugal, e como o ensino de língua sempre se baseou na norma gramatical portuguesa, as regras que aprendemos na escola, em boa parte não correspondem à língua que realmente falamos e escrevemos no Brasil. Por isso achamos que português é uma língua difícil. O mito no. 4, Brasileiro não sabe português afeta o ensino da língua estrangeira, pois é comum escutar professores dizer: os alunos já não sabem português, imagine se vão conseguir aprender outra língua, fazendo a velha confusão entre a língua e a gramática normativa.
Mito nº 5 – O lugar onde melhor se fala português no Brasil é o Maranhão, diz ser este um mito sem nenhuma fundamentação científica, uma vez que nenhuma variedade, nacional, regional ou local seja intrinsecamente " melhor" , " mais pura" , " mais bonita" , " mais correta" do que outra.
Mais um preconceito analisado é a tendência muito forte, no ensino da língua, de obrigar o aluno a pronunciar " do jeito que se escreve" , como se fosse a única maneira de falar português, Mito nº 6 – O certo é falar assim porque se escreve assim.
Mito nº 7 – É preciso saber gramática para falar e escrever bem. Segundo o autor, é difícil encontrar alguém que não concorde com esse mito. Que se invalida, entre outras razões, pelo simples fato de que se fosse verdade, todos os gramáticos seriam grandes escritores, e os bons escritores seriam especialistas em gramática. A gramática, na visão do autor, passou a ser um instrumento de poder e de controle.
O último Mito – O domínio da norma culta é um instrumento de ascensão social, que fecha o circuito mitológico, tem muito a ver com o primeiro, pois ambos tocam em sérias questões sociais. Bagno diz que o domínio da norma culta nada vai adiantar a uma pessoa que não tenha seus direitos de cidadão reconhecidos plenamente e que não basta ensinar a norma culta a uma criança pobre para que ela " suba na vida" Precisa haver um reconhecimento da variação linguística, porque segundo o autor, o mero domínio da norma culta não é uma fórmula mágica que, de um momento para outro, vai resolver todos os problemas de um indivíduo carente.
Avaliação critica:
No capítulo II O círculo vicioso do preconceito linguístico, o autor explica que os mitos analisados no capítulo I são perpetuados em nossa sociedade por um mecanismo de círculo vicioso do preconceito linguístico e demonstra como o procedimento de muitos profissionais colabora para a manutenção da prática de exclusão.
No Capítulo III A desconstrução do preconceito linguístico Bagno discute a ruptura do circuito vicioso do preconceito linguístico, afirmando que a norma culta é reservada, por questões de ordem política, econômicas, sociais e culturais, a poucas pessoas no Brasil.
Discute, por exemplo, a mudança de atitude do professor que deve refletir-se na não-aceitação de dogmas, na adoção de uma nova postura (crítica) em relação a seu próprio objeto de trabalho: a norma culta. Essa mudança, do ponto de vista teórico, poderia ser simbolizada numa troca de sílabas: ao invés de repetir alguma coisa, o professor deveria refletir sobre ela.
Neste mesmo capítulo o autor discorre sobre o que é ensinar o português; o que é erro; a paranoia ortográfica (procurar imediatamente erros na produção de um aluno). Reconhece que o preconceito lingüístico está aí, firme e forte, e